quinta-feira, 20 de outubro de 2016

História da Era Apostólica – O primeiro Mártir


"Em  teus dias de dor, recorda alma querida, que a dor é para a vida aquilo que o buril, severo e contundente, entre as mãos do escultor  é para o mármore sem forma. Golpe aqui, Golpe ali, outro mais e mais outro um corte de outro corte se aproxima, e o bloco se transforma em celeste beleza de obra-prima.[...].”1

HAROLDO DUTRA DIAS

O alicerce da obra imorredoura do Cristo formou-se à base de renúncia, sacrifício e abnegação.

Três séculos de Cristianismo Nascente testemunharam o martírio de discípulos corajosos, que se imolaram no altar da fé para que a luz do Evangelho se estendesse ao mundo, inaugurando nova era de fraternidade e amor.

Inspirados no exemplo do próprio Mestre, eles conheceram as feras, o suplício, a perseguição, o confisco, a brutalidade em todos os seus matizes, gravando para sempre, no coração dos homens, a lição da resignação, do amor e do perdão.

Na seara de Jesus, os trabalhadores da primeira hora foram mártires.

Estêvão, o grande mártir da Era Apostólica, inaugurou o “tempo dos sacrifícios”. Seu testemunho de fé e de bravura, diante da mais alta corte judicial da nação hebraica, mudaria os rumos do movimento cristão e deixaria marcas indeléveis no coração do seu próprio algoz, um homem intrépido e sincero, que se tornaria o responsável pela universalização do Cristianismo – Paulo de Tarso.

O apedrejamento de Estêvão se deu no verão do ano 35 d.C.

A informação pode ser encontrada na obra mediúnica Paulo e Estêvão,2 mas somente após uma leitura inteligente e atenta dos textos. Na verdade, é necessária uma combinação harmoniosa e criteriosa de dados.

Emmanuel descreve acontecimentos, aparentemente desconexos, com enorme precisão.Uma vez reunidas, essas descrições formam um quadro cronológico coerente e convincente, senão vejamos:

A manhã enfeitava-se de muita alegria e de sol [...].

No ar brincavam as mesmas brisas perfumadas, que sopravam de longe [...].
.................................................

Nesse ano de 34, a cidade em peso fora atormentada por violenta revolta dos escravos oprimidos.

[...] Em breve, a galera das águias dominadoras, auxiliada por ventos favoráveis, trazia no bojo as autoridades da missão punitiva, cuja ação deveria esclarecer os acontecimentos.3
[...] O coração paternal adivinhava. Àquela hora, Jeziel, conforme o programa por ele mesmo traçado, arava a terra, preparando-a para as primeiras semeaduras. [...]4

De Corinto, a grande embarcação aproara em Cefalônia e Nicópolis, de onde deveria regressar aos portos da linha de Chipre, depois de ligeira passagem pela costa da Palestina, consoante o itinerário organizado para aproveitar o tempo seco e tendo em vista que o inverno paralisava toda a navegação.5

– Há mais de um ano – exclamou o Apóstolo apagando a vivacidade com a lembrança triste – foi crucificado aqui mesmo em Jerusalém, entre os ladrões.6

Estamos na velha Jerusalém, numa clara manhã do ano 35.7

Naquelas primeiras horas da tarde, o sol de Jerusalém era um braseiro ardente. Não obstante o calor insuportável, a massa deslocou-se com profundo interesse. Tratava-se do primeiro processo concernente às atividades do “Caminho”, após a morte do seu fundador. [...]8

Antes de comparar os textos, é imperiosa uma ligeira exposição a respeito do clima, agricultura e navegação na região da Acaia (sul da Grécia). Nos países banhados pelo Mar Mediterrâneo, o clima é muito semelhante, com verões secos e quentes, e invernos moderados e chuvosos. As estações do ano se dividem em dois grandes blocos: primavera–verão (abril–setembro) e outono–inverno (outubro–março).

A semeadura de cereais se dava no início do outono, após a preparação da terra no final do verão, com vistas ao máximo aproveitamento da época das chuvas (inverno). Pela mesma razão, a navegação no Mar Mediterrâneo começava em abril e se encerrava em outubro. Era extremamente perigoso navegar no inverno, em razão das tempestades e da impossibilidade de se orientar pelo Sol e pelas estrelas.

O livro se inicia com a descrição de uma manhã de sol, com brisas perfumadas, e ruas desertas, além da presença maciça de guardas romanos nas vias públicas, em decorrência de uma revolta de escravos ocorrida em Corinto, naquele mesmo ano, ou seja, em 34 d.C.

A galera romana teria aproveitado os ventos favoráveis para se deslocar de Roma até Acaia, a fim de conter o levante, o que nos permite concluir, seguramente, que a navegação se deu na primavera, pois o tempo favorável à navegação começava em abril.

Na sequência, o pai de Jeziel (Estêvão) o encontra arando a terra, preparando-a para as primeiras semeaduras.Naquela região do Mediterrâneo, a terra era arada no final de setembro (fim do verão), ao passo que a semeadura se dava no final de outubro (em pleno outono).

Sendo assim, conjugando a informação da “manhã de sol, com brisas perfumadas” e “aragem da terra”, pode-se concluir que a tragédia que acometeu a família de Estêvão se deu no final do verão do ano 34 d.C.

Jeziel (Estêvão) é enviado para as galeras, como prisioneiro, realizando uma viagem marítima, cujo itinerário foi organizado para “aproveitar o tempo seco” já que “o inverno paralisava toda navegação”. Nesse ponto, a descrição de Emmanuel é rigorosamente precisa. Não há margem para dúvidas. A embarcação partiu no outono do ano 34 d.C.

Após sua chegada em Jerusalém, Jeziel é acolhido por Simão Pedro, na Casa do Caminho. Nesse momento, surge o diálogo entre eles, no qual o pescador de Cafarnaum relata que “há mais de um ano [...] foi crucificado”, referindo-se a Jesus.

Ora, considerando-se que a crucificação se deu em abril//maio do ano 33 d.C.,9 a conversa se deu após o outono de 34 d.C., mas antes de abril de 35 d.C. ou seja, antes de se completarem dois anos da crucificação.Mais adiante, afirma Emmanuel: “Estamos na velha Jerusalém, numa clara manhã do ano 35”, confirmando todos os cálculos precedentes.

Por fim, quando descreve o martírio de Estêvão, o Benfeitor espiritual utiliza a seguinte expressão: “Naquelas primeiras horas da tarde, o sol de Jerusalém era um braseiro ardente. Não obstante o calor insuportável [...]”. Assim, é lícito concluir que Estêvão foi martirizado no verão do ano 35 d.C.

Fonte: Reformador  Ano 127 • Nº 2. 158 • Janeiro 2009

1XAVIER, Francisco Cândido. Mãos marcadas.Espíritos Diversos. São Paulo: Instituto de Difusão Espírita, 1972. Cap. 13 – “Maria Dolores”.
2XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007.
3Idem, ibidem. Primeira parte, cap. I, p. 11-13.
4XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira parte, cap. I, p. 20.
5Idem, ibidem. Primeira parte, cap. III, p. 60.
6XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira parte, cap. III, p. 76.
7Idem, ibidem. Primeira parte, cap. IV, p. 84.
 8Idem, ibidem. Primeira parte, cap. VIII, p. 187-188.
9Consultar o artigo intitulado “A crucificação de Jesus”, publicado na revista Reformador, ano 126, n. 2.154, setembro de 2008, p. 33. 


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