Os Quatro Evangelistas, quadro de Jacob Jordens |
“Para quem está familiarizado com a história
antiga, não deve ser motivo deperturbação o fato de que as principais datas na vida de Jesus sejam apenas
aproximadas. [...] Na verdade, as datas de nascimento até mesmo de alguns imperadores
romanos não são certas [...].”
No prólogo deste artigo há uma
citação do historiador John P.Meier, professor na Universidade Católica de
Washington D. C., considerado um dos mais eminentes pesquisadores bíblicos de
sua geração. Ao stabelecer os limites da ciência e da
investigação humanas, ele adverte:“Por Jesus da história, refiro-me ao Jesus que podemos ‘resgatar’ e examinar utilizando os instrumentos científicos da moderna pesquisa histórica”.2
investigação humanas, ele adverte:“Por Jesus da história, refiro-me ao Jesus que podemos ‘resgatar’ e examinar utilizando os instrumentos científicos da moderna pesquisa histórica”.2
A pesquisa histórica
baseia-se em fontes (documentos, registros, inscrições, ossuários, obras de
historiadores, achados arqueológicos) e adota métodos específicos, adequados ao
tipo de fonte analisada, com vistas à interpretação consistente dos dados
coletados.
Por vezes, seja em razão da
escassez dessas fontes, seja em decorrência da ausência de parâmetros na interpretação
dos dados colhidos, somos obrigados a reconhecer a limitação dos “instrumentos
científicos da moderna pesquisa histórica”.
Nesse ponto, consideramos
preciosa a contribuição dada pela Doutrina Espírita no equacionamento de graves
questões. No caso da cronologia da vida de Jesus, é lícito concluir que a obra
psicográfica de Francisco Cândido Xavier supre inúmeras lacunas, impossíveis de
serem transpostas sem o auxílio da revelação espiritual, tendo em vista as
limitações da historiografia.
Os dados cronológicos mais
importantes da vida de Jesus encontram-se nas narrativas da infância (Mateus,
2; Lucas, 1:5, 2:1-40) e nas narrativas da paixão (Mateus, 26-27; Marcos,
14-15; Lucas, 21- -23; João, 13-19). Outros dados relevantes podem ser
encontrados nos evangelhos de Lucas e João (Lc., 3:1-2 e 23; Jo., 2:20).
Os historiadores do
Cristianismo, porém, chamam a atenção para o fato de que os Evangelhos não são
essencialmente obras de história, no sentido atual da palavra. Os Evangelistas não
pretendiam produzir uma biografia completa ou mesmo um sumário da vida de Jesus.
Ao contrário, escreveram com a finalidade de transmitir o ensino do Mestre, os
fatos principais da sua vida, de modo a legar à posteridade o testemunho da fé.
Nesse sentido, é justo
considerar que os Evangelistas organizaram o material da tradição (oral e/ou
escrita) de acordo com um propósito redacional. Compilaram e organizaram as
narrativas sem se preocuparem com a ordem histórica dos acontecimentos. É o que
nos demonstra o pesquisador norte-americano:
[...] Tais compilações ainda
são visíveis em Marcos: por exemplo, as passagens polêmicas localizadas no
início do ministério de Jesus na Galiléia (2:1; 3:6), em contraposição a outra
série de passagens semelhantes já em Jerusalém, ao final do ministério (11:27;
12:34); uma seção central de relatos de milagres e palavras de Jesus, agrupados pela
palavra- chave “pão” (6:6; 8:21) e uma coletânea de parábolas (4:1; 34). Não há motivo para
considerarmos essas compilações como tendo preservado a inviolável ordem cronológica
dos eventos, especialmente porque Mateus e Lucas não o fizeram.Mateus, por
exemplo, reordena livremente os relatos de milagres que aparecem em Marcos, para
criar um grupo conciso de nove relatos divididos em três grupos intercalados
por material de “enchimento” (Mateus, 8-9). O grande Sermão da Montanha,
em Mateus, reaparece, em parte, em Lucas como o Sermão da Planície, menor que o
outro (ambos como tendo ocorrido na Galiléia) e, parcialmente, em material
espalhado por todo o longo relato da jornada final de Jesus até Jerusalém, em
Lucas, 9:51; 19:27 [...]”.3
A Adoração dos Pastores, quadro de Giorgione |
Por outro lado, seria temerário acusar os
Evangelistas de terem distorcido os fatos para adequá-los a propósitos
teológicos. Nesse caso, vale lembrar que escreveram para contemporâneos, muitos
deles testemunhas oculares dos fatos narrados, razão pela qual não se justifica
o ceticismo exagerado com relação aos dados contidos nos Evangelhos. Deve ser
encontrada uma posição de equilíbrio que prime pela fé raciocinada.
Assim, considerando o relato
dos Evangelistas, pode-se afirmar que Jesus nasceu no tempo do imperador Augusto
(37 a.C.-14 d. C.), antes da morte de Herodes, o Grande.
No ano 525 d.C., o papa João
I 470-526 d.C.) pediu a Dionísio4 que elaborasse um calendário com o cálculo
dos ciclos pascais, as datas futuras da Páscoa. Frei Dionísio, além de elaborar
uma efeméride pascal, estabeleceu um novo calendário, em oposição ao sistema alexandrino,
da era diocleciana, fixando a data do nascimento de Jesus em 25 de dezembro de
753 A.U.C.,5 declarando 1o de janeiro de 754 A.U.C. como o início do primeiro
ano da Era Cristã, o “Anno Domini” (Ano do Senhor).
Posteriormente, descobriu-se
que a data estabelecida por Dionísio estava absolutamente equivocada, visto que
fixava o nascimento de Jesus três anos após a morte de Herodes, o Grande.
Para se encontrar a data da morte
de Herodes, utilizou-se preciosa informação fornecida pelo historiador judeu
Flávio Josefo (Antiguidades Judaicas, livro XVII, cap. 6, § 4, item 167),
segundo o qual teria ocorrido um eclipse lunar pouco antes do falecimento daquele
monarca. Com base em cálculos astronômicos precisos, é possível afirmar que a
morte daquele rei se deu por volta de março/abril do ano 750 A.U.C. (4 a.C.), logo
após o referido eclipse.
Desse modo,
concluem os exegetas que Jesus, seguramente, nasceu antes do ano 4 a.C. (data da
morte de Herodes, o Grande). Todavia, esses pesquisadores são unânimes em reconhecer
a impossibilidade de se determinar o ano exato do nascimento de Jesus, com base
nas fontes históricas atualmente disponíveis.
Os “instrumentos
científicos da moderna pesquisa histórica” nos permitem chegar somente até esse ponto.
É nesse momento
que a revelação espiritual pode e deve ser conjugada com as pesquisas humanas,
no intuito de resolver questões intricadas, mas extremamente relevantes para o
estudo do Cristianismo Nascente.
Nesse sentido,
merece ser transcrito o extraordinário texto do Espírito Humberto de Campos,
revelando a data do nascimento do Cristo:
[...] o Senhor
chamou o Discípulo Bem-Amado ao seu trono de jasmins matizado de estrelas. O
vidente de Patmos não trazia o estigma da decrepitude, como nos seus últimos
dias entre os espórades. Na sua fisionomia pairava aquela mesma candura adolescente
que o caracterizava no princípio do apostolado.
– João – disse-lhe
o Mestre –, lembras-te do meu aparecimento na Terra?
– Recordo-me,
Senhor. Foi no ano 749 da era romana, apesar da arbitrariedade de Frei
Dionísio, que, calculando no século VI da era cristã, colocou erradamente o
vosso natalício em 754. –
Não, meu João – retornou docemente o Senhor –, não é
a questão cronológica que me interessa, ao te argüir sobre o passado. É que
nessas suaves comemorações vem até mim o doce murmúrio das lembranças!...
– Ah! sim, Mestre
Amado – retrucou pressuroso o Discípulo –, compreendo- vos. Falais da
significação moral do acontecimento. Oh!... se me
lembro... a manjedoura, a estrela guiando os poderosos ao estábulo humilde, os cânticos
harmoniosos dos pastores, a alegria ressoante dos inocentes, afigurando-se-nos
que os animais vos compreendiam mais que os homens, aos quais ofertáveis a
lição da humildade, com o tesouro da fé e da esperança. [...] 6 (Grifo nosso.)
Assim, consoante a
revelação espiritual, pelas mãos do respeitável médium Francisco Cândido Xavier,
Jesus nasceu no ano 749 da era romana. Considerando que o primeiro ano do
calendário gregoriano (Anno Domini – Ano 1), atualmente em vigor no mundo ocidental,
corresponde ao ano 754 U.A.C. (ano da fundação de Roma), e tendo em vista que
não há ano zero, nesse calendário, basta considerar a seqüência 753 U.A.C. = 1
a.C.; 752 U.A.C. = 2 a.C.; 751 U.A.C. = 3 a.C.; 750 U.A.C. = 4 a.C. e 749
U.A.C. = 5 a.C.
Desse modo,
pode-se concluir que o nascimento do Mestre se deu no ano 5 a.C.
.
Fonte: Reformador
Ano 126 Nº 2. 151 • Junho 2008
1MEIER, John P. Um judeu marginal: repensando o Jesus histórico. 3. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1993. p. 367.
2Idem,
ibidem. p. 35
3MEIER,
John P. Um judeu marginal: repensando o Jesus histórico. 3. ed. Rio de Janeiro:
Imago, 1993. p. 50-51.
4Dionysius
Exiguus (470-540 d.C.) nasceu na Scythia Menor (Romênia/Bulgária),
transferindo-se para Roma por volta do ano 500 d.C., onde se tornou tradutor de
inúmeras obras da Igreja Romana, importantes para o direito canônico, além de
ter elaborado a tabela com as datas da Páscoa. Todavia, seu nome entrou para a
história por ser o criador do “Anno Domini”, alterando o calendário da época.
5A.U.C.
(Anno Urbis Conditae) – Ano da fundação da cidade de Roma. Os historiadores fixam
a data da fundação daquela cidade no ano 753 a.C., acolhendo os informes do historiador
romano “Varrão”. É comum confundir-se a sigla A.U.C. com Ab Urbe Condita,
título do livro de Tito Lívio sobre a história de Roma.
6XAVIER,
Francisco Cândido. Crônicas de além-túmulo. Pelo Espírito Humberto de Campos.
15. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 15, p. 89-90. A Adoração dos Pastores,
quadro de Giorgione
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