Desde que me
interessei pelo estudo do passe e do Magnetismo ouço que existem três formas de
magnetização: a humana, a espiritual e a mista. Dentre as muitas dúvidas nessa
área, destaco uma: como se faz magnetização espiritual?
Há alguns
dias convidaram-me para um evento comemorativo em uma instituição espírita,
aqui no sul. Tudo ia muito bem até o término, quando a pessoa que dirigia, após
a palestra, fez a seguinte declaração:
“Hoje, em virtude de um evento especial, a sessão de fluidoterapia será
espiritual. Desejo que os senhores retornem aos seus lares em paz e muito
obrigado pela presença de todos.”
Pisquei os
olhos um pouco chocada, confesso. Por que me deu a impressão de que
magnetização espiritual, no entendimento daquela pessoa, era sinônimo de não
fazer nada e que as exigências comuns que se fazem para uma magnetização mista,
são desnecessárias à espiritualidade.
Imaginei o
trabalho que os espíritos teriam: sairiam correndo atrás de cada uma das cento
e poucas pessoas presentes; na melhor das hipóteses, aplicariam passes pelas
calçadas da cidade ou em automóveis com as pessoas, obviamente, na melhor das
condições de assimilarem as energias, alguns fumando, outros brigando no
trânsito, alguns debatendo o tema da palestra, enfim, mil coisas poderiam envolver
aquelas pessoas.
Outra: será
que a espiritualidade havia sido previamente avisada e assim teriam tido tempo
de informar-se sobre as necessidades daquelas pessoas? Fosse como fosse, deduzi
que o esforço deve ter sido grande. Fiquei pensando e buscando na memória algum
referencial teórico para aquela situação. Não recordei ter encontrado relatos
na literatura de fato semelhante. Já li diversos casos de atendimento magnético
realizado pela espiritualidade, especialmente nas obras de André Luiz, e, aliás,
eles são frequentes em toda literatura mediúnica. Porém, realizados em
residências, em hospitais, sempre em situações que os espíritos que as executam
são conhecedores das necessidades de seus assistidos. Se alguém já leu um caso
de magnetização espiritual sério feito no modelo que presenciei, por favor, me
avise e indique a obra, desde já agradeço.
Como de todo
episódio se deve extrair uma lição, fui à busca de maiores e seguros detalhes
sobre a prática da magnetização espiritual. Busquei Kardec e encontrei na
Revista Espírita de 1865, interessante estudo intitulado “Cura de uma fratura
pela magnetização espiritual”. Recomendo
leitura integral, é muito rico. Mas lá encontrei algumas coisinhas deveras
interessantes, a saber: não foi nada milagroso; o espírito dominava
conhecimento da medicina, tinha sido médico quando encarnado, e era conhecido
da médium; indicou-lhe faixas e a colocação de um aparelho, depois realizou a
magnetização espiritual, indicou repouso e deu orientações para que no dia
seguinte se reunissem vários adeptos (entenda-se espíritas magnetizadores); um
médium magnetizador colocou a enferma em estado sonambúlico e então o espírito
do Dr. Demeure prosseguiu o atendimento; os assistentes presenciaram movimentos
espontâneos do membro fraturado “quando se viu esse membro tomar
insensivelmente, sob influência da atração magnética espiritual, diversas
posições próprias para facilitar a redução da fratura. Parecia ser, então, o
objeto de toques inteligentes, sobretudo no ponto onde deveria se efetuar a
soldadura dos ossos; alongando-se em seguida sob a ação de trações
longitudinais”. Após a magnetização, foi recomendada a recolocação das tiras e
do aparelho. A enferma durante o trabalho, em estado sonambúlico, murmurava:
“Não aperteis tão forte!... Vós me fazeis mal!” Ela se dirigia ao espírito que
a atendia e reclamava de dor.
O texto
esclarece que o magnetizador encarnado durante o trabalho parecia inativo, sua
mão direita, apoiava-se sobre a espádua da sonâmbula, contribuía com sua parte
no fenômeno, pela emissão de fluidos necessários à sua realização.
A enferma
teve uma recaída, havendo deslocado a fratura em decorrência de má posição
durante o sono comum. Foi acometida de febre. Nova reunião foi realizada,
formaram uma cadeia magnética, a pedido dos Espíritos. Já sabemos que essa era
uma prática comum dos magnetizadores contemporâneos de Kardec, a qual consistia
na reunião de vários magnetizadores em torno do atendido, todos colaborando com
a doação de energia, daí alguns usarem a expressão corrente magnética. Depois de vários passes e manifestações
semelhantes à anterior o braço foi recolocado no lugar, não sem que a enferma
suportasse sua cota de dor necessária.
Foram
realizadas magnetizações espirituais nos moldes relatados em dias sucessivos.
Aproximadamente em oito dias a fratura estava curada. Narra que na última
sessão de magnetização espiritual, feita nos moldes acima, “ela tentou suas
forças de mil modos; apresentando seu braço aos assistentes, fazendo os tocar
as cicatrizes da soldadura dos ossos; ela lhes apertava a mão com força,
anunciando-lhes com alegria a sua cura operada pelos bons Espíritos. Em seu
despertar, vendo-se livre em todos seus movimentos, ela desmaiou, dominada por
sua profunda emoção!...”
A explicação
do fenômeno é breve e objetiva explicar o procedimento ordinário de
magnetização realizado por um encarnado e comenta: “O Espírito não age de outro
modo; sua ação fluídica se transmite de perispírito a perispírito, e deste para
o corpo material. O estado de sonambulismo facilita consideravelmente essa
ação, em consequência do desligamento perispiritual, que se identifica melhor
com a natureza fluídica do Espírito, e sofre então a influência espiritual elevada à sua maior força”.
Lido o texto
da Revista Espírita de 1865, minhas dúvidas foram sanadas. Realmente, o mágico,
o maravilhoso, o sobrenatural ainda dominam o pensamento de muitas pessoas. Não
foi sem motivo que Kardec dedicou tantos capítulos em suas obras a combater
essas ideias.
Jornal
Vórtice ANO III, n.º 04, setembro/2010
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