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terça-feira, 19 de março de 2013

MEDIUNIDADE, ESTUDO CLÍNICO


Dr. Nubor Facure

Quando se fala em estudo clínico abrimos mão de qualquer pressuposto teórico, explicativo ou justificativo, o que nos interessa é a pessoa diante de nós. Como exemplo, podemos citar a depressão e o delírio, ambos podem ser descritos em seus elementos característicos e em suas causas motivadoras, porém uma descrição clínica só poderá ser feita diante de um ser humano que manifeste um ou outro e, nessa pessoa, o delírio ou a depressão terão particularidades decorrentes do histórico de vida e da personalidade de quem observamos clinicamente.

Vejo assim a mediunidade analisada do ponto de vista clínico, porque ela é um fenômeno que se manifesta num ser humano, possuidor de uma historia de vida e de sua personalidade.

Clinicamente podemos descrever vários aspectos que se revelam na mediunidade: a sua apresentação antropológica, seu modo de início, sua distribuição quanto ao gênero e a idade, sua duração e constância, seus desencadeantes, suas complicações e seu possível diagnóstico e como diferenciá-la dos quadros comuns da psicopatologia humana como a histeria e as psicoses.

O estudo antropológico da mediunidade é extenso e curioso. Poderíamos, até mesmo, começar questionando como ela teria se apresentado no homem primitivo, embora, nesse sentido, qualquer sugestão seria meramente especulativa. Será melhor nos determos no contexto cultural que ainda apreciamos facilmente nos dias de hoje.

A velha Índia se destaca como um caldeirão de fenômenos inesgotáveis. A Inglaterra e os Estados Unidos trabalham rotulando fenômenos paranormais diversos. O Brasil, especialmente diante da famosa mística baiana, é um gigantesco laboratório de expressões mediúnicas de diversificada apresentação – nos Centros Espíritas, nos terreiros de Umbanda, nos cultos protestantes, nas benzedeiras e nos “santuários” de cirurgia espiritual. Podemos constatar, então, que, na cultura dos diversos povos, a fenomenologia da clínica mediúnica varia de lugar para lugar, isso é assim também na afetividade de cada povo, nas suas personalidades, nas produções artísticas e nas manifestações da doença mental.

O início da mediunidade pode ser lento e trabalhoso, exigindo dedicação e muita disciplina para se confirmar um mínimo de manifestações. Outras vezes pode ser tão explosiva quanto um quadro psicótico com alucinações perturbadoras. Apesar das diferenças tão grandes na personalidade como na sensibilidade emocional como um todo, a mediunidade faz pouca distinção de gênero.

Allan Kardec ensina em O Livro dos médiuns que a mediunidade se processa através do cérebro dos médiuns, o que nos permite pressupor que cérebros iguais conviveriam com mediunidades iguais clinicamente. Tenho procurado encontrar dois gêmeos médiuns para confrontá-los em suas expressões e essa busca até agora foi infrutífera.

A idade é um fator marcante na mediunidade, os livros dão destaque à vidência na criança e nos idosos, os fenômenos físicos na adolescente, e a escrita e a fala no adulto.

Condições ambientais interferem fortemente na mediunidade. Uma sala fechada, ambiente silencioso, levemente frio, grupo de pessoas com certa homogeneidade e vínculos afetivos, um ritual organizado e sistematizado e aprendido em diversos encontros desse mesmo grupo, sugerindo um comportamento disciplinado e condicionado, favorecem a riqueza do fenômeno.

A personalidade introvertida e feminina, talvez indicando mais facilidade de submissão, permitiria mais acesso para abordagem e domínio das entidades espirituais. Existem algumas perguntas que um estudo clínico pode responder:  A mediunidade é uma doença? As doenças mentais são, de alguma forma, estados mediúnicos? A mediunidade, clinicamente, é passível de mistificação?

Doença é uma perturbação no bem-estar físico, psíquico, social e espiritual do indivíduo. Podemos então, com o máximo de cuidado ético, considerar que em certas manifestações clínicas da mediunidade, ela pode se apresentar como doença, especialmente naqueles momentos em que sua presença perturba o indivíduo na sua homeostase física e psíquica.
A mediunidade pode ser de tal forma florida em sua clínica que se confunde com vários transtornos mentais. O difícil é o seu diagnóstico correto.
As doenças mentais são fragilidades da Alma, facilitadoras de atuação de espíritos perturbadores, querelantes e exigente de direitos que cobram do indivíduo que se perturbou, constituindo, portanto, uma associação clínica simbiótica.

Quanto à mistificação, diga-se de passagem, que ela é um fenômeno tão corriqueiro na mente humana que sempre deve ser considerada nas avaliações clínicas da mediunidade.

Assim como um médico bem treinado percebe um quadro histérico que mistifica uma paralisia, um doutrinador espírita deverá adquirir experiência no detectar o animismo e a mistificação.

Dr. Nubor Facure é médico neurocirurgião, especialista em neurologia, fundador e diretor do Instituto do Cérebro, em Campinas, SP
ICEB - Instituto de Cultura Espírita do Brasil / Rio de Janeiro

Revista Cultura Espírita Ano IV – nº  46 - Janeiro / 2013


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