Um
dos correspondentes da Revista Espírita enviou a Allan Kardec, a seguinte pergunta,: “Deve-se
publicar tudo quanto dizem os Espíritos?” O Codificador do Espiritismo
respondeu a indagação com outra pergunta: “(…) seria bom publicar tudo quanto
dizem e pensam os homens?”[1]
Antes,
porém, de emitir opinião abalizada sobre o assunto, Kardec apresenta
ponderadas considerações que merecem ser recordadas, sobretudo porque
permanecem atuais:
Quem
quer que possua uma noção do Espiritismo, por mais superficial que seja, sabe
que o mundo invisível é composto de todos os que deixaram na Terra o envoltório
visível. Entretanto, pelo fato de se haverem despojado do homem carnal, nem por
isso os Espíritos se revestiram da túnica dos anjos. Encontramo-los de todos os
graus de conhecimento e de ignorância, de moralidade e de imoralidade; eis o
que não devemos perder de vista. Não esqueçamos que entre os Espíritos, assim
como na Terra, há seres levianos, estouvados e zombeteiros; (pseudo sábios);
vãos e orgulhosos, de um saber incompleto; hipócritas, malvados e (…) existem
os sensuais, os ignóbeis e os devassos, que se arrastam na lama. Ao lado disto,
tal como ocorre na Terra, temos seres bons, humanos, benevolentes,
esclarecidos, de sublimes virtudes (…); resulta que o mundo dos Espíritos
compreende seres mais avançados intelectual e moralmente que os nossos homens
mais esclarecidos, e outros que ainda estão abaixo dos homens mais
inferiores.[2]
Prosseguindo
em suas considerações, Kardec enfatiza a necessidade de aprendermos analisar o
teor das mensagens mediúnicas, atentos à linguagem utilizada pelo comunicante
desencarnado, principalmente quando esta
comunicação é subscrita com o nome de personalidade conhecida,
respeitada e amada.
Desde
que esses seres [desencarnados] têm um meio patente de comunicar-se com os
homens, de exprimir os pensamentos por sinais inteligíveis, suas comunicações
devem ser o reflexo de seus sentimentos, de suas qualidades ou de seus vícios.
Serão levianas, triviais, grosseiras, mesmo obscenas, sábias, sensatas e
sublimes, conforme o seu caráter e sua elevação. Revelam-se por sua própria
linguagem; daí a necessidade de não se aceitar cegamente tudo quanto vem do
mundo oculto, e submetê-lo a um controle severo. (…).[3]
Os
comentários que se seguem, expõem de forma clara o pensamento de Allan Kardec
relativo ao assunto, e as suas ponderações devem servir de modelo para todos
nós, espíritas, que cotidianamente recebemos notícias do plano espiritual.
Ao
lado dessas comunicações francamente más, e que chocam qualquer ouvido
delicado, outras há que são simplesmente triviais ou ridículas. Haverá
inconvenientes em publicá-las? Se forem dadas pelo que valem, serão apenas
impróprias; se o forem como estudo do gênero, com as devidas precauções, os
comentários e os corretivos necessários, poderão mesmo ser instrutivas, naquilo
que contribuírem para tornar conhecido o mundo espírita em todos os seus
aspectos. Com prudência e habilidade tudo pode ser dito; o mal é dar como sérias
coisas que chocam o bom senso, a razão e as conveniências. Neste caso, o perigo
é maior do que se pensa. (…).[4]
Surgem,
então e muito naturalmente, outras indagações: que riscos podem ocorrer, caso
sejam divulgadas mensagens mediúnicas triviais, sem maiores exames? Que problemas poderiam advir da publicação de
mensagens pressupostamente assinadas por entidades veneráveis, mas que, aqui e
ali, apresentam pontos discordantes quanto à identificação? Revelando-se como arguto analista, Kardec
esclarece:
Em
primeiro lugar, essas publicações têm o inconveniente de induzir em erro as
pessoas que não estão em condições de aprofundá-las nem de discernir o
verdadeiro do falso, especialmente numa questão tão nova como o Espiritismo. Em
segundo lugar, são armas fornecidas aos adversários, que não perdem tempo em
tirar desse fato argumentos contra a alta moralidade do ensino espírita;
porque, insistimos, o mal está em considerar como sérias coisas que constituem
notórios absurdos. Alguns mesmos podem ver uma profanação no papel ridículo que
emprestamos a certas personagens justamente veneradas, e às quais atribuímos
uma linguagem indigna delas.[5]
Em
suma, assevera Allan Kardec, como conclusão da análise deste assunto, tão útil
quanto necessário:
(…)
As comunicações grosseiras e inconvenientes, ou simplesmente falsas, absurdas e
ridículas, não podem emanar senão de Espíritos inferiores: o simples bom senso
o indica. (…) A importância que, pela
publicidade, é concedida às suas comunicações, os atrai, excita e encoraja. O
único e verdadeiro meio de os afastar é provar-lhes que não nos deixamos
enganar, rejeitando impiedosamente, como apócrifo e suspeito, tudo que não for
racional, tudo que desmentir a superioridade que se atribui ao Espírito que se
manifesta e de cujo nome ele se reveste. Quando, então, vê que perde seu tempo,
afasta-se.[6]
Os
espíritas esclarecidos estão compromissados com a Causa, onde quer que se
encontrem. Pontuam fidelidade à Doutrina Espírita e não se afastam do propósito
de se transformarem em pessoas de bem.
Não se deixam enganar por informações infelizes, mentirosas mesmo,
presentes em algumas publicações, supostamente espíritas, mas que não resistem
a uma análise séria, e o que é mais grave: contrariam a mais elementar
conceituação espírita: o controle universal do ensino dos Espíritos que,
brilhantemente, Allan Kardec inseriu no primeiro capítulo de A Gênese. Os
Milagres e as Predições, que trata do Caráter da Revelação Espírita. É
importante conferir.
Assim,
nada mais justo, e necessário, portanto, seguir este conselho de Bezerra de
Menezes: “(…) Mantenhamo-nos, por isso, vigilantes. Jesus na Revelação e Kardec
no esclarecimento resumem para nós códigos numerosos de orientação e conduta.
(…).”[7]
[1] Allan Kardec. Revista Espírita- Jornal de
estudos Psicológicos. Ano II, novembro
de 1859, pág. 423.
[2]
Ibid., pág. 423/424.
[3]
Ibid., pág. 424.
[4]
Ibid., pág. 425.
[5]
Ibid. ibid., pág. 425.
[6]
Ibid., pág. 427.
[7] Juvanir Borges de Souza (coord.). Bezerra
de Menezes: Ontem e Hoje. Pt. 3,, cap. 16, pág. 153. (mensagem psicografada por
Francisco Cândido Xavier, publicada em Reformador de abril de 1977, pág. 104.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
KARDEC, Allan. Revista Espírita. Jornal de
Estudos Psicológicos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. Poesias traduzidas por
Inaldo Lacerda Lima. 2ª ed. Ano II. Novembro de 1859. Nº 11. Rio de
Janeiro: FEB Editora, 2004.
SOUZA, Juvanir Borges (coordenador). Bezerra
de Menezes: Ontem e Hoje. 4ª ed. 4ª imp. Brasília: FEB Editora, 2013.
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