Mesmo
proibida, pois geralmente era praticada com fins inferiores, a comunicação
mediúnica é um fato bíblico.
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Dentre vários
outros, a comunicação com os chamados “mortos” é um dos princípios básicos do
espiritismo, inclusive, podemos dizer que é um dos fundamentais, pois foi de
onde surgiu todo o seu arcabouço doutrinário.
Na conclusão
de O Livro dos Espíritos, Kardec argumenta que: “Esses fenômenos ... não são
mais sobrenaturais que todos os fenômenos aos quais a Ciência hoje dá a
solução, e que pareceram maravilhosos numa outra época. Todos os fenômenos
espíritas, sem exceção, são a conseqüência de leis gerais e nos revelam um dos
poderes da Natureza, poder desconhecido, ou dizendo melhor, incompreendido até
aqui, mas que a observação demonstra estar na ordem das coisas”.
Essa
abordagem de Kardec é necessária, pois apesar de muitos considerarem tais
fenômenos como sobrenaturais, enquanto que inúmeros outros os quererem como
fenômenos de ordem religiosa, as duas teses são incorretas. A origem deles é
espontânea e natural e ocorre conforme as leis que regem não só o contato entre
o mundo material e o espiritual, mas toda a complexa interação que mantém o
equilíbrio universal. Por isso não precisaríamos relacioná-los, nem mesmo
buscar comprovação de sua realidade entre as narrativas bíblicas.
MEDIUNIDADE
NA BÍBLIA
Primeiramente,
selecionei alguns trechos com relação à sobrevivência do espírito, pois ela é a
peça fundamental nas comunicações. Leiamos:
- Quanto a
você [Abraão], irá reunir-se em paz com seus antepassados e será sepultado após
uma velhice feliz. (Gn.15,15).
- Quando Jacó
acabou de dar instruções aos filhos, recolheu os pés na cama, expirou e se
reuniu com seus antepassados. (Gn 49,33).
- Eu digo a
vocês: muitos virão do Oriente e do Ocidente, e se sentarão à mesa no Reino do
Céu junto com Abraão, Isaac e Jacó. (Mt 8,11).
- E, quanto à
ressurreição, será que não leram o que Deus disse a vocês: “Eu sou o Deus de
Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó”? Ora, ele não é Deus dos mortos, mas
dos vivos. (Mt 22,31-32).
Podemos
concluir dessas passagens que há no homem algo que sobrevive à morte física.
Não haveria sentido algum dizer que uma pessoa, após a morte, irá se reunir com
seus antepassados, se não se acreditasse na sobrevivência do espírito. Além
disso, para que ocorra a possibilidade de alguém poder “sentar à mesa no Reino
do Céu junto com Abraão, Isaac e Jacó” teria que ser porque esses patriarcas
estão tão vivos quanto nós.
Os relatos
bíblicos nos dão conta que o intercâmbio com os mortos era um fato corriqueiro
na vida dos hebreus. Por outro lado, quase todos os povos com quem mantiveram
contato tinham práticas relacionadas à evocação dos espíritos para fins de adivinhação,
denominada necromancia. O Dicionário Bíblico Universal a define com sendo ,.o
meio de adivinhação interrogando um morto.
Babilônios,
egípcios e gregos a praticavam. Hetiodoro, autor grego do III ou IV século d.C.
relata uma cena semelhante àquela descrita em 1Sm (Etíope 6,14). O Deuteronômio
atribui aos habitantes da Palestina “a interrogação dos espíritos ou a evocação
dos mortos” (18,11). Os israelitas também se entregaram a essas práticas, mas
logo são condenadas, particularmente por Saul (lSm 28,38). Mas, forçado pela
necessidade, o rei manda evocar a sombra de Samuel (28, 7-25): o relato
constitui uma das mais impressionantes páginas da Bíblia. Mais tarde, Isaías
atesta uma prática bastante difundida (Is 8,19): parece que ele ouviu “uma voz
como a de um fantasma que vem da terra” (29,4). Manasses favoreceu a prática da
necromancia (2Rs 21,6), mas Josias a eliminou quando fez sua reforma (2Rs
23,24). Então o Deuteronômio considera a necromancia e as outras práticas
divinatórias como “abominação” diante de Deus, e como o motivo da destruição
das nações, efetuada pelo Senhor em favor de Israel (18,12). O Levítico
considera a
necromancia
como ocasião de impureza e condena os necromantes à morte por apedrejamento
(19,31; 20,27).
Vejamos mais algumas
passagens:
- Quando
entrares na terra que o Senhor teu Deus te der, não apreenderás a fazer
conforme as abominações daqueles povos. Não se achará entre ti quem faça passar
pelo fogo o seu filho ou a sua filha, nem adivinhador, nem prognosticador, nem
agoureiro, nem feiticeiro; nem encantador, nem necromante, nem mágico, nem quem
consulte os mortos; pois todo aquele que faz tal cousa é abominação ao Senhor;
e por tais abominações o Senhor teu Deus os lança de diante de ti. Perfeito
serás para com o Senhor teu Deus. Porque estas nações, que hás de possuir,
ouvem os prognosticadores e os adivinhadores; porém a ti o Senhor teu Deus não
permitiu tal cousa. (Dt 18,9-14).
Esta passagem
diz respeito à adivinhação e à necromancia. Elas se encontram entre as
proibições. A preocupação central era proibir qualquer tipo de coisa
relacionada à adivinhação, não importando por qual meio fosse realizada, como
fica claro pela última passagem onde se diz “... estas nações, ... ouvem os
prognosticadores e os adivinhadores...”, reunindo assim todas as práticas a
essas duas.
AS
COMUNICAÇÕES E SUA PROIBIÇÃO
Por outro
lado, a grande questão a ser levantada é: os mortos atendiam às evocações ou
não? Se não, por que da proibição? Seria ilógico proibir algo que não acontece.
Teremos que tentar encontrar as razões de tal proibição. Duas podemos destacar.
A primeira é que os espíritos dos mortos eram considerados, por muitos, como
deuses. Levando-se em conta que era necessário manter, a todo custo, a idéia de
um Deus único, Moisés, sabiamente, institui a proibição de qualquer evento que
viesse a prejudicar essa unicidade divina. As consultas deveriam ser dirigidas
somente a Deus, daí, por forças das circunstâncias, precisou proibir todas as
outras. A segunda estaria relacionada ao motivo pelo qual iam consultar os
mortos. Normalmente, eram para coisas relacionadas ao futuro, como no caso de
Saul, que iremos ver logo à frente, ou para situações do cotidiano, quando, por
exemplo, do desaparecimento das jumentas de Cis, em que Saul, seu filho,
procura um vidente para que ele dissesse onde poderiam encontrá-las.
A figura do
profeta aparece como sendo a pessoa que tem poderes para fazer consultas a Deus
ou receber da divindade as revelações que deveriam ser transmitidas ao povo. Em
razão de querer a exclusividade das consultas a Deus é que Moisés disse “Javé,
seu Deus fará surgir, dentre seus irmãos, um profeta como eu em seu meio, e
vocês o ouvirão”. (Dt 18,15). Elucidamos essa questão com o seguinte passo: “Em
Israel, antigamente, quando alguém ia consultar a Deus, costumava dizer: ‘Vamos
ao vidente’. Porque, em lugar de ‘profeta’, como se diz hoje, dizia-se
‘vidente’”(1Sm 9,9). O que é vidente (clarividente) senão quem tem a faculdade
de ver os espíritos? Em alguns casos poderá ver inclusive o futuro; daí a idéia
de que poderia prever alguma coisa, uma profecia, derivando-se daí, então, o
nome profeta. Podemos confirmar o que estamos dizendo aqui nesse parágrafo,
peta explicação dada à passagem Dt 18,9-22:
Moisés não
era totalmente contra o profetismo (mediunismo), apenas era contrário ao uso
indevido que davam a essa faculdade. Podemos, inclusive, vê-lo aprovando a
forma com que dois homens a faziam, conforme a seguinte narrativa em Nm 11,
24-30:
- Moisés saiu
e disse ao povo as palavras de Iahweh. Em seguida reuniu setenta anciães dentre
o povo e os colocou ao redor da Tenda. Iahweh desceu na Nuvem. Falou-lhe e
tomou do Espírito que repousava sobre ele e o colocou nos setenta anciães.
Quando o Espírito repousou sobre eles, profetizaram; porém, nunca mais o
fizeram.
- Dois homens
haviam permanecido no acampamento: um deles se chamava Eldad e o outro Medad. O
Espírito repousou sobre eles; ainda que não tivessem vindo à Tenda, estavam
entre os inscritos. Puseram-se a profetizar no acampamento. Um jovem correu e
foi anunciar a Moisés: “Eis que Eldad e Medad”, disse ele, “estão profetizando
no acampamento”. Josué, filho de Nun, que desde a sua infância servia a Moisés,
tomou a palavra e disse: “Moisés, meu senhor, proíbe-os!” Respondeu-lhe Moisés:
“Estás ciumento por minha causa? Oxalá todo o povo de Iahweh fosse profeta,
dando-lhe Iahweh o seu Espírito!” A seguir Moisés voltou ao acampamento e com
ele os anciães de Israel. Fica claro, então, que pelo menos duas pessoas faziam
dignamente o uso da faculdade mediúnica (profeta), daí Moisés até desejar que
todos fizessem como eles.
Outro ponto
importante que convém ressaltar é a respeito da palavra espírito, que aparece
inúmeras vezes na Bíblia. Mas afinal o que é espírito? Hoje sabemos que os
espíritos são as almas dos homens que foram desligadas do corpo físico pelo
fenômeno da morte. Assim, podemos perfeitamente aceitar que, exceto quando
atribuem essa palavra ao próprio Deus, todas as outras estão incluídas nessa
categoria.
Tudo, na verdade,
não passava de manifestações dos espíritos, que muitas vezes eram tomados à
conta de deuses, devido a ignorância da época, coisa absurda nos dias de hoje.
Isso fica tão claro que podemos até mesmo encontrar recomendações de como nos
comportar diante deles para sabermos suas verdadeiras intenções. Citamos:
“Amados, não acrediteis em qualquer espírito, mas examinai os espíritos para
ver se são de Deus,...” (1 Jo 4, 1).
JESUS E AS
COMUNICAÇÕES
Disso pode-se
concluir que era comum, àquela época, o contato com os espíritos. Podemos
confirmar isso com o Apóstolo dos gentios, que recomendou sobre o uso dos
“dons” (mediunidade), conforme podemos ver em sua primeira carta aos Coríntios
(cap. 14). Neta ele procura demonstrar que o dom da profecia é superior ao dom
de falar em línguas (xenoglossia), pois não via nisso nenhuma utilidade senão
quando, juntamente, houvesse alguém com o dom de interpretá-las.
Uma coisa nós
podemos considerar. Se ocorriam manifestações naquela época, por que não as
aconteceria nos dias de hoje? Veremos agora a mais notável de todas as
manifestações de espíritos que podemos encontrar na Bíblia, pois ela acontece
com o próprio Cristo. Leiamos:
- Seis dias
depois, Jesus tomou consigo Pedro, os irmãos Tiago e João, e os levou a um lugar
à parte, sobre uma alta montanha. E se transfigurou diante deles: o seu rosto
brilhou como o sol, e as suas roupas ficaram brancas como a luz. Nisso lhes
apareceram Moisés e Elias, conversando com Jesus. Então Pedro tomou a palavra,
e disse a Jesus: “Senhor, é bom ficarmos aqui. Se quiseres, vou fazer aqui três
tendas: uma para ti, outra para Moisés, e outra para Elias.” Pedro ainda estava
falando, quando uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra, e da nuvem saiu
uma voz que dizia: “Este é o meu Filho amado, que muito me agrada. Escutem o
que ele diz.” Quando ouviram isso, os discípulos ficaram muito assustados, e
caíram com o rosto por terra. Jesus se aproxi.mou, tocou neles e disse:
“Levantem-se, e não tenham medo.” Os discípulos ergueram os olhos, e não viram
mais ninguém, a não ser somente Jesus. Ao descerem da montanha, Jesus
ordenou-lhes: “Não contem a ninguém essa visão, até que o Filho do Homem tenha
ressuscitado dos mortos” (Mt 17,1-9).
Ocorrência
inequívoca de comunicação com os mortos, no caso, os espíritos Moisés e Elias,
que conversam pessoalmente com Jesus. E aí afirmamos que se fosse mesmo
proibida por Deus, Moisés não viria se apresentar a Jesus e seus discípulos, já
que foi ele mesmo, quando vivo, quem informou dessa proibição, e nem Jesus iria
infringir uma lei divina. Portanto, a proibição de Moisés era apenas uma
proibição particular sua ou de sua legislação de época. Os partidários do
demônio ficam sem saída nessa passagem, pois não podem afirmar que foi o
“demônio” quem apareceu para eles, já que teriam que admitir que Jesus fora
enganado.
Podemos ainda
ressaltar que, depois desse episódio, Jesus não proibiu a comunicação com os
mortos. Apenas disse aos discípulos para não que contassem a ninguém sobre
aquela “sessão espírita”, até que acontecesse a sua “ressurreição”. E se ele
mesmo disse: “tudo que eu fiz vós podeis fazer e até mais” (Jo 14,12) os que se
comunicam com os mortos estão seguindo o exemplo de Jesus. Os cegos até poderão
ficar contra, mas os de mente aberta não verão nenhum mal nisso.
Quem já teve
a oportunidade de ler a Bíblia, pelo menos uma vez, percebe que ela está
recheada de narrativas com aparições de anjos. Na ocasião da ressurreição de
Jesus, algumas delas nos dão conta do aparecimento, junto ao sepulcro, de “anjos
vestidos de branco” (Jo 20,12; Mt 28,2), enquanto que outras nos dizem ser
“homens vestidos de branco” (Lc 24,4; Mc 16,5). Isso demonstra que os anjos são
espíritos, e que muitos podem até ter vivido na Terra. Até mesmo os nomes dos
anjos são nomes dados a seres humanos: Gabriel, Rafael, Miguel etc.
Podemos
concluir que realmente a comunicação com os mortos está presente na Bíblia, por
mais que se esforcem em querer tirar dela esse fato.
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