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domingo, 17 de fevereiro de 2013

A VERDADEIRA APARÊNCIA DE JESUS


Fabiano P. Nunes

Por mais de dois milênios, o enigma da real aparência de Jesus tem sido motivo de infindáveis especulações, inquietando o imaginário de religiosos, devotos, artistas e investigadores científicos.
Desde a época da renascença cultural, a arte tem sido inspirada por modelos de um homem-Jesus com finos e belos traços europeus, olhos azuis e cabelos com matizes do louro. Conquanto esse arquétipo mental continue dominando o psiquismo de grande parte da cristandade até os dias atuais, não existem evidências histórico-científicas que confirmem tal pressuposição.
Sob o rigor do método científico, a carta dirigida pelo senador Públio Lentulus – personagem ainda não identificado pelos historiadores1 – ao imperador romano Tibério, contendo uma descrição física e moral de Jesus, tem sido considerada apócrifa2, por ora.

De igual modo, a autenticidade de O Sudário de Turim – o lençol de linho longo e desigual que exibe a imagem, frente e costas, de um indivíduo crucificado, a qual muitos acreditam pertencer a Jesus – tem sido duramente contestada por renomados pesquisadores3, sobretudo em função dos resultados de testes com o carbono-14 feitos em fragmento do Sudário, que não demonstraram uma datação compatível com o século I.

O assunto da legitimidade do Sudário ainda carece de maiores verificações científicas para lograr concordância na comunidade científica. Além disso, nenhum dos oito autores - nove, para os exegetas que não consideram Paulo como o autor da Epístola aos Romanos - dos 27 livros que compõem o Novo Testamento ofereceu qualquer informação direta quanto aos aspectos corporais de Jesus, levando muitos pesquisadores a acreditarem que a feição de Jesus não apresentaria diferenças em relação aos traços faciais característicos do grupo étnico hebreu da região da Judeia, como pode, por exemplo, ser inferido pela análise dos relatos evangélicos sobre a prisão de Jesus no Jardim do Getsêmani. Naquela ocasião, os soldados do Templo de Jerusalém não conseguiram distingui-Lo dentre os demais discípulos, sendo necessária a autodenominação feita por Jesus e o beijo de Judas Iscariotes, para que se O identificassem sem equívocos4. Por outro lado, há indícios bíblicos de que a aparência de Jesus viria ser bastante desgastada pelas duras pelejas de sua vida.

No livro de Isaías5, o profeta que trouxera as ricas anunciações sobre o advento do Messias Hebreu nos oferece as notícias proféticas acerca do Ungido de Deus: “Ele cresceu diante dele como um renovo, como raiz que brota em terra árida; não tinha beleza nem esplendor que pudesse atrair o nosso olhar, nem formosura capaz de nos deleitar. Era desprezado e abandonado pelos homens, um homem sujeito à dor, familiarizado com o sofrimento, como uma pessoa de quem todos escondem o rosto; desprezado, não fazíamos caso nenhum dele.” Poder-se-ia, ainda, fazer uma ilação sobre uma aparência envelhentada de Jesus no relato contido em O Evangelho Segundo João6: “Abraão, vosso pai, exultou por ver o meu Dia. Ele o viu e encheu-se de alegria!” Disseram-lhe, então, os judeus: “Não tens ainda cinquenta anos e viste Abraão!” Jesus lhes disse: “Em verdade, em verdade, vos digo: antes que Abraão existisse, EU SOU”. Então apanharam pedras para atirar nele;”

Nesse relato do Evangelista João6, constata-se que Jesus fora confundido pelos Doutores da Lei com um homem de quase cinquenta anos, não obstante ainda fosse um moço com trinta e poucos anos, em virtude de uma vida especialmente áspera para com Ele: perseguições intermináveis desde a infância, orfandade e precoce arrimo à família, pobreza, trabalhos extenuantes, incompreensões e caridade ininterrupta com absoluto olvido de si mesmo.

A despeito do nobre esforço de investigadores em desvelar a aparência de Jesus, seria realmente importante conhecer Suas verdadeiras linhas físicas? Com base na voluntária inexistência de informes legada pelos Seus mais admiráveis discípulos, acreditamos 
que não. Observaremos que Lucas de Antioquia, a quem são atribuídos a autoria de O Evangelho Segundo Lucas e de Atos dos Apóstolos, na condição de o primeiro investigador do “Jesus Histórico”, não dispensara qualquer atenção à Sua aparência fisionômica.

Outrossim, notaremos que Paulo de Tarso, o grande apóstolo que tivera a experiência de ver o Cristo na Sua condição de espírito puro (I Cor 9:1; I Cor 15:8) e com Ele se comunicar em várias ocasiões (Gal 1:12; I Cor 11: 23), cujas epístolas são consideradas magistrais dissertações acerca da doutrina cristã, igualmente não franqueara nenhuma consideração sobre as feições do Mestre, ainda que indiretamente.

No entanto, é Allan Kardec – alcunha do cientista e pedagogo francês H.L.D. Rivail – quem, 143 anos antes dos grandes autores contemporâneos, apresenta a luz da exegese perfeita para mais esta temática, novamente desvelando extraordinária sintonia com o próprio pensamento do Cristo7. Em A gênese8, o apóstolo do cristianismo da Idade Moderna9 lega à ciência hermenêutica admirável interpretação para a irrelevância do conhecimento da real feição de Jesus: [...] “Como homem, tinha a organização dos seres carnais, mas como espírito puro, desprendido da matéria, devia viver mais da vida espiritual do que da vida corporal, da qual não possuía as fraquezas.

Sua superioridade sobre os homens não resultava das qualidades particulares do seu corpo, mas das do seu espírito, que dominava a matéria de uma maneira absoluta, e da qualidade do seu perispírito, constituído da parte mais quintessenciada dos fluidos terrestres.” [...]

O Espiritismo também tem por missão restituir o cristianismo ao seu sentido genuinamente espiritual9, porquanto, nesse capítulo, o fi el servo lionês de O Espírito de Verdade conduz-nos o entendimento acerca dos fanais que verdadeiramente devem arrebatar o cristão sincero: a vida, os ensinos e a obra do Cristo.

Consonante com a visão dos Evangelistas, de Paulo de Tarso e de Allan Kardec, apreende-se, pois, ser condição essencial para fazermos uma imersão na clareza diamantina dos ensinos de Jesus que libertemo-nos integralmente de toda e qualquer forma de idolatria, desvinculando-nos dos atavismos multisseculares que ainda possam se nos agrilhoar, com o fito de incorporarmos o exato espírito do cristianismo, definitivamente fi xando-nos na alma seus sublimes e verazes conteúdos.

Referências:
1. Publius Lentulus. In: Wikipédia – A enciclopédia livre. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Publius_Lentulus. Acesso em abril de 2011.
2. Oliveira, Therezinha. Estudos espíritas do Evangelho. Campinas, SP: Allan Kardec Ed, 2005. 6. Ed. p. 110.
3. Zugibe, Frederick T. Crucifi cação de Jesus. As conclusões surpreendentes sobre a morte de Cristo na visão de um investigador criminal. Tradução de Paulo Cavalcante. São Paulo: Ideia & Ação, 2008. 455 p.
4. Debarros, Aramis C. Doze homens, uma missão. Curitiba, PR: Editora Luz e Vida, 1999. 338p.
5. BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém. Nova edição rev. e ampl. São Paulo: Paulus, 2002. 3 a. Impressão: 2004. Isaías, cap. 53, vers. 1-4, p. 1340.
6. BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém. Nova edição rev. e ampl. São Paulo: Paulus, 2002. 3 a. Impressão: 2004. O Evangelho Segundo João, cap. 8, vers. 56-59, p. 1867. 7. KARDEC, Allan. Obras póstumas. Tradução de Guillon Ribeiro. 33. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003. Segunda parte, p.307-308.
8. KARDEC, Allan. A gênese. Os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Tradução de Albertina Escudeiro Sêco. 2. Ed., Rio de Janeiro: CELD. ed. 2008. Cap. XV, item 2. p. 332
9. KARDEC, Allan. Revista Espírita. Jornal de Estudos Psicológicos. Ano sexto, novembro de 1863. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. p. 476.

ICEB - Instituto de Cultura Espírita do Brasil - III - no 28 - Julho / 2011 


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