Tiago Martins dos Santos
Análise e refutação de algumas afirmações
de Herculano Pires sobre a origem dos passes em “Obsessão. O Passe. A Doutrinação”
O passe espírita é simplesmente a imposição das mãos, usada e ensinada por
Jesus como se vê nos Evangelhos. Origina-se das práticas de cura do Cristianismo
primitivo. Sua fonte humana e divina são as mãos de Jesus. (PIRES, Herculano.
Obsessão. O Passe. A doutrinação. Ed. Paidea)
Há aqui dois erros que precisam
ser elucidados: (1) a questão da imposição de mãos por Jesus e os primeiros
cristãos; (2) a origem dos passes no Espiritismo. É sobre o primeiro erro que
desejo dedicar este escrito fundamentalmente.
Historicamente, é sabido que os
passes no Espiritismo não decorrem das práticas de curas dos primeiros cristãos
como afirma Herculano, mas das práticas magnéticas desenvolvidas por Mesmer.
Filosoficamente é possível recuar no tempo e afirmar que os passes espíritas
têm uma ligação com aqueles realizados pelos primeiros cristãos, fazendo uso da
analogia. No entanto, esta ideia mascara e esconde a origem real destas
práticas: Mesmer e seus discípulos.
O Espiritismo é doutrina racional
fundamentada em fatos. Estabelecer que os passes espíritas decorrem das
práticas dos primeiros cristãos significa afirmar a existência de uma sucessão
apostólica na fluidoterapia, em que Jesus ensinou a imposição de mãos aos
apóstolos, os apóstolos aos seus sucessores, estes a terceiros, assim
sucessivamente até Kardec, e de Kardec aos dias de hoje. E isto é tão falso
quanto uma cédula de três reais.
Conforme
os fatos históricos, o que de fato ocorreu é que as práticas de cura
pela ação dos fluidos magnéticos foram estudadas e reveladas ao público por
Mesmer. Antes de Mesmer, a fluidoterapia era simplesmente uma ação sobrenatural
que circundava alguns homens eleitos
pela Potestade Divina. Mesmer,
no entanto, demonstrou que o Magnetismo é lei natural. Posteriormente, os
discípulos de Mesmer sistematizaram o conhecimento magnético e vulgarizaram a
sua prática.
É no contexto de difusão das
práticas magnéticas que surge o Espiritismo no mundo. Um magnetizador chamado Hippolyte
Léon Denizard Rivail interessa-se pelos curiosos fenômenos das mesas girantes,
para ele fenômenos que, inicialmente, nada mais revelavam que um desdobramento
das teorias magnéticas. Aprofundando a análise dos fatos, o Professor Rivail
percebe um agente desconhecido e insuspeitado para estes fatos: os mortos!
Escreve um livro chamado O Livro dos Espíritos, toma o pseudônimo de Allan
Kardec e dá o pontapé inicial para a Doutrina Espírita. Não bastasse isto, este
professor tem a ousadia de afirmar que a nova ciência não nascia independente
da sua predecessora, mas que Espiritismo e Magnetismo formam uma única ciência
(LE, questão 555).
De fato, é bonito pensar que
os passes vem diretamente das mãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas a verdade histórica
mostra que foi um discípulo dele, Mesmer, quem revelou ao público a ciência
magnética (pressuponho com base em Kardec que Mesmer era um Espírito missionário,
por isto discípulo do Cristo). Como afirma Emmanuel, “nem tudo que é admirável
é divino” e, portanto, verdadeiro. Uma ideia bonita sobre o passe é apenas uma
ideia bonita se não está fundamentada em Kardec e no Magnetismo.
Não existe
qualquer linhagem professor-discípulo em fluidoterapia desde Jesus até
os dias de hoje. Sabemos que Jesus foi o maior magnetizador que o mundo
conheceu, porém sabemos disto porque Mesmer, Du Potet e Kardec nos deram a
conhecer o Magnetismo. Antes de Mesmer, repita-se, as curas eram milagres que
aconteciam por obra de Deus, numa intervenção sobrenatural, ideia muito contrária
aos postulados espíritas. Com todo respeito que Jesus nos merece, creio que nem
Jesus corroboraria a afirmação de que o passe deriva historicamente Dele, pois
Magnetismo é lei natural conhecida a partir de Mesmer.
Mas eu havia afirmado que desejava
escrever algo sobre as imposições de mãos dos primeiros cristãos. Agora, desfeito
o mal entendido quanto à origem da fluidoterapia, é possível desmitificar um
pouco a questão das imposições.
Difundiu-se no Movimento
Espírita, principalmente a partir das afirmações de Roque Jacintho (O passe e o
Passista) e de Herculano Pires (Obsessão. O Passe. A Doutrinação), que o passe
na Casa Espírita ocorre apenas pelas chamadas imposições de mãos. Esta posição
é mais radical em Herculano Pires que em Roque Jacintho, porém não há como
demonstrar isto neste momento.
Como um verdadeiro mantra, os espíritas
repetem: “Jesus impunha as mãos, Jesus impunha as mãos, Jesus impunha as mãos”,
dando a entender que qualquer um que faça diferente faz algo que o Cristo não
fazia. Como afirma Kardec que Jesus é o modelo da Humanidade, qualquer um que
faça diferente do mantra laboraria fora do Espiritismo, revivescência do
cristianismo primitivo(aqui não há ironia).
“Uma ideia bonita sobre o
passe é apenas uma ideia bonita se não está fundamentada em Kardec e no Magnetismo”.
Ao mesmo
tempo em que os espíritas brasileiros repetem o mantra das imposições,
eles repetem outro: “não pode tocar no paciente, não pode tocar no paciente, não
pode tocar no paciente”. Pessoalmente não se pode ser a favor do toque, nem
contra o toque: como uma técnica, o toque tem as suas devidas aplicações dentro
da teoria magnética e da Doutrina Espírita.
É curioso como se criou no
Movimento Espírita um tabu quanto ao toque, ao invés de um conhecimento lúcido sobre
esta técnica.
Sem dúvida que estas criações
mantrificadas, para não dizer hipnóticas, têm a sua devida razão de ser.
Que pensa Kardec do assunto?
556. Têm algumas pessoas, verdadeiramente, o poder de curar pelo simples contato?
A força magnética pode chegar
até aí, quando secundada pela
pureza dos sentimentos e por um ardente desejo de fazer o bem, porque então os bons
Espíritos lhe vêm em auxílio. (...) (Livro dos Espíritos)
Está evidente que para a Doutrina
Espírita o toque não é vetado, pois se assim fosse os Espíritos simplesmente responderiam
que não se deve tocar o assistido ou, ainda, que a força magnética prescinde do
toque. Ao contrário, “a força magnética pode chegar até aí”,
isto é, até ao ponto “de curar pelo simples contato”,
pelo toque!
Os
Espíritos também poderiam afirmar que o toque é uma prática meramente
ritual, mas não o fizeram. Ao contrário, se o indivíduo toca o paciente com
“pureza dos sentimentos” e “ardente desejo de fazer o bem”, os Espíritos Bons
ajudam no êxito da atividade curadora. E isto foram os Espíritos da Codificação
que declararam a Allan Kardec.
A mesma orientação se percebe em
O Livro dos Médiuns, item 175, Capítulo XIV:
Diremos apenas que esse gênero de mediunidade consiste principalmente
no dom de curar por simples toque,
pelo olhar ou mesmo por um gesto, sem nenhuma medicação.
Novamente, se afirma o uso do
toque, agora especificamente pelo médium de cura. Como se pode perceber pela
afirmação de Kardec, o toque é uma das formas de manifestação da mediunidade
curadora.
Repito as palavras de Kardec
quanto à mediunidade de cura: “dom de curar por simples toque”.
Não se percebe na Codificação uma
vedação ao toque. O toque é reconhecido pelos Espíritos da Falange Espírito de Verdade
e por Allan Kardec como técnica a ser usada tanto na ação magnética quanto na
mediunidade de cura.
Transformar em dogma o que é mera
conveniência não parece uma atitude adequada de quem deseja professar uma fé
racional. Repetir um chavão, criar um dogma inexplicável é uma atitude
possível, mas não consentânea com o Espiritismo.
Realizadas
estas considerações sobre a técnica do toque, finalmente chego aonde
desejava. Como o mantra das imposições é bonito e cativante, eleva a alma e acalma
o espírito (se bem que perturba a inteligência), fui dedicar-me à comprovação
deste dogma de fé, pesquisando os próprios Evangelhos, os textos de Lucas, Mateus,
João e Marcos a fim de encontrar ali a justificação para a beleza simples das
imposições de mãos. Mas, Ó Supremo desgosto, eis que encontro um Jesus que não
impõe mãos, mas comete o sacrilégio de tocar nas pessoas.
E Jesus, estendendo a mão, tocou-o,
dizendo: Quero; sê limpo. E logo ficou purificado da lepra. (Mateus 8:3)
E ele, estendendo a mão, tocou-lhe,
dizendo: Quero, sê limpo. E logo a lepra desapareceu dele. (Lucas 5:13)
Então Jesus, movido de íntima compaixão, tocoulhes nos olhos, e logo viram; e eles o seguiram. (Mateus
20:34)
E Jesus, movido de grande compaixão, estendeu a mão, e tocou-o, e disse-lhe: Quero, sê limpo. (Marcos
1:41)
Tocou então os olhos deles, dizendo: Seja-vos feito segundo a vossa fé.
(Mateus 9:29)
E tocou-lhe na mão, e a febre a deixou; e levantouse, e
serviu-os. (Mateus 8:15)
E, tirando-o à parte, de entre a multidão, pôs-lhe os dedos nos ouvidos; e, cuspindo, tocou-lhe na língua. (Marcos 7:33)
E, chegando-se, tocou o esquife (e os que o levavam pararam),
e disse: Jovem, a ti te digo: Levanta-te. E o defunto assentou-se, e começou a
falar. (Lucas 7:14)
E, respondendo Jesus, disse: Deixai-os; basta. E, tocando-lhe
a orelha, o curou. (Lucas 22:51)
E, logo que o povo foi posto fora, entrou Jesus, e pegou-lhe
na mão, e a menina levantou-se. (Mateus 9:25)
As citações acima retirei do site
BibliaOnline, o qual oferece várias traduções da Bíblia (Almeida, católicas, luteranas,
etc.). Porém, fiz uma outra pesquisa, lendo os Evangelhos em edição da Editora
Ave Maria e as conclusões são as mesmas: na ampla maioria das curas realizadas,
os Evangelhos afirmam que Jesus tocava nas pessoas.
Embora o Movimento Espírita
brasileiro tenha uma forte natureza religiosa (a qual deve ser respeitada), mostra
que desconhece os próprios Evangelhos, pois apregoa aos quatro ventos que Jesus
permanecia parado à frente das pessoas com as mãos estendidas, quando em
verdade ele se aproximava, tocava a pessoa e com unção afirmava: Eu quero, fica
curado!
Graças a Deus, Jesus não tinha os
espíritas para lhe lembrar que tocar é proibido, se bem
que tinha os fariseus para lhe lembrar que não se devia curar aos
sábados. De qualquer forma, vê-se em que estado se encontra o conhecimento dos
espíritas acerca destes assuntos, ao ponto que já não se distingue mais a
opinião do conhecimento, o mito da realidade, o fato histórico e documentado da
criação ideológica.
Ainda pior, desta ideia falsa da
história criam-se regras absurdas sobre as imposições de mãos, inventam-se teorias
sobre a atuação do centro de força coronário, tudo em completo desacordo com as
leis naturais reveladas pelo Magnetismo e pelo Espiritismo.
Não há qualquer
fundamento real, nem mesmo doutrinário, para sustentar a ideia de que Jesus
apenas impunha as mãos e muito menos que também os espíritas devem se limitar a
fazer o mesmo.
Em fluidoterapia, em Magnetismo,
portanto, Kardec é um grande desconhecido e, por isto mesmo, os chavões e os
achismos pululam como sapos e coelhos, multiplicando- se ao infinito.
Infelizmente, os espíritas ainda
estão muito longe de perceber a riqueza e o imenso atrimônio científico que dispõe a Doutrina
Espírita e o Magnetismo no que diz respeito às curas. Presos a dogmas de fé, a
comodismos vários e inconfessados, a ideologias estranhas ao corpo doutrinário,
os trabalhos de fluidoterapia nas Casas Espíritas seguem à moda de fulano ou
beltrano, esquecendo-se de convidar para os trabalhos do passe o próprio Allan
Kardec.
É preciso que abandonemos as
conveniências irrefletidas que cada um carrega dentro de si sobre o Magnetismo.
Com reverência e modéstia, façamos um convite sincero e contrito para que nosso
mestre Allan Kardec, em carne, osso e espírito, habite em nossas mentes e nos
trabalhos de fluidoterapia.
Herculano Pires continuará sendo
um referencial digno de consulta perante os espíritas por um longo tempo. Porém,
quando tratou da origem dos passes é preciso considerar que o fez segundo suas
crenças pessoais, próprio modo de ver. É uma opinião equivocada, tanto do ponto
de vista doutrinário quanto histórico, mais uma neste imenso mar do Movimento
Espírita.□
JORNAL VORTICE ANO VI, Nº 05
- Outubro - 2013
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