Desobsessão é tratamento
oferecido pelas Casas espíritas aos que sofrem o assédio de Espíritos
inferiores, impingindo-lhes sofrimentos psíquicos, físicos e morais. Quando a
criatura fica por muito tempo jungida ao Espírito obsessor, cuja carga fluídica
é nociva não somente à organização psíquica, mas, também, à estrututa
físico-perispiritual, a interrupção do processo de forma apressada gera
sintomas desagradáveis no ex-obsidiado, assemelhando-se àqueles que acometem os
viciados em drogas, quando não as têm para consumir, vivenciando a crise ou
síndrome de abstinência: conjunto de modificações orgânicas que se dão, em
razão da suspensão brusca do consumo de droga geradora de dependências física e
psíquica. A crise apresenta sintomas como disforia, insônia, ansiedade,
irritabilidade, náusea, agitação, taquicardia e hipertensão.
Nós, os trabalhadores da
área mediúnica, nem sempre levamos em consideração esse fato. Mas o alerta da
Espiritualidade é antigo. A Revista Espírita, de junho de 1864, às páginas
241-242, (edição FEB), publicou uma reportagem intitulada “Relato Completo da
Cura da Jovem Obsedada de Marmande”. Dela destacamos fragmentos das informações
e orientações dadas pelo Espírito Pequena Cárita:
Meus bons amigos, bani todo
o medo; a obsessão está acabada e bem-acabada; uma ordem de coisas estranhas
para vós, mas que logo vos parecerão naturais, talvez seja a consequência desta
obsessão, mas não obra de Jules [o Espírito obsessor]. [...] Hoje, que
conheceis a doutrina, a obsessão ou a subjugação do ser material se vos
apresenta não como um fenômeno sobrenatural, mas simplesmente com um caráter
diferente das doenças orgânicas. O Espírito que subjuga penetra o perispírito
do ser sobre o qual quer agir. O perispírito do obsedado recebe como uma
espécie de envoltório, o corpo fluídico do Espírito estranho e, por esse meio,
é atingido em todo o seu ser; [...] Quando o Espírito abandona sua vítima, sua
vontade não age mais sobre o corpo, mas a impressão que recebeu o perispírito
pelo fluido estranho de que foi carregado, não se apaga de repente e continua
ainda por algum tempo a influir sobre o organismo. No caso de vossa jovem
doente: tristezas, lágrimas, langores, insônias, distúrbios vagos, tais são os
efeitos que poderão produzir-se em consequência dessa libertação; mas,
tranquilizai-vos, vós, a menina e sua família, pois essas consequências não
representarão perigo para ela. [...] Agora é preciso agir sobre o próprio
Espírito da menina, por uma doce e salutar influência moralizadora. [...].
(Destacamos.)
Como vemos, na fonte
primária do Espiritismo, já encontramos elucidações a respeito da “crise de
abstinência”. Essas informações são atualmente confirmadas pelas Entidades
espirituais responsáveis pela complementação do Espiritismo, codificado por
Allan Kardec. Confiramos.
Afastado do conúbio
permanente com Mariana [a obsidiada], graças à interferência dos Benfeitores
Espirituais, Guilherme [o obsessor] esteve todo o tempo em tratamento
especializado, de modo a refazer o campo mental, secularmente aba¬lado pelo
ódio infeliz e destruidor. Mariana, por sua vez, que já vivia aclimatada
psiquicamente às vibrações do seu perseguidor, sentiu-lhe a ausência desde o
momento em que Saturnino recolhera ao aconchego da prece aquele que se lhe
fizera verdugo inconsciente e pertinaz. No dia imediato à primeira incorporação
de Guilherme, a jovem, após retornar ao lar, deixara-se abater por forte
prostração [...] A jovem amanheceu, portanto, indisposta e perturbada. [...]
Ao entardecer, como Mariana continuasse em doloroso desconserto emocional,
[...] o irmão Saturnino, [...] interessado em acalmar a família aflita,
esclareceu, bondoso: − Mariana, conforme verificamos nos trabalhos espirituais
da noite passada, vinha sendo vítima de uma obsessão em grave desenvolvimento.
Vinculada pelo passado culposo ao atormentado companheiro que se lhe
transformou em adversário vingador, absorveu durante alguns anos as energias
deletérias em que se via envolvida, criando um condicionamento psíquico, que,
embora desgastando o seu organismo, lhe servia, também e simultaneamente, de
sustentação. Libertada da constrição perturbadora, conforme acompanhamos
durante os trabalhos desobsesivos, ressente-se e padece as consequências da
falta dos fluídos pesados...1 (Destacamos.)
O médico de Nosso Lar
enriquece o conhecimento, deixando claro que não devemos ter pressa em desatar
os laços obsessivos existentes entre a vítima e o algoz, considerando as
intrincadas energias fluídicas das quais se nutrem mutuamente.
Hilário e eu,
instintivamente, abeiramo-nos de Odila para afastá-la com a presteza possível,
mas o instrutor generoso deteve¬-nos com um gesto, advertindo: − A violência
não ajuda. As duas [obsessora e obsidiada] se encontram ligadas uma a outra.
Separá-las à força seria a dilaceração de consequências imprevisíveis. A
exasperação da mulher desencarnada pesaria demasiado sobre os centros cerebrais
de Zulmira e a lipotimia poderia acarretar a paralisia ou mesmo a morte do
corpo. [...] 2
No livro Loucura e obsessão,
temos um caso em que o afastamento do obsessor levou o ex-obsidiado a óbito! Em
uma reunião mediúnica, o esclarecedor solicita ao obsessor que ele deixe a sua
vítima e ouve a seguinte resposta:
Você pede-me que o liberte e
não tem ideia do que solicita. A palavra liberte terá um significado muito
profundo, quase terrível para você e para ele, para a família, caso eu concorde
com o apelo. Estamos tão intimamente ligados, quanto a planta parasita na
árvore que a hospeda. Com o tempo, as raízes da naturalmente enxertada
penetraram na seiva da outra, gerando tremenda simbiose. Ambos nos necessitamos
para viver. Embora eu aqui me encontre, estou vinculado a ele... Se eu
arrancar-me do seu convívio físico e mental, eu me desequilibrarei muito, e o
corpo dele morrerá... [...] Seu filho morrerá, então, infelizmente. Sem mim,
ele não sobreviverá. Escolha: tê-lo comigo, ou, sem mim, perdê-lo.
O pai do obsesso concordou
com a libertação, e o filho desencarnou pouco tempo depois, em razão da crise
de abstinência!
A irmã Emerenciana, que
acompanhou o caso ao lado de Bezerra de Menezes, pergunta ao Mentor se a
desencarnação de enfermo em razão do afastamento do obsessor era frequente, e
ele respondeu: − Muito mais constante do que se pode imaginar. A minha primeira
experiência, nessa área, ocorreu quando eu me encontrava na Terra. Compreendo a
dor dos pais de Alberto, porquanto minha esposa e eu a sofremos nos recônditos
da alma, quando um ser querido nosso e nós e seus familiares passamos por
idêntico transe. 3(Destacamos.)
Após os ensinamentos acima,
diante do irmão que necessita de tratamento desobsessivo, tenhamos pressa em
acolhê-lo com caridade, mas sem precipitação, lembrando que a sua cura depende
de muitos fatores que vão além da nossa boa vontade. Ministremos-lhe os passes,
as orientações evangélicas de vida cristã que a Doutrina Espírita nos oferece e
contemos com a sabedoria dos Mentores espirituais da instituição que melhor
conhecem cada caso.
Concluindo, não acreditamos
em método desobsessivo que não dê primazia ao diálogo com o encarnado e com o
desencarnado, ajudando-os para que se elevem moralmente pela evangelização e
conquistem a reforma íntima, pois não há obsessão sem consciência culpada, e
mente equivocada fazendo-se de justiceira. Observamos que, no plano espiritual,
as reuniões mediúnicas com intenção de desfazer a ligação nefasta entre
encarnado e desencarnado prima sempre pelo diálogo, buscando sempre a reforma
íntima dos envolvidos. Remetemos o prezado leitor ou leitora para o que acontece
no “Sanatório Esperança”, dirigido pelo nobre Espírito Eurípedes Barsanulfo,
quando atendeu ao irmão Ambrósio, internado naquele hospital. O objetivo era
libertá-lo do seu algoz. A certa altura, diz o Venerável Eurípedes Barsanulfo
ao estudioso da obsessão, Philomeno de Miranda:
Iremos tentar deslocar
algumas das mentes que prosseguem vergastando-o, atraindo os seus emissores de
pensamentos destrutivos a conveniente e breve diálogo, para, em ocasião
própria, torná-lo mais prolongado, mediante cuja terapia procuraremos liberá-lo
das camadas concêntricas de amargura e de culpa, de necessidade de punição e de
fuga de si mesmo, até o momento de despertamento do sono reparador, que lhe foi
imposto por força das circunstâncias. 4 (Destacamos.)
Feita a prece pelo apóstolo
de Sacramento, tudo sucedeu como nas reuniões mediúnicas aqui na Terra: uma das
senhoras presentes entrou em transe psicofônico, dando a sagrada oportunidade a
que o verdugo de Ambrósio dissesse das suas razões de obsediar Ambrósio. Em
seguida travou o diálogo, cujo resultado foi extremamente positivo.
(Destacamos.)
1. FRANCO, Divaldo Pereira.
Bastidores da obsessão. Pelo Espírito Manoel Philomeno de Miranda. 7. ed.
Salvador, BA: LEAL, cap.7, p. 133.
2. XAVIER, Francisco
Cândido. Entre a terra e o céu. Pelo Espírito André Luiz. 1. ed. especial, Rio
de Janeiro, RJ: FEB, 2003, cap. 3, p.21-22.
3. FRANCO, Divaldo Pereira.
Loucura e obsessão. Pelo Espírito Manoel Philomeno de Miranda. 3. ed. Salvador,
BA: LEAL, 1990, capítulos 19 e 20.
4. idem. Tormentos da
Obsessão. Pelo Espírito Manoel Philomeno de Miranda. 1. ed. Salvador, BA: LEAL,
2001, p. 159.
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