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quinta-feira, 20 de outubro de 2016

História da Era Apostólica - A lição do arado

 

“O ato de seguir a Jesus não é definido como a sensação de uma luz interior, ou a percepção de uma consciência intelectual, mas é comparado com a execução de uma tarefa criativa, consumidora e ativa, como a de colocar a mão no arado e dirigir uma junta de bois.”

HAROLDO DUTRA DIAS

Narra o Evangelho de Lucas a pitoresca história do impetuoso candidato a discípulo, cuja lealdade estava divida entre a obediência aos padrões culturais da sua época e o suave jugo do Cristo:

Disse também outro: Senhor, eu te seguirei, mas permita--me despedir-me dos que estão em minha casa.
Jesus, porém, lhe disse: Ninguém que põe sua mão no arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus. (Lucas, 9:61-62.)

Muitos intérpretes salientam que o “despedir-se” da família, no mundo oriental, implicava o pedido de permissão para partir. A autoridade dos genitores, sobretudo a do pai, era suprema, motivo pelo qual a pessoa que partia precisava pedir permissão a quem ficava.

Quando alguém iniciava um novo empreendimento, costumava visitar seu pai na aldeia a fim de lhe pedir a bênção e a permissão para o cometimento, ainda quando se tratasse de um homem independente.

No caso em exame, o candidato condicionava sua adesão ao Cristo à aprovação dos pais, ou seja, buscava conciliar a exigência social da sua época com a convocação espiritual do Mestre.

Em resposta à sua súplica, Jesus estabelece um programa árduo, mostrando que a tarefa de segui-lo exige concentração, dedicação e abnegação.
Arar a terra na Palestina do primeiro século envolvia um conjunto complexo de providências. Joaquim Jeremias salientou algumas delas:

[...] O arado palestino, muito leve, é guiado com uma só mão. Esta mão, geralmente a esquerda, precisa ao mesmo tempo conservar o arado na posição vertical, regular a sua profundidade mediante pressão, e levantá- lo por sobre pedras e rochas que estejam em seu caminho. O arador usa a outra mão para guiar o boi teimoso com um aguilhão com cerca de um metro de comprimento, provido de uma ponta de ferro. Ao mesmo tempo ele precisa ficar olhando continuamente entre as pernas traseiras do animal, para não perder o sulco de vista. Esta forma primitiva de arado requer destreza, atenção, e concentração. Se o arador olhar para os lados, um novo sulco é aberto fora da linha. Desta forma, quem quiser seguir a Jesus precisa estar resolvido a quebrar os laços com o passado, e fixar os olhos apenas no Reino vindouro de Deus [...].2

Não bastasse a dificuldade de manejo do arado, o processo de aragem do campo desdobrava--se em múltiplas atividades, tornando a tarefa muito mais exigente do que se imagina à primeira vista:

[...] A aração era cuidadosa e minuciosa; logo que se quebrava o restolho depois da colheita, abriam-se sulcos com margens largas entre eles, para facilitar a absorção das chuvas. Ao arar, depois das primeiras chuvas, sulcos mais próximos, divididos por canteiros, eram abertos para propiciar a drenagem; só na terceira aração, antes da semeadura, os sulcos eram feitos consecutivamente, sem canteiros entre eles. O trabalho final era o de cobrir a semente... esse implemento era maior e mais pesado do que o moderno arado árabe, que em geral se parece com ele [...].3

Kenneth Bailey, após ter vivido 47 anos em comunidades agrícolas do Oriente Médio, pesquisando os aspectos culturais e literários que estão por trás dos textos do Novo Testamento, afirma:

[...] É claro que a aração era uma operação muito exata, iniciando-se com a abertura de estrias para a absorção da água. Em um estágio posterior, os sulcos eram feitos de forma a permitir a drenagem. Uma terceira aração preparava o solo, e uma quarta cobria a semente depois do plantio. Obviamente qualquer pessoa que desejasse desincumbir-se de uma responsabilidade destas precisava dar atenção irrestrita ao que estava fazendo [...].4

Refletindo acerca da lição do arado, é forçoso concluir que o arador distraído poderá bater com o arado em uma rocha, quebrar sua ponta de madeira, cansar inutilmente a parelha de animais, cortar, sem rumo, o campo não arado, ou destruir o trabalho já realizado. Em suma, o arador deve equilibrar o serviço feito, o que está por fazer, e aquele que está sendo realizado, já que qualquer distração tornará sua ação não apenas improdutiva, mas também destruidora.
No tocante ao símbolo do arado, é valioso o ensino de Emmanuel:

O arado é aparelho de todos os tempos. É pesado, demanda esforço de colaboração entre o homem e a máquina, provoca suor e cuidado e, sobretudo, fere a terra para que produza. Constrói o berço das sementeiras e, à sua passagem, o terreno cede para que a chuva, o Sol e os adubos sejam convenientemente aproveitados.

É necessário, pois, que o discípulo sincero tome lições com o Divino Cultivador, abraçando-se ao arado da responsabilidade, na luta edificante, sem dele retirar as mãos, de modo a evitar prejuízos graves à “terra de si mesmo”.
....................................................
Um arado promete serviço, disciplina, aflição e cansaço; no entanto, não se deve esquecer que, depois dele, chegam semeaduras e colheitas, pães no prato e celeiros guarnecidos.5

O servidor do Cristo conhece o cansaço, jamais o desânimo. Conhece o peso e a rotina do arado, mas aprende no trabalho de cada dia que a disciplina não é um cárcere, é a chave da porta, como dizia Chico Xavier.

Fonte: Reformador  Ano 126 • Nº 2. 157 • Dezembro 2008

1BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983. Cap. 2, p. 32.
2JEREMIAS, Joaquim. As parábolas de Jesus. 9. ed. São Paulo: Editora Paulus, 2004. Parte III, cap. VI, p. 196.
3APPELEBAUM. The jewish people in the first century, apud BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Combined  Edition. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983. Cap. 2, p. 30.
4BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Combined Edition. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983. Cap. 2, p. 30.

5XAVIER, Francisco Cândido. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 3.

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O Novo Testamento - Redação

domingo, 16 de outubro de 2016

História da Era Apostólica - Nascimento de Jesus

Os Quatro Evangelistas, quadro de Jacob Jordens
HAROLDO DUTRA DIAS

 “Para quem está familiarizado com a história antiga, não deve ser motivo deperturbação o fato de que as  principais datas na vida de Jesus sejam apenas aproximadas. [...] Na verdade, as datas de nascimento até mesmo de alguns imperadores romanos não são certas [...].”

No prólogo deste artigo há uma citação do historiador John P.Meier, professor na Universidade Católica de Washington D. C., considerado um dos mais eminentes pesquisadores bíblicos de sua geração. Ao stabelecer os limites da ciência e da 
investigação humanas, ele adverte:“Por Jesus da história, refiro-me ao Jesus que podemos ‘resgatar’ e examinar utilizando os instrumentos científicos da moderna pesquisa histórica”.2

A pesquisa histórica baseia-se em fontes (documentos, registros, inscrições, ossuários, obras de historiadores, achados arqueológicos) e adota métodos específicos, adequados ao tipo de fonte analisada, com vistas à interpretação consistente dos dados coletados.

Por vezes, seja em razão da escassez dessas fontes, seja em decorrência da ausência de parâmetros na interpretação dos dados colhidos, somos obrigados a reconhecer a limitação dos “instrumentos científicos da moderna pesquisa histórica”.

Nesse ponto, consideramos preciosa a contribuição dada pela Doutrina Espírita no equacionamento de graves questões. No caso da cronologia da vida de Jesus, é lícito concluir que a obra psicográfica de Francisco Cândido Xavier supre inúmeras lacunas, impossíveis de serem transpostas sem o auxílio da revelação espiritual, tendo em vista as limitações da historiografia.

Os dados cronológicos mais importantes da vida de Jesus encontram-se nas narrativas da infância (Mateus, 2; Lucas, 1:5, 2:1-40) e nas narrativas da paixão (Mateus, 26-27; Marcos, 14-15; Lucas, 21- -23; João, 13-19). Outros dados relevantes podem ser encontrados nos evangelhos de Lucas e João (Lc., 3:1-2 e 23; Jo., 2:20).

Os historiadores do Cristianismo, porém, chamam a atenção para o fato de que os Evangelhos não são essencialmente obras de história, no sentido atual da palavra. Os Evangelistas não pretendiam produzir uma biografia completa ou mesmo um sumário da vida de Jesus. Ao contrário, escreveram com a finalidade de transmitir o ensino do Mestre, os fatos principais da sua vida, de modo a legar à posteridade o testemunho da fé.

Nesse sentido, é justo considerar que os Evangelistas organizaram o material da tradição (oral e/ou escrita) de acordo com um propósito redacional. Compilaram e organizaram as narrativas sem se preocuparem com a ordem histórica dos acontecimentos. É o que nos demonstra o pesquisador norte-americano:

[...] Tais compilações ainda são visíveis em Marcos: por exemplo, as passagens polêmicas localizadas no início do ministério de Jesus na Galiléia (2:1; 3:6), em contraposição a outra série de passagens semelhantes já em Jerusalém, ao final do ministério (11:27; 12:34); uma seção central de relatos de milagres e palavras de Jesus, agrupados pela palavra- chave “pão” (6:6; 8:21) e uma coletânea de parábolas (4:1; 34). Não há motivo para considerarmos essas compilações como tendo preservado a inviolável ordem cronológica dos eventos, especialmente porque Mateus e Lucas não o fizeram.Mateus, por exemplo, reordena livremente os relatos de milagres que aparecem em Marcos, para criar um grupo conciso de nove relatos divididos em três grupos intercalados por material de “enchimento” (Mateus, 8-9). O grande Sermão da Montanha, em Mateus, reaparece, em parte, em Lucas como o Sermão da Planície, menor que o outro (ambos como tendo ocorrido na Galiléia) e, parcialmente, em material espalhado por todo o longo relato da jornada final de Jesus até Jerusalém, em Lucas, 9:51; 19:27 [...]”.3 

A Adoração dos Pastores, quadro de Giorgione

Por outro lado, seria temerário acusar os Evangelistas de terem distorcido os fatos para adequá-los a propósitos teológicos. Nesse caso, vale lembrar que escreveram para contemporâneos, muitos deles testemunhas oculares dos fatos narrados, razão pela qual não se justifica o ceticismo exagerado com relação aos dados contidos nos Evangelhos. Deve ser encontrada uma posição de equilíbrio que prime pela fé raciocinada.

Assim, considerando o relato dos Evangelistas, pode-se afirmar que Jesus nasceu no tempo do imperador Augusto (37 a.C.-14 d. C.), antes da morte de Herodes, o Grande.

No ano 525 d.C., o papa João I 470-526 d.C.) pediu a Dionísio4 que elaborasse um calendário com o cálculo dos ciclos pascais, as datas futuras da Páscoa. Frei Dionísio, além de elaborar uma efeméride pascal, estabeleceu um novo calendário, em oposição ao sistema alexandrino, da era diocleciana, fixando a data do nascimento de Jesus em 25 de dezembro de 753 A.U.C.,5 declarando 1o de janeiro de 754 A.U.C. como o início do primeiro ano da Era Cristã, o “Anno Domini” (Ano do Senhor).

Posteriormente, descobriu-se que a data estabelecida por Dionísio estava absolutamente equivocada, visto que fixava o nascimento de Jesus três anos após a morte de Herodes, o Grande.

Para se encontrar a data da morte de Herodes, utilizou-se preciosa informação fornecida pelo historiador judeu Flávio Josefo (Antiguidades Judaicas, livro XVII, cap. 6, § 4, item 167), segundo o qual teria ocorrido um eclipse lunar pouco antes do falecimento daquele monarca. Com base em cálculos astronômicos precisos, é possível afirmar que a morte daquele rei se deu por volta de março/abril do ano 750 A.U.C. (4 a.C.), logo após o referido eclipse.

Desse modo, concluem os exegetas que Jesus, seguramente, nasceu antes do ano 4 a.C. (data da morte de Herodes, o Grande). Todavia, esses pesquisadores são unânimes em reconhecer a impossibilidade de se determinar o ano exato do nascimento de Jesus, com base nas fontes históricas atualmente disponíveis.

Os “instrumentos científicos da moderna pesquisa histórica” nos permitem  chegar somente até esse ponto.

É nesse momento que a revelação espiritual pode e deve ser conjugada com as pesquisas humanas, no intuito de resolver questões intricadas, mas extremamente relevantes para o estudo do Cristianismo Nascente.

Nesse sentido, merece ser transcrito o extraordinário texto do Espírito Humberto de Campos, revelando a data do nascimento do Cristo:

[...] o Senhor chamou o Discípulo Bem-Amado ao seu trono de jasmins matizado de estrelas. O vidente de Patmos não trazia o estigma da decrepitude, como nos seus últimos dias entre os espórades. Na sua fisionomia pairava aquela mesma candura adolescente que o caracterizava no princípio do apostolado.

– João – disse-lhe o Mestre –, lembras-te do meu aparecimento na Terra?

– Recordo-me, Senhor. Foi no ano 749 da era romana, apesar da arbitrariedade de Frei Dionísio, que, calculando no século VI da era cristã, colocou erradamente o vosso natalício em 754. – 

Não, meu João – retornou docemente o Senhor –, não é a questão cronológica que me interessa, ao te argüir sobre o passado. É que nessas suaves comemorações vem até mim o doce murmúrio das lembranças!...

– Ah! sim, Mestre Amado – retrucou pressuroso o Discípulo –, compreendo- vos. Falais da significação moral do acontecimento. Oh!... se me lembro... a manjedoura, a estrela guiando os poderosos ao estábulo humilde, os cânticos harmoniosos dos pastores, a alegria ressoante dos inocentes, afigurando-se-nos que os animais vos compreendiam mais que os homens, aos quais ofertáveis a lição da humildade, com o tesouro da fé e da esperança. [...] 6 (Grifo nosso.)

Assim, consoante a revelação espiritual, pelas mãos do respeitável médium Francisco Cândido Xavier, Jesus nasceu no ano 749 da era romana. Considerando que o primeiro ano do calendário gregoriano (Anno Domini – Ano 1), atualmente em vigor no mundo ocidental, corresponde ao ano 754 U.A.C. (ano da fundação de Roma), e tendo em vista que não há ano zero, nesse calendário, basta considerar a seqüência 753 U.A.C. = 1 a.C.; 752 U.A.C. = 2 a.C.; 751 U.A.C. = 3 a.C.; 750 U.A.C. = 4 a.C. e 749 U.A.C. = 5 a.C.

Desse modo, pode-se concluir que o nascimento do Mestre se deu no ano 5 a.C.
.
Fonte: Reformador Ano 126 Nº 2. 151 • Junho 2008


1MEIER, John P. Um judeu marginal: repensando o Jesus histórico. 3. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1993. p. 367.

2Idem, ibidem. p. 35
3MEIER, John P. Um judeu marginal: repensando o Jesus histórico. 3. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1993. p. 50-51.
4Dionysius Exiguus (470-540 d.C.) nasceu na Scythia Menor (Romênia/Bulgária), transferindo-se para Roma por volta do ano 500 d.C., onde se tornou tradutor de inúmeras obras da Igreja Romana, importantes para o direito canônico, além de ter elaborado a tabela com as datas da Páscoa. Todavia, seu nome entrou para a história por ser o criador do “Anno Domini”, alterando o calendário da época.
5A.U.C. (Anno Urbis Conditae) – Ano da fundação da cidade de Roma. Os historiadores fixam a data da fundação daquela cidade no ano 753 a.C., acolhendo os informes do historiador romano “Varrão”. É comum confundir-se a sigla A.U.C. com Ab Urbe Condita, título do livro de Tito Lívio sobre a história de Roma.
6XAVIER, Francisco Cândido. Crônicas de além-túmulo. Pelo Espírito Humberto de Campos. 15. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 15, p. 89-90. A Adoração dos Pastores, quadro de Giorgione

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sexta-feira, 14 de outubro de 2016

História da Era Apostólica - O candidato a discípulo


HAROLDO DUTRA DIAS

“[...] O Compositor compõe uma música, e a obra está terminada. O Escultor  cinzela o seu mármore, e um dia a estátua está acabada. Mas a tarefa do exegeta nunca tem fim. Ele pode parar, apenas, para registrar, um tanto timidamente, as suas descobertas em certo ponto do tempo, orando para que elas tenham alguma utilidade para outras pessoas, e para que ele tenha sido fiel ao que lhe foi dado, até então. [...].”1

Na visão profética de Jeremias, Deus compara sua palavra com “um martelo que despedaça a rocha” (Jr., 23:29). E o Talmud comenta: “Tal qual a rocha que se parte em muitos fragmentos sob o golpe do martelo, assim cada palavra do Santíssimo, bendito seja, foi dividida em setenta expressões” (B. Shabat, 83b) – uma multiplicidade  de significados e interpretações. Por esta razão, diz o Midrash que “a Torah2 tem setenta faces” (Midrash Rabá, Números, 13:15).

Advertidos da complexidade  que envolve a atividade do intérprete das Escrituras, podemos examinar a bela passagem do Evangelho de Lucas, na qual o candidato a discípulo pede a Jesus a concessão de tempo, antes de aceitar o convite para segui-lo; eis o texto:

E disse a outro: Segue-me.Mas, ele disse: Permite-me ir primeiro enterrar meu pai. Mas, ele respondeu: Deixa que os mortos enterrem seus mortos; tu, porém, vai e proclama o Reino de Deus. (Lucas, 9:59-60.)

Muitos intérpretes acreditam que o pai acabara de morrer ou estava prestes a expirar.Nesse caso, o candidato a discípulo pedia singela permissão para oferecer ao cadáver do genitor a bênção da sepultura.

O sepultamento dos pais era considerado um dever religioso dos judeus, uma espécie de desdobramento do mandamento “honrar pai e mãe”. (Gênesis, 50:5; Êxodo, 20:12;Deuteronômio, 5:16; Tobias, 4:3-4.) Desse dever estavam isentos somente o sumo sacerdote e aqueles que fizeram o voto de nazireu (Levítico, 21:10-11; Números, 6:6-7).

Não ser sepultado era uma maldição, uma vergonha (Deuteronômio, 28:26; Salmos, 79:2), razão pela qual o dever do sepultamento tinha primazia sobre o estudo da
Lei, o serviço do Templo, o sacrifício da Páscoa, a observância da circuncisão, a recitação do Shemá e a leitura da Megillah (B. Berakhot 3a; B. Megillah 3b). Até os sacerdotes, que deveriam evitar a contaminação do contato com cadáveres, tinham permissão para sepultar seus pais (Levítico, 21:2-3).

A questão, posta nestes termos,  oferece enormes dificuldades ao exegeta. Joaquim Jeremias salientou algumas delas:

[...] Ao chamar para o círculo dos discípulos que o acompanhavam, Jesus imprimiu um tom de urgência ao seu apelo. A Eliseu foi permitido despedir-se da sua família (1Rs., 19:20), mas Jesus não concede essa licença (Lc., 9:61), e até mesmo rejeita o pedido de um filho que roga se lhe permita cumprir o mais elementar dever de um filho, a saber, o de sepultar o seu pai. O sepultamento se fazia na Palestina no próprio dia da morte e em seguida faziam-se dois dias de luto, quando a família enlutada recebia as expressões de condolência. Jesus não pode conceder essa prorrogação. Por que tanta urgência? [...].3

Observando essa primeira “face” da interpretação do texto, concluímos que a exigência de Jesus é superior à de Elias, que permitiu a Eliseu despedir-se de seus pais (1Reis, 19:19-21), mas iguala-se à exigência de Deus, que não permitiu ao profeta Ezequiel fazer luto por sua mulher (Ez., 24:15-24).

Jesus redefine o núcleo familiar sobre as bases da obediência à vontade de Deus, e não sobre os laços sangüíneos (Mateus, 12:46-50), advertindo que o discipulado é duro, e exige um compromisso absoluto e permanente.
Allan Kardec resume magistralmente essa idéia:

Sem discutir as palavras, deve-se aqui procurar o pensamento, que era, evidentemente, este:“Os interesses da vida futura prevalecem sobre todos os interesses e todas as considerações humanas”, porque esse pensamento está de acordo com a substância da doutrina de Jesus, ao passo que a ideia de uma renunciação à família seria a negação dessa doutrina.4

Os comentaristas orientais, por sua vez, considerando os aspectos culturais do texto, fazem observações interessantes. Ibn al-Salibi comenta:

Deixa-me ir sepultar significa: deixa-me ir e servir meu pai enquanto ele é vivo; depois que ele morrer, eu o sepultarei e virei.5

A mesma idéia é apresentada pelo comentarista árabe Sa’id:

[...] O segundo (discípulo) está olhando para um futuro longínquo, pois adia sua decisão de seguir Jesus para um tempo posterior à morte do seu pai [...]. Se o seu pai tivesse realmente morrido, por que naquele exato momento ele não estava velando o corpo dele? Na verdade, ele pretende adiar o assunto de seguir Jesus para um futuro distante, quando o seu pai, velho,morresse.Mal sabe ele que Jesus, dentro de muito pouco tempo entregará o seu espírito. [...].6

Kenneth Bailey, após ter vivido 47 anos em comunidades agrícolas do Oriente Médio, pesquisando os aspectos culturais e literários que estão por trás dos textos do Novo Testamento, afirma:

[...] A frase “enterrar o pai” é expressão idiomática tradicional que se refere especificamente aos deveres do filho de ficar em casa e cuidar de seus pais até que eles jazam em paz, para descansar com todo o respeito. Este escritor ouviu exatamente esta expressão sendo usada repetidamente entre os habitantes do Oriente Médio discutindo a emigração. Em certo ponto da conversa alguém pergunta: “Você não vai sepultar primeiro a seu pai?”. A pessoa que interroga geralmente está se dirigindo ao futuro emigrante, que tem cerca de trinta anos de idade. Geralmente, o pai em discussão ainda deve ter cerca de vinte anos para viver. A ideia é: “Você não vai ficar até cumprir o dever tradicional de tomar conta de seus pais até a sua morte, e depois pensar em emigrar?”. Outros coloquialismos expressam a mesma idéia cultural. Na língua síria coloquial de aldeias isoladas da Síria e do Iraque, quando um filho rebelde procura reafirmar a sua independência em relação ao seu pai, a repreensão final e contundente do pai é: kabit di gurtly (“Você quer me enterrar”). A ideia é: “Você quer que eu me apresse a morrer para que a minha autoridade sobre você termine, e você fique por sua própria conta” [...]. Aqui estamos tratando de expectativas da comunidade, que podem ser mal traduzidas em termos ocidentais [...]. O recruta à margem da estrada está dizendo: “A minha comunidade me faz certas exigências, e a força dessas exigências é muito grande. Certamente, o senhor não espera que eu frustre as expectativas da minha comunidade, não é?”. Não obstante, é exatamente isto que Jesus requer [...].7

Observando essa segunda “face” da interpretação do texto, concluímos que o candidato a discípulo pedia muito mais tempo do que o necessário para o sepultamento.Na verdade adiava o compromisso por tempo indeterminado.No entanto, a resposta de Jesus engloba as duas situações expostas na primeira “face” e na segunda “face” da interpretação. O sentido de prioridade, urgência e devotamento exigidos pelo chamamento do Cristo permanece intacto nas duas abordagens.

Allan Kardec, ao comentar os versículos em estudo (Lucas, 9:59--60), asseverou:

A vida espiritual é, com efeito, a verdadeira vida, é a vida normal do Espírito, sendo-lhe transitória e passageira a existência terrestre, espécie de morte, se comparada ao esplendor e à atividade da outra. O corpo não passa de simples vestimenta grosseira que temporariamente cobre o Espírito, verdadeiro grilhão que o prende à gleba terrena, do qual se sente ele feliz em libertar-se. [...] Era isso o que aquele homem não podia por si mesmo compreender. Jesus lho ensina, dizendo: Não te preocupes com o corpo, pensa antes no Espírito; vai ensinar o reino de Deus; vai dizer aos homens que a pátria deles não é a Terra, mas o céu, porquanto somente lá transcorre a verdadeira vida.8 (Grifo nosso.)

No tocante ao ensino “deixa que os mortos enterrem seus mortos”, é valiosa a lição de Emmanuel:

O cadáver é carne sem vida, enquanto que um morto é alguém que se ausenta da vida. Há muita gente que perambula nas sombras da morte sem morrer.
Trânsfugas da evolução, cerram-se entre as paredes da própria mente, cristalizados no egoísmo  ou na vaidade, negando-se a partilhar a experiência comum. Mergulham-se em sepulcros de ouro, de vício, de amargura e ilusão.  [...].9

Espiritualmente falando, apenas conhecemos um gênero temível de morte – a da consciência denegrida no mal, torturada de remorso ou paralítica nos despenhadeiros que marginam a estrada da insensatez e do crime. É chegada a época de reconhecermos que todos somos vivos na Criação Eterna.10

Urge atender ao chamado do Cristo no tempo intitulado “hoje”.

Fonte: Reformador  Ano 126 • Nº 2. 155 • Outubro 2008

1BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983. Preface, p. 7.
2Torah, em sentido amplo, significa a “revelação divina”. Em sentido estrito, significa o pentateuco mosaico, ou seja, os cinco primeiros livros da Bíblia hebraica.
3JEREMIAS, Joaquim. Teologia do novo testamento. São Paulo: Editora Hagnos, 2008. Cap. IV, p. 208.
4KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. XXIII, item Abandonar pai, mãe e filhos.
5IBN AL-SALIB, apud BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Combined Edition. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983. Chapter 2, p. 26.
6SA'ID, apud BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Combined Edition. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983. Chapter 2, p. 26.
7BAILEY, Kenneth E. Through peasant eyes. Combined Edition. Michigan: Eerdmans Publishing Company, 1983.Chapter 2, p. 26. 8KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. XXIII, item 8.
9XAVIER, Francisco Cândido. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. 1a reimpressão. Rio de Janeiro: FEB, 2008.Cap. 143.
10______. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 42.

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O Novo Testamento - Redação

quinta-feira, 23 de junho de 2016

História da Era Apostólica - Novas perguntas


“A diversidade de imagens de Jesus levanta a suspeita de que os retratos de Jesus sejam na verdade auto-retratos de seus autores.”1

HAROLDO DUTRA DIAS

O reinado de Guilherme II (1859-1941) assistiu, na Alemanha, ao florescimento do liberalismo teológico e da pesquisa “clássica” sobre a história do Cristianismo, cuja característica marcante foi a exploração histórico-crítica das fontes literárias, visando a reconstrução da personalidade e da vida de Jesus, ao menos na concepção dos seus expositores mais destacados.

Inaugurava-se a Terceira Fase da pesquisa histórica do Cristianismo sob a influência de desmedido otimismo. F. Baur defendia a primazia dos sinóticos sobre o Evangelho de João. H. Holzmann propunha a teoria das duas fontes,
segundo a qual Marcos e “Q”2 representavam as mais antigas e confiáveis fontes para a reconstrução do quadro biográfico do Cristo.

O colapso do liberalismo teológico, porém, veio mais cedo do que se imaginava, em virtude de três fatores: a constatação do caráter fragmentário dos evangelhos, que impediria qualquer esforço de extrair um “desenvolvimento” da personalidade de Jesus a partir da seqüência narrativa do evangelho de Marcos; o caráter tendencioso das fontes antigas, visto que o evangelista privilegiava determinada mensagem, ainda que em detrimento de uma suposta “precisão histórica”; o elemento projetivo das biografias sobre Jesus, uma vez que os biógrafos retratavam a personalidade do Mestre ao sabor das suas preferências e conveniências pessoais.

O ocaso da Teologia Liberal contribuiu para o surgimento da chamada “Teologia Dialética”, herdeira da filosofia existencialista de Heidegger, segundo a qual “o ser humano conquista sua ‘autenticidade’ apenas na decisão, a qual não pode ser assegurada mediante argumentos objetiváveis (como o conhecimento histórico).
Para um existencialismo cristão a decisão é a resposta ao chamado de Deus no querigma3 da cruz e da ressurreição de Cristo, que  o ser humano compreende por meio de um morrer e viver existencial em Cristo”.4

O trabalho de R. Bultmann (1884-1976), o mais destacado exegeta da Teologia Dialética, reflete o ceticismo histórico que tomou conta dos pesquisadores, após o colapso da pesquisa tradicional. Na sua concepção, o Cristianismo começa apenas com a Páscoa, razão pela qual conclui que o ensino de Jesus não é relevante para uma Teologia Cristã. Nessa abordagem, o Jesus histórico não é objeto nem fundamento da pregação neotestamentária, que se baseia exclusivamente no “Cristo” percebido e divulgado após o Pentecostes (Cristo Querigmático).5

A Quarta Fase da pesquisa, desenvolvida no círculo dos discípulos de Bultmann, propõe uma “nova pergunta” pelo Jesus histórico, buscando o elo entre a pregação
pós-pascal dos apóstolos e a pregação do próprio Jesus. Enquanto a “antiga pergunta” (Teologia Liberal) contrapunha Jesus à pregação da Igreja, a “nova pergunta” procura harmonizar esses dois elementos.

No lugar da reconstrução crítico-literária das fontes, a metodologia da Teologia Dialética se concentra na comparação entre a história das religiões e a história da tradição evangélica.Nesse contexto, assume papel relevante o intitulado “critério da diferença”, segundo o qual, para se reconstruir um mínimo de tradição autêntica sobre Jesus, torna-se necessário excluir tudo que possa ser derivado tanto do Judaísmo quanto da pregação apostólica, nabusca da voz “original” do Cristo.

Na opinião dos estudiosos do tema:

[...] com o fim da escola bultmaniana ficaram cada vez mais evidentes as arbitrariedades da “nova pergunta” pelo Jesus histórico. Ela era basicamente determinada pelo interesse teológico de fundamentar a identidade cristã ao distingui-la do judaísmo e de garanti-la ao separá-la de heresias cristãs primitivas (como a gnose e o entusiasmo carismático).Por isso ela deu preferência a fontes ortodoxas e canônicas.6

Assim, o esforço para minimizar os contornos judaicos da mensagem cristã constitui o aspecto problemático dessa abordagem, já que favoreceu o anti-semitismo, desfigurando o pano de fundo histórico dos evangelhos para torná-lo mais palatável aos existencialistas.

A Quinta Fase da pesquisa, também conhecida como terceira busca (Third Quest), que se desenvolveu, sobretudo, nos países de fala inglesa, procura superar essas
idiossincrasias. Nela, o interesse histórico-social substitui o interesse teológico, ao passo que a inserção de Jesus no Judaísmo substituiu o interesse de separá-lo das
suas bases históricas e sociais. Há, também, maior abertura a fontes não-canônicas (em parte heréticas), tais como os apócrifos.

Em suma, munidos dos novos instrumentos da pesquisa hodierna, tais como história antiga, crítica literária, crítica textual, filologia, papirologia, arqueologia, geografia, religião comparada, os atuais pesquisadores tentam reconstruir o ambiente sociocultural de Jesus, de modo a experimentar o efeito que as palavras do Mestre produziram nos ouvintes da sua época.

Nesse esforço, procura-se evitar juízos preconcebidos, premissas rígidas, preconceitos étnicos, deixando que a mensagem se estabeleça ainda que contrariamente às expectativas dos crentes atuais.
No entanto, ao montar o quebra-cabeça da história do Cristianismo Primitivo com as escassas peças disponíveis, nem sempre é possível ao pesquisador humano dispensar certa dose de imaginação.

Na avaliação de Gerd Theisen:

[...] todas as descrições de Jesus contêm um elemento construtivo que vai além dos dados contidos nas fontes. A imaginação histórica cria com suas hipóteses uma “aura de ficcionalidade” em torno da figura de Jesus, assim como a imaginação religiosa do Cristianismo primitivo. Pois tanto aqui como lá atua uma grande força imaginativa, acesa pela mesma figura histórica. Em ambos os casos, ela opera de forma aberta: símbolos religiosos, imagens e mitos permitem sempre nova interpretação, hipóteses históricas permitem sempre nova correção.Neste processo, nem a construção religiosa, nem a reconstrução histórica da história de Jesus procede com arbitrariedade, mas com base em convicções axiomáticas. A imaginação religiosa do cristianismo primitivo é conduzida pela sólida crença de que por meio de Jesus é possível fazer contato com Deus, a realidade última. A imaginação histórica é determinada pelas convicções básicas da consciência histórica: todas as fontes se originam de seres humanos falíveis e devem, portanto, ser submetidas à crítica histórica.7

O espírita-cristão, abençoado pela revelação dos Espíritos superiores, especialmente na produção mediúnica de Francisco Cândido Xavier, conta com um elemento precioso, muitas vezes negligenciado. Os romances do Benfeitor Emmanuel constituem detalhado processo de reconstrução dos três primeiros séculos do Cristianismo.

Nesses romances, alguns dados da pesquisa histórica puramente humana são confirmados, todavia, muitas retificações são feitas, de forma sutil. Exige-se do leitor exame cuidadoso, sob pena de serem divulgadas informações espiritualmente incorretas, apenas porque determinado pesquisador encarnado as defenda em suas obras.

Nesse sentido, é valiosa a advertência de Emmanuel:

[...] Hipóteses incontáveis foram aventadas, mas os sábios materialistas, no estudo das idéias religiosas, não puderam sentir que a intuição está acima da razão e, ainda uma vez, falharam, em sua maioria, na exposição dos princípios e na apresentação das grandes figuras do Cristianismo.

[...] É que, portas a dentro do coração, só a essência deve prevalecer para as almas e, em se tratando das conquistas sublimadas da fé, a intuição tem de marchar à frente da razão, preludiando generosos e definitivos conhecimentos.8

Vê-se que a proposta da Espiritualidade superior reside na conjugação da Razão e da Fé, razão pela qual, antes de iniciarmos nosso estudo da “História Apostólica”, à
luz da obra Paulo e Estêvão, decidimos fazer um histórico da pesquisa acadêmica, a fim de evitar, ou pelo menos conhecer, as extravagâncias e equívocos de seus expositores.

Referência:

1THEISEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico. São Paulo: Loyola, 2002. p. 31.
2Termo alemão que significa “fonte”. Schleiermacher foi o primeiro a propor a existência de uma coletânea de declarações de Jesus como uma das fontes dos evangelhos. Alguns críticos acreditam que Papias faz referência a esse documento quando
3No grego, essa palavra (querigma) significa “a coisa pregada”, a pregação dos primeiros cristãos, ou melhor, o conjunto de crenças básicas por eles defendidas e
divulgadas.  menciona a existência das “Logias” de Levi. Todavia, cumpre salientar que não há comprovação histórica da existência do referido documento. O trabalho dos estudiosos tem sido selecionar ditos de Jesus, nos evangelhos de Mateus e Lucas, ausentes no evangelho de Marcos, propondo que essa seleção aponte para a suposta fonte “Q”. Em resumo, estamos diante de uma hipótese que deve ser analisada com cautela.
4THEISEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico. São Paulo: Loyola, 2002. p. 31.
5O Cristo retratado na pregação dos apóstolos e dos primeiros cristãos do Século I.
6THEISEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico. São Paulo: Loyola, 2002. p. 28.
7THEISEN, Gerd; MERZ,Annette. O Jesus histórico. São Paulo: Loyola, 2002. p. 31.
8XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed.
Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. XIV, item “A redação dos textos definitivos”, p. 124-125.

Fonte: Reformador Ano 126 • Nº 2. 146 • Janeiro  2008


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