Aécio Pereira Chagas
Temos observado na
literatura espírita (livros, revistas, jornais) que constantemente surgem
afirmações do tipo "a Ciência moderna confirma o Espiritismo",
seguida de citações, a nosso ver, muito duvidosas a respeito de questões
científicas. Muitas vezes percebemos no autor uma seriedade de propósitos,
porém suas citações nem sempre se apóiam bem no que poderíamos chamar de um
"conhecimento científico estabelecido". São citadas obras de
divulgação científica que nem sempre primam pelo rigor e, o que é pior, são às
vezes escritas com uma "segunda intenção". Perguntará então o leitor:
"O que há de errado nos textos de divulgação científica? Será que a
Ciência moderna não confirma o Espiritismo?" Neste artigo vamos tecer
inicialmente algumas considerações sobre materialismo, espiritualismo, a
Ciência e sua divulgação, sobre outros temas decorrentes e, finalmente,
tentaremos responder a estas duas questões.
1. Materialismo e
espiritualismo
Muitos compêndios de
Filosofia ensinam que as escolas filosóficas, as visões de mundo, as
ideologias, etc., podem se alinhar em dois grandes grupos: o grupo
materialista, para os quais tudo é matéria, senso o pensamento uma qualidade da
matéria, e o grupo espiritualista ou idealista, para os quais o espírito existe
como uma realidade independente da matéria (vide, por exemplo, Dicionário de
Filosofia, Durozoi e Roussel, Papirus, 1993). "(…) Com efeito, o
espiritualismo é o oposto do materialismo. Quem quer que acredite haver em si
alguma coisa mais do que matéria, é espiritualista (…)" (Allan Kardec, O
Livro dos Espíritos, Introdução, 75a edição, FEB, pág. 13). As filosofias, as
ideologias, dentro de cada um dos dois grupos, estão longe de concordarem entre
si em muitos outros pontos, a não ser neste único aspecto de aceitar ou não a
existência do espírito. O Espiritismo evidentemente está no segundo grupo e,
como já bem apontou Deolindo Amorim (O Espiritismo e as doutrinas
espiritualistas, 3a ed., Livraria Ghignone Editora, 1979), o fato de uma
doutrina ser espiritualista não significa que está de acordo com o
Espiritualismo, a não ser na crença do espírito como algo diferente da matéria.
Conforme já tivemos
oportunidade de expressar no artigo "O Espiritismo na Academia?"
(Revista Internacional de Espiritismo, fevereiro 1994, pp. 20-22, e março 1994,
pp. 41-43), dentro do contexto cultural ocidental, no qual estamos inseridos,
desde o início do século passado, após a Revolução Francesa, tem havido uma
luta ideológica que pode ser rotulada de materialismo x espiritualismo. Não
vamos discutir sobre a origem desta luta e como ela está inserida na sociedade,
suas conseqüências, etc., o que não caberia aqui.[Nota 1] Mas esta luta tem-se
travado nos vários segmentos da sociedade e da cultura; a ponto de não mais se
perceber que ela existe, salvo no aspecto religioso, que costuma ser mais
gritante. Do lado materialista a ideologia predominante é a que podemos chamar
de positivista ou mecanicista, não necessariamente ligada à filosofia
positivista, formulada por Auguste Comte, a partir de 1830, mas com muita coisa
em comum. A ideologia (ou mentalidade) positivista essencialmente é de índole
materialista, anticlerical, pretensamente racionalista, valorizando o
"conhecimento objetivo", ou seja, o conhecimento apreendido pelos sentidos.
Já do lado espiritualista, o principal representante tem sido a Igreja Católica
Romana, seguida das diversas igrejas reformadas. No final do século passado
houve uma "grande batalha" entre essas facções, que se traduziu num
debate ideológico e em coisas mais "práticas", como disputas por
cátedras, pelo controle de instituições culturais e acadêmicas, etc., visando
ao controle do "saber oficial". Com a entrada de uma outra facção do
lado materialista, o marxismo, depois da Revolução Russa de 1917, a balança pendeu
para este lado, porém a guerra ainda não acabou, e estamos nela. Os leitores
espíritas poderão ler, com a atenção voltada nesta direção, o extraordinário
livro de Camille Flammarion, Deus na Natureza (Rio, Federação Espírita
Brasileira), escrito no século passado, onde perceberão o debate deste com os
positivistas. A Filosofia, as Ciências, as Artes, e a própria Religião, têm
sido usadas como armas nesta luta. No caso das Ciências, têm sido utilizadas
teorias científicas para justificar determinadas posições ideológicas. Por
exemplo, a teoria de Darwin e Wallace, ou seja, a "Teoria da Seleção
Natural", formulada para explicar a evolução biológica das espécies
animais e vegetais, foi utilizada para explicar o desenvolvimento das
sociedades humanas, sob o nome de "Darwinismo Social", justificando
as desigualdades sociais, principalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos,
dos fins do século passado.
2. A palavra ‘ciência’ e
seus significados
Passemos agora a um outro
tópico: os significados da palavra "Ciência". Vários são os sentidos
que esta palavra pode ter, obviamente relacionados entre si.
"Ciência" significa conhecimento, sendo usada com significado geral
("o fruto da árvore da ciência do bem e do mal") ou restrito ("a
ciência de fazer papagaios de papel"). Significa um determinado tipo de
conhecimento já consagrado como tal, como a Física, a Química, a Biologia, etc.
Significa a atividade através da qual se obtém este conhecimento ("fazer
ciência" = realizar uma determinada atividade científica). Significa
também o conjunto de pessoas empenhadas na atividade científica: "a
comunidade científica". Quando se diz que a "ciência aceita a tese de
que há outros mundos também habitados", está se querendo dizer que a
comunidade dos cientistas (ou parte dela) aceita esta tese, pois obviamente não
há ainda um estudo científico, no sentido convencional do termo, sobre outros
mundos habitados.
Nem sempre porém a
comunidade científica é homogênea e coesa. os cientistas são pessoas que em
suas atividades profissionais buscam objetividade, precisão, rigor lógico,
etc., porém for a dessas atividades são pessoas comuns, com todas
idiossincrasias, prenoções e preconceitos do vulgo. Kardec já comenta isto na
Introdução de O Livro dos Espíritos e em O que é o Espiritismo. Bertrand
Russell, conhecido filósofo deste século, menciona em um de seus textos (A
perspetiva Científica, trad. J. B. Ramos, Cia. Ed. Nacional. 1956):
Se algum de vossos amigos
for um cientista, acostumado a maior precisão quantitativa em suas
experiências, e que possua a mais recôndita capacidade de inferir, podereis
sujeitá-lo a pequena experiência sem dúvida significativa. Caso escolherdes em
palestra como assunto política, teologia, impostos sobre a renda, corretagem, a
vaidade das classes trabalhadoras e outros tópicos de natureza semelhante,
provocareis sem dúvida uma explosão e ireis escutá-lo expressar opiniões que
não forram verificadas, com um dogmatismo que nunca poderia expressar com
relação a resultados que fossem fundados em suas pesquisas de laboratório.
3. A divulgação do
conhecimento científico
O conhecimento científico,
ou seja, o conhecimento resultante da atividade científica, é divulgado de
várias maneiras, ou, como chamaremos, níveis.[Nota 2] Vamos considerar apenas a
divulgação que gera publicações (revistas, livros, etc.) ou eventualmente
filmes, vídeos, etc. Então podemos ter os seguintes níveis:
1o nível – É a divulgação
que um ou vários pesquisadores fazem de seu trabalho, de suas idéias, entre os
outros pesquisadores da mesma área. É feita normalmente no jargão próprio e seu
entendimento requer um treino adequado naquela área de conhecimento. São
utilizadas revistas especializadas, livros, etc., que têm uma característica
toda própria: o autor e o leitor são pessoas da mesma profissão e, grosso modo,
do mesmo nível de conhecimento, ou seja, ambos são membros da mesma comunidade
na qual a publicação circula.
2o nível – O conhecimento é
divulgada principalmente entre os estudantes de uma dada disciplina. O
conhecimento é preparado de forma a iniciar os estudantes naquele campo do
conhecimento. São geralmente escritos por pessoas com treino naquele campo
(cientistas, professores), e utilizam o jargão próprio, porém de uma forma
"amenizada". São os materiais didáticos na forma de livros, revistas,
filmes, etc. Evidentemente o autor e o leitor são pessoas de profissão e nível
de formação diferentes, pois o estudante está se iniciando naquela comunidade,
porém ainda não é um membro.
3o nível – Divulgação para
os "leigos". O conhecimento é também preparado para ser transmitido
aos não especialistas, porém sem a preocupação de formar o futuro especialista,
senso às vezes, feito até em forma de lazer. Podem ser escritos por cientistas,
professores ou divulgadores. Estes últimos nem sempre têm um treino naquela
área de conhecimento; são profissionais da escrita (escritores, jornalistas, e
outros) que estão mais preocupados na "digestibilidade" do
conhecimento pelo "leigo".
No 2o e 3o níveis têm papéis
importantes na preparação do conhecimento. Estes mesmos pontos de vista que
externamos poderá o leitor também os encontrar na interessante matéria
veiculada na revista Veja, de 21 de dezembro de 1994, pág. 138, da autoria de
Neuza Sanches, referente aos textos de História do Brasil para estudantes
secundários. Muitas vezes, nesta preparação do conhecimento, verdades são
transformadas em meias-verdades, involuntária ou voluntariamente … e é neste
buraco que muitas vezes caímos.[Nota 3]
4. Matéria e energia
Para ilustrar o que dissemos
no item anterior, vejamos um caso freqüentemente mencionado em textos
espíritas, e em muitos outros, que "a matéria é energia condensada … de acordo
… com Einstein, através de sua equação E=mc2 …".
Nesta afirmação equivocada
nunca é encontrada em textos de Física ou Química sérios, seja do 1o, 2o ou 3o
níveis. Mas em muitos do 3o nível (e até do 2o), que são, muitas vezes,
utilizados como fonte de referência. Por que estas afirmações, no nosso
entender, são equivocadas?
Não vamos aqui, for falta de
espaço, discorrer sobre o que vem a ser energia, no sentido empregado pela
Física.[Nota 4] O ponto importante que queremos frisar é que energia e massa
são propriedades da matéria. A célebre equação de Einstein, E=mc2, diz que a
energia total de um sistema é calculada através do produto da massa pelo
quadrado da velocidade da luz, ou seja, como a maioria das equações físicas,
relaciona duas propriedades da matéria: a massa e a energia. Esta equação, e
outras no âmbito da teoria da relatividade, vai unificar os princípios de
conservação de massa e de energia, que passam agora a ser um só:
"princípio de conservação da massa e energia".
Por que então surgiu esta
afirmação "a matéria é energia condensada"?
Como falamos acima, no item
1, os grupos empenhados na luta ideológica que mencionamos procuram buscar
apoio na Ciência. E no caso interpretou-se um resultado científico à luz de uma
determinada ideologia, no caso espiritualista, interessada em negar, se
possível, a existência da matéria, ou pelo menos em diminuir sua importância
dentro da visão de mundo dessa ideologia. À medida que isto é feito (negar a
matéria), este conjunto de idéias se torna "mais verdadeiro". Esta
interpretação interessou (e interessa) a muitos grupos espiritualistas, que
desta forma tentam mostrar a primazia do espírito sobre a matéria, sem usar de
outros fenômenos ou argumentos como a mediunidade e a reencarnação. A Doutrina
Espírita não necessita deste tipo de "argumento" para afirmar a
existência do espírito e sua primazia sobre a matéria, pelo fato de o espírito
ser o princípio inteligente. Isto é um ponto básico da Doutrina e suas
conseqüências são verificadas na prática. Não é pelo fato de o Espiritismo ser
espiritualista que necessita negar a existência da matéria. Recordemos a
Questão 27 de O Livro dos Espíritos (43a edição, FEB):
P : "Há então dois
elementos gerais do Universo: a matéria e o Espírito?"
R : "Sim e acima de
tudo Deus, o criados, o pai de todas as coisas. Deus, espírito e matéria,
constituem o princípio de tudo o que existe (…)."
Emmanuel, este Espírito que
nos tem dado tantos ensinamentos e orientações, disse alhures que "matéria
é luz congelada". Estaria Emmanuel, segundo o que dissemos acima, errado?
Não. Em primeiro lugar a frase tem um certo sentido metafórico, porém, mesmo
considerando-a ao pé da letra, ela não está errada, pois a luz é matéria. A
luz, como outras formas de radiações, é um determinado tipo de matéria, e como
tal apresenta diversas propriedades desta, como a massa e a energia. Muitas
vezes se utilizam, no meio espírita, expressões como: "o passe é uma
transferência de energia". Tal expressão não é incorreta, pois a energia
está associada aos fluidos transferidos, o que fica subtendido.[Nota 5] Esta,
como grande parte das expressões coloquiais que utilizamos, carece de precisão,
porém se fôssemos ser sempre precisos em nossa linguagem usual, acabaríamos
doidos ou mudos.
5. A Ciência é materialista?
Retomemos os significados da
palavra Ciência, que vimos acima. Costuma-se mencionar que "a Ciência é
materialista". Mas qual "Ciência"? Dos significados vistos
podemos considerar dois: um primeiro, significando conhecimentos específicos
(Física, Química, etc.), e um segundo significando a comunidade científica.
O primeiro significado nos
faz pensar também nos significados do termo "materialista". As
Ciências da matéria (Física, Química, Biologia, etc.) são
"materialistas" porque evidentemente estudam a matéria e somente a
matéria, pois foram feitas para isso. Querer que elas sirvam para outra
finalidade, ou seja, estudar aspectos não materiais da Natureza, é propor, a
nosso ver, uma temerosa aventura. Essas tentativas, algumas registradas na
história, outras não, sempre redundaram em fracasso. Por outro lado o termo
materialista, no sentido filosófico (como visto no item 1), não faz muito
sentido ao ser aplicado às ciências da matéria.
Tomando agora o segundo
significado do termo ciência – a comunidade dos cientistas – a pergunta -
título deste item: "A Ciência é materialista?", é bem apropriada.
Como também já mencionamos, o cientista é cientista apenas enquanto exerce sua
profissão; for a dela é um cidadão comum, com todas as idiossincrasias comuns.
De fato, a maioria da comunidade científica, em âmbito mundial, é materialista
no sentido filosófico do termo, assim como também o é a maioria dos membros das
sociedades aos quais pertencem os grandes contingentes científicos da atualidade
(e isto gostaríamos de frisar). E aqui vale lembrar a advertência de Emmanuel,
ou seja, da necessidade de os cientistas se evangelizarem.
Em resumo, a Ciência, pelo
fato de estudar a matéria não deve ser por isso considerada materialista, porém
a comunidade científica é, em sua maioria, materialista.[Nota 6]
6. A Ciência confirma o
Espiritismo?
Voltemos então às perguntas
iniciais: "O que há de errado nos textos de divulgação científica? Será
que a ciência moderna não confirma o Espiritismo?" Cremos que o que foi
dito acima já responde, em parte, a estas perguntas, principalmente à primeira.
Os textos de divulgação
científica, independentemente da qualidade individual de cada um, o que não vem
agora ao caso, costumam trazer em seu bojo alguma coisa a mais que os
resultados das investigações científicas. Tudo bem, cada um tem o sagrado
direito de se expressar. No entanto cada um tem também o sagrado direito de
aceitar ou não. Este sagrado direito nem sempre é exercido e aceitam-se certas
afirmações cegamente. Kardec nos ensinou o que fazer com as mensagens
mediúnicas; vamos aplicar estes critérios também nas mensagens dos encarnados.
Em resumo, acho que com os textos de divulgação científica não há nada de
errado; alguém está "vendendo seu peixe" e outros simplesmente estão
"comprando", sem verificar se o mesmo "está bom ou não".
E a Ciência confirma o
Espiritismo?
O outro aspecto a considerar
é que o Espiritismo é também uma Ciência. O sucesso das ciências em geral
significa também o sucesso da ciência espírita. O raciocínio pode parecer
simplista, em parte devido à maneira rápida com que estamos tratando, porém as
dificuldades de se entender o que vem a Ciência. Com relação a esta questão o
leitor poderá compulsar o artigo "O paradigma espírita", do nosso
confrade Silvio Seno Chibeni (Reformador, junho 1994, pp. 176-80), bem como as
referências aí citadas que, cremos, esclarecerão melhor a questão. A nosso ver,
este é um dos caminhos de confirmação do Espiritismo pela Ciência. O
Espiritismo é uma ciência que trata de uma ordem diferente de fenômenos que
aqueles de que tratam as ciências da matéria, como já afirmou Kardec. A
comparação dos resultados destas ciências não faz portanto muito sentido,
principalmente tendo em vista que os "últimos resultados
científicos", das ciências da matéria, estão entre as coisas mais mutáveis
que existem.
Uma outra linha de
comparação que se pode fazer entre Ciência (ainda entendida com conhecimento
específico) e Espiritismo seira através do desenvolvimento dos estudos
psicológicos ou dos estudos do ser humano em geral. A Psicologia atual está
longe de ser considerada uma ciência madura (ou mesmo Ciência, no pensar de
alguns), no entanto muitos estudiosos, quase sempre for a do contexto do que
poderíamos chamar de "Psicologia Oficial", têm dado contribuições
interessante. Os trabalhos de Ian Stevenson (Vinte casos sugestivos de
reencarnação, Difusora Cultural, São Paulo, 1978 e Vida antes da vida, Livraria
Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1988) e outros, trouxeram resultados notáveis.
O leitor interessado nesta área poderá consultar o livro Alquimia da Mente, do
conhecido escritor espírita Hermínio C. de Miranda (Publicações Lachâtre,
Niterói, RJ, 1994), onde muitos outros estudiosos não-espíritas têm apresentado
contribuições interessantes. Essa área de estudo, ou seja, o estudo da mente, é
uma área comum ao Espiritismo. É possível que num futuro não muito longínquo,
os estudos nesta direção chegarão aos mesmos resultados já afirmados pelo
Espiritismo, porém, de todo o vasto leque de tentativas de se estudar a mente
humana sem considerar a existência do Espírito, a maior parte tem esbarrado em
resultados ou em dificuldades onde se faz necessário considerar esta hipótese,
sem a qual se entra num beco sem saída. Talvez pudéssemos atrevidamente
"profetizar" que quando a psicologia adotasse o paradigma espírita,
estaríamos realmente no "início dos novos tempos".
Há ainda um outro ponto a
observar, ligado às ciências da matéria. Muitos estudiosos têm-se envolvido
numa determinada linha de pesquisa, que remonta à época das mesas girantes, e
que tem por objetivo provar a existência do Espírito através de métodos
físicos. Apesar de não estar só, em minha obscura opinião, esta linha não
chegou e nem chegará a nada, pois os métodos físicos são adequados para se
estudas a matéria (foram feitos para isto). Caso alguém evidencie a presença do
Espírito através de um método físico, cabe sempre um questionamento
metodológico, e daí não se chega a parte alguma. Por outro lado, muitos confrades
poderiam ainda argumentar com o fato de Kardec, em suas obras, mencionar várias
vezes que o Espiritismo e a Ciência marchariam lado a lado. Estas afirmações
poderiam causar (e causam) em muitos leitores a impressão de que Kardec falava
das ciências da matéria. Creio que Kardec tinha em mente a Ciência Espírita,
que ele acreditavam com toda a certeza, que ainda estava no começo e que iria
crescer, porém é melhor passar a palavra ao próprio Mestre Lionês (O que é o
Espiritismo, Cap. I, Segundo Diálogo – O Céptico, Oposição da Ciência, págs. 77
e 78, 36a ed., FEB):
As ciências vulgares
repousam sobre as propriedades da matéria, que se pode, à vontade, manipular;
os fenômenos que ela produz têm por agentes forças materiais.
Os do Espiritismo têm, como
agentes, inteligências que têm independência, livre-arbítrio e não estão
sujeitas aos nossos caprichos; por isso eles escapam aos nossos processos de
laboratório e aos nossos cálculos, e, desde então ficam fora dos domínios da ciência
propriamente dita.
A Ciência enganou-se quando
quis experimentar os Espíritos, como experimenta uma pilha voltaica; foi
malsucedida como devia sê-lo, porque agiu visando uma analogia que não existe;
e depois, sem ir mais longe, concluiu pela negação, juízo temerário que o tempo
se encarregou de ir emendando diariamente, como já tem emendado outros; e,
àqueles que o preferiram, restará a vergonha do erro de se haverem levianamente
pronunciado contra o poder infinito do Criador.
As corporações sábias não
podem nem jamais poderão pronunciar-se nesta questão; ela está tão for a dos
limites de seu domínio como a de decretar se Deus existe ou não; é pois, um
erro fazê-las juiz dela.
Cremos também ter
respondido, ainda que de maneira incompleta, à pergunta título desde artigo. O
que nos moveu a percorrer este caminho foi justamente a preocupação com as
afirmações que colocamos no início. Se não fosse isto, seguiríamos o caminho
adotado pelo confrade Luiz Signates, expresso no excelente artigo "Ciência
versus Religião: o debate vazio" (Reformador, abril de 1994, pág., 118),
com o qual concordamos plenamente e que, de um certo modo, converge aos pontos
de vista que externamos também no artigo já mencionado "O Espiritismo na
Academia?"
As críticas que aqui fizemos
são genéricas e não são de modo nenhum, pessoais. Gostaríamos que outros pontos
de vista fossem também colocados.
Notas
1. É bem conhecido o caso de
um candidato a um importante cargo público em nosso país que foi derrotado
"na boca da urna" por se dizer ser ateu. Em muitos países, inclusive
o nosso, muitos candidatos fazem suas campanhas políticas de Bíblia na mão.
2. Não vamos considerar a
comunicação oral, que também satisfaz aos critérios que vamos apresentar, mas
seu lado informal confunde-se com o lado formal, do qual estamos
tratando.
3. Ouvi certa vez a
expressão "duas meias-verdades não fazem uma verdade inteira"
4. A palavra energia tem
também outros significados, o que pode provocar confusões. Vide Xavier Jr. A. L.,
"Algumas considerações oportunas sobre a relação
Espiritismo-Ciência", Reformador de agosto de 1995, pp. 244-46
5. Estaria Emmanuel
utilizando um sentido diferente para a palavra energia? Se ele usou, já não
temos o que comentar, pois o sentido da frase é agora praticamente literal.
Vide a nota 4.
6. Não vamos estender mais
sobre esta questão do materialismo na Ciência. O leitor interessado poderá
consultar o livro A Ciência em Ação, de Claude Chrétien, trad. M. L. Pereira,
Papirus Editora, 1994.
Artigo publicado em
Reformador, julho de 1995, pp. 208-11. Digitado por Rodrigo Almeida Gonçalves.
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