quarta-feira, 6 de maio de 2015

A USINA HUMANA - Estudos de Henri Durville – parte II


Ana Vargas
anavargas.adv@uol.com.br

Costumo dizer que a sala de atendimento magnético, ou a sala de passes, é um solo sagrado. Ali tudo, tudo mesmo, pode acontecer. Os mais incomuns fenômenos podem parar sob nossos olhos, e tanto poderão ser físicos (doenças raras, por exemplo), psicológicos ou espirituais, ou ainda a mescla dos anteriores. Por isso, um conhecimento mínimo das estruturas que compõem o ser humano é imprescindível para que o magnetizador saiba reconhecer com o que está lidando, além dos fenômenos magnéticos que devem ser intimamente conhecidos. A abordagem a respeito do inconsciente e suas manifestações é um alerta oportuno, uma boa e fácil leitura para quem nunca leu a respeito, e um incentivo aos que já o estudam para que se aprofundem mais, acrescentando as contribuições feitas pelo avanço das ciências da mente desde a época desses autores clássicos. Muitos outros fenômenos do inconsciente param em nossas mãos, tenho certeza. 


“O que se entende por  inconsciente, não tem sido compreen-dido em toda sua exatidão. Os filósofos franceses do século XVII, e em particular Descartes, entenderam suprimir esta parte de nós mesmos.

Ou nós sentimos clara e nitidamente uma coisa, diziam eles, ou não a sentimos em absoluto. E concluíam assim: a alma é mais fácil de conhecer do que o corpo.

Isto era cometer um perigoso erro por omissão. É fácil provar que sois o teatro de uma porção de fatos semiconscientes, os quais, uma vez passados, deles só guardareis algumas impres-sões. Todas as gradações existem, apesar disso, na consciência, desde a visão deslumbrante de um raciocínio por um espírito seguro de si, até as meias  tintas mais atenuadas e mais fugazes que apresentam os fenômenos obscuros da sensibilidade inter-na, as dores vagas chamadas de doenças do coração, os prazeres obscuros da digestão e muitos outros mais.

Certos exemplos que provam a existência do inconsciente são clássicos. O moleiro dorme ao tic-tac de seu moinho. Acorda quando esse tic-tac cessa e a roda  pára. Há nele, pois, como que um despertador vigilante que acompanha, fora da consciência, durante o sono, este ruído particular. A supressão desse ruído, importante apenas para o moleiro, só afetou a consciência.

Estais em vosso aposento e trabalhais. De repente, durante um momento de descanso, os vossos olhos se fixam, sem que deis por isso, sobre os desenhos do papel que forra as paredes: são ramalhetes de rosas atadas por fitas azuis. Os ramalhetes estão unidos uns aos outros por guirlandas de rosas menores. Analisais todos os detalhes do desenho, observais todos os matizes das flores. Parece-vos que nunca tínheis visto o que agora olhais assim. Entretanto, há longos anos habitais aquele aposento. Quantas e quantas vezes vossos olhos pousaram sobre aquelas rosas! Há quanto tempo as conheceis, vendo-as sem cessar... Elas estão contidas em todas as impressões que recebeis a cada segundo, a cada milésimo de segundo, do mundo exterior a vós. Porque não as víeis? É que desviáveis a sensação recebida, porque ela era inútil. Não existe então? Sim, mas dizeis que dela não tínheis consciência. A impressão consciente pode produzir-se, ela está sempre à vossa disposição, porém foi posta em reserva, como uma cozinheira econômica faz com seus confeitos.

O mesmo sucede com todos os fatos de vossa vida mental; todos os vossos sentidos vos dão, a cada instante, milhões de informações, entre as quais escolheis algumas, muitas vezes uma só, para sobre ela fixar toda atenção. Por outra parte, guardais milhares de recordações, e dentre elas podeis escolher, quando vos apraz, como podeis ir procurar em um álbum uma fotografia entre mil outras. Todas essas recordações estão em reserva em vosso inconsciente.

Uma pessoa que nunca vistes, vos  aparece um dia. Sentis por ela uma  certa atração; ela vos agrada. Experimentastes o desejo de lhe falar, de vos aproximar dela. Por quê? É que vosso inconsciente faz das suas. Tal traço desta pessoa, tal atitude, tal inflexão de voz, vos despertaram, sem que o percebêsseis, uma porção de recordações que se relacionam com pessoas amadas por vós anteriormente. É o olhar de uma irmã, a voz de uma mãe, a atitude de uma mulher que admirastes numa reunião, num teatro, em uma fotografia ou numa gravura.

Todos os sentimentos que experimentastes pelas pessoas que, de perto ou de longe, se pareciam com aquela que vos desperta uma viva e repentina simpatia, se associam à vista, ao pensamento desta pessoa. E esta síntese brusca se opera sem o perceberdes; ser-vos-ia tão difícil descobrir-lhes os elementos como é, de ordinário, remontar às causas de nossos sonhos. A maior parte de nossas sensações, de nossas emoções, de nossos sentimentos tem, no que se chama o inconsciente, suas causas profundas.

O mesmo se dá com os nossos atos involuntários. Eles são preparados por movimentos automáticos, cuja existência foi revelada por experimentalistas.

O Dr. Binet dá um livro a uma pessoa acordada e ordena-lhe que leia em voz alta. Durante esse tempo, ele isola, com um cartão assaz grande, a mão que não segura o livro. A esta mão, que tem um lápis, ele imprime um movimento determinado, de tal modo que ela traça círculos ou retas sobre um papel. Ele continua, durante alguns instantes, o movimento, enquanto que toda atenção do paciente está concentrada na leitura. Depois de certo tempo, ele abandona a mão a si mesma: esta continua automaticamente o movimento que lhe foi imposto e que ela prolonga ainda, durante muito tempo, fora da direção de seu proprietário, absorvido por outros cuidados.

Pode-se ir mais longe e penetrar no pensamento alheio, graças aos indícios que nos fornecem seus movimentos inconscientes. O Dr. d’Allones imaginou um dispositivo que permite adivinhar automaticamente um pensamento não expresso, com a condição de que ele não seja muito com-plicado.

Trata-se de um cilindro rotativo, onde estão inscritas ordenadas ou linhas verticais a intervalos sempre iguais. Cada ordenada é marcada por um algarismo ou uma letra inscrita sobre ela.
O paciente de quem se quer adivinhar o pensamento fica  sentado, de costas voltadas para o cilindro, segurando uma pera de borracha como as que são usadas pelos fotógrafos. A pera é adaptada a um tubo delgado que comunica com um tambor inscritor de Marey. A menor contração do paciente que aperta a pera verifica-se, sem que ele o perceba, um sinal sobre o tambor.

Dizei ao paciente que pense um algarismo ou uma letra, nomeie todas as letras ou todos os algarismos, à medida que forem passando diante da ponta. Quando tiverdes enunciado o algarismo ou a letra que o paciente pensou, sem que ele o perceba, a sua mão se contrairá e esta contração se inscreverá quase sem erro possível.

Se desejardes obter uma frase inteira, procure adivinhar sucessivamente as letras de cada palavra. Que vosso paciente pense, antes de tudo, na primeira letra da primeira palavra. Soletrai, em voz alta, todo o alfabeto e o paciente contrairá a mão, involuntariamente, à passagem da letra que ele tiver pensado

Chegareis, assim, facilmente, a formar a frase inteira. Estas experiências são bem sucedidas não só com os grandes nervosos, mas também com a grande maioria das pessoas.

Pelo mesmo processo, pode se  adivinhar os números e as operações aritméticas. Pedi ao vosso paciente para operar mentalmente uma subtração de dois números compreendidos entre 7 e 41. Se ele reage em 16, em 24 e em 40, é, evidentemente, porque terá pensado que 40 menos 24, igual a 16.

Pedi, depois, ao paciente que pense em uma multiplicação, cujos algarismos não ultrapassem 10. Se ele reage em 2, em 4 e em 8, concluireis que ele pensou: 2 multiplicado por 4, igual a 8.

Podereis ainda adivinhar o que a vontade daquele que serve para a experiência quereria ocultar-vos, uma vez que se trata de um grande nervoso. O Dr. d’Allones foi levado a tentar esta experiência porque havia observado que quando um paciente tem consciência de suas reações involuntárias e procura suprimi-las, acontece-lhe reagir mais fortemente ainda do que de costume.

Uma rapariga de vinte anos, criminosa, não alienada, tinha envenenado sua rival. Simulando histeria, ela conseguira obter da justiça uma declaração de que não havia motivo para prosseguir-se a causa, subterfúgio que o seu advogado, dizia ela, não havia desaprovado. O Dr. d’Allonnes, por meio de seu dispositivo, obteve confissões escritas

Reproduzimos uma figura que mostra esta curiosa experiência. O traçado contém a confissão: gai voler por j’ ai volé (eu roubei). O francês está estropiado porque a paciente é semianalfabeta.

Estas contrações involuntárias dos músculos foram utilizadas por todos os pseudoledores de pensamento. Um deles, Bellini, fazia ocultar um objeto em uma sala e afirmava descobri-lo, penetrando o pensamento de um espectador que percorria a sala com ele, dando-lhe a mão. Na reali-dade, ele sentia, quando passava diante da fila de cadeiras onde o objeto estava oculto, uma ligeira resistência de seu guia involuntário. Ele estacava e não ia mais longe. Para empregar a expressão das crianças em um brinquedo semelhante, “tinha farejado”. Então, penetrando pela fila de cadeiras, continuava sua pesquisa, animado pelos murmúrios de admiração dos vizinhos e pelos fracos movimentos da mão que ele segurava.

Da mesma forma, Pickmann, o leitor de pensamentos bem conhecido, dizia a um espectador, que não era absolutamente um comparsa:

‘O Sr. vai pensar um número; eu o lerei em seu cérebro e escreverei depois em um quadro negro. Não haverá, assim, nem truque, nem compadrismo  possível.’

Pickmann dizia uma parte da verdade: ele não tinha nenhum guia. Entretanto, sem o perceber, o espectador, por seus movimentos inconscientes, servia de comparsa.

Para fazer a experiência, Pickmann colocava alguém diante de um quadro negro e fazia-o segurar na mão direita um pedaço de giz. Segurava, depois, esta mão e, à medida que ia pronunciando rapidamente e em voz bem alta os algarismos 0, 1, 2, etc., agarrava a mão direita do espectador, fazendo o simulacro de escrever cada um dos algarismos, ao mesmo tempo, que os enunciava. Quando o algarismo pensado era pronunciado, o espectador tinha um ligeiro movimento que o levava, sem que ele se apercebesse, a escrever, ele mesmo, o algarismo.

Esta influência do inconsciente se revela plenamente na escrita. É desta observação que nasceu a grafologia. Se a nossa saúde se altera, nós vemos os finais das palavras, as terminações das linhas abaixarem-se da maneira mais desalentada. Ao contrário, linhas ascendentes revelam uma saúde florescente, uma excelente moral e perspectivas ambiciosas, confessadas ou não.

Da mesma forma, aquele que a vida tornou concentrado, fechará seus o e seus a, afivelando-os mesmo, se ele se tornou de todo desconfiado. Aquele que é voluntário, corta fortemente seus t. O fato de pontuar corretamente revela hábitos de ordem. Mil outros indícios podem nos revelar o estado de saúde ou de espírito daqueles com quem tratamos.

É ao inconsciente ainda que se deve atribuir o medo do fiasco e os sonhos. O medo do fiasco, isto é, a timidez, é o temor exagerado do público. A força de se dizer que ele vai falar mal, mal cantar ou mal representar, o infeliz medroso põe-se em um tal estado que se realiza suas mais sinistras predições. Sua memória se paralisa, suas ideias não têm mais nenhuma coerência, as palavras que ele deve proferir fogem-lhe. E quando ele dá fé desses desfalecimentos, seus temores duplicam. Seu corpo amolece, suas pernas se recusam a sustentá-lo, sente um aperto na laringe e no estômago e, não raro, torna-se presa da afonia e de penosas vertigens.

O medo do fiasco exerce uma influência nefasta sobre os rins e os intestinos, que ele impede de funcionar. Suores abundantes e gelados cobrem o corpo do infeliz que experimenta tão rude provação. Vamos procurar demonstrar que nossos sonhos são o produto de nosso inconsciente, que, neste caso, age sozinho. Alfred Maury1 provou que a causa de certos sonhos reside em fatos psicológicos que precedem ou acompanham o sono ou nas associações inconscientes. M. Foucault insistiu sobre este último ponto2.

Um exemplo deste gênero de sonho, dado por Maury, é característico. O distinto psicólogo tinha-se dedicado a registrar suas impressões. Uma noite, ele se vê bruscamente diante de um tribunal revolucionário. Reconheceu o terrível Fouquier-Tinville e, dentro em pouco, viu-se condenar à morte. Passa para a prisão, ouve chamarem-no pelo nome, sobe para a carreta fúnebre; chega ao cadafalso, é impelido sobre a báscula e sente nitidamente sobre a nuca o pavoroso choque da lâ-mina. Desperta bruscamente e verifica que o dossel do leito acabara de cair-lhe sobre a nuca e de provocar seu retorno à plena consciência.
Assim é que, as múltiplas imagens que haviam desfilado em seu espírito tinham sucedido à queda do dossel. Vê-se com que rapidez assombrosa elas se produziram, pois que não havia certamente decorrido mais de um segundo entre o choque do pedaço de madeira do dossel e o despertar. Vê-se também que a inteligência do observador havia inconscientemente procurado uma explicação do fenômeno físico e psicológico, e que uma influência secreta tinha levado Maury a dizer para si mesmo:

‘Eu devo estar na época do Terror, pois que recebo sobre minha cabeça a lâmina da guilhotina.’

Começai a imaginar que lugar considerável ocupa o inconsciente em vossa vida mental. Pode-se dizer que os fatos conscientes são, em proporção aos fatos inconscientes, muito pouco numerosos. Nós o admitimos sem dificuldade, se considerarmos que são eles que presi-dem a tudo o que é em nós automático, invariável, sempre idêntico a si mesmo. Os fatos inconscientes se organizam e é de sua própria ordem que nasce a consciência. Ela é como a chama que se produz de uma vez no fogão, mas que não poderia iluminar, se o fole não tivesse atuado sobre as brasas.

A consciência não é, como julgou Maudsley, um luxo sem importância; ela é o resultado necessário de todo este encadeamento que passamos em revista convosco. Da mesma forma que nossa usina fisiológica tem por fim fabricar a força nervosa que, segundo a forte expressão de Th. Ribot,  se acumula em nosso inconsciente, assim também esta força, quando seu potencial é suficiente, se manifesta sob a forma consciente que nos resta estudar.”

Seguiremos, no nosso próximo encontro, aqui no Vórtice, compartilhando o estudo de Henri Durville sobre a consciência, encerrando o conhecimento básico do organismo material, da nossa usina humana, conforme esse autor denomina.

Referências;


1 Maury, Alfred – O sono e os sonhos.
2 Foucault, Marcel – O sonho; Paris, 1906.


JORNAL VÓRTICE ANO VII, n.º 09 - fevereiro - 2015


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domingo, 3 de maio de 2015

OS BONS MÉDIUNS - Manoel Philomeno de Miranda (espírito)


Manoel Philomeno de Miranda (espírito)

Inerente a todos os seres humanos, a faculdade mediúnica expressa-se de maneira variada, conforme a estrutura evolutiva, os recursos morais, as conquistas espirituais de cada indivíduo.
Incipiente em uns e ostensiva noutros, pode ser considerada com a peculiaridade psíquica que permite a comunicação dos homens com os Espíritos, mediante cujo contributo inúmeras interrogações e enigmas encontram respostas e elucidações claras para o entendimento dos reais mecanismos da existência física na Terra.
Distúrbios psíquicos inexplicáveis, desequilíbrios orgânicos injustificáveis, transtornos comportamentais e dificuldades nos relacionamentos sociais e afetivos, malquerenças e aflições íntimas destituídas de significado, exaltação e desdobramentos da personalidade, algumas alucinações visuais e auditivas, na mediunidade encontram seu campo de expansão, refletindo os dramas espirituais do ser, que procedem das experiências anteriores à atual existência física, alguns transformados em fenômenos obsessivos profundamente perturbadores.

Mal compreendida por largo tempo através da História, foi envolta em mitos e cercada de superstições, que nada têm a ver com a sua realidade.

Sendo uma percepção da alma encarnada cujo conteúdo as células orgânicas decodificam, não significa manifestação de angelitude ou de santificação, como também não representa punição imposta por Deus, a fim de alcançar os calcetas e endividados perante as Soberanas Leis.

Existente igualmente no ser espiritual, é uma faculdade do Espírito que, através dos delicados equipamentos sutis do seu perispírito, faculta o intercâmbio entre os desencarnados de diferentes esferas da Erraticidade.

Dessa maneira, não se trata de um calvário de padecimentos intérminos em cujo curso a tristeza e o sofrimento dão-se as mãos, como pretendem alguns portadores de comportamento masoquista, mas também não é característica de superioridade moral, que distingue o seu possuidor em relação às demais pessoas.

Pode ser considerada como a moderna escada de Jacó, que permite a ascensão espiritual daquele que se lhe dedica com abnegação e devotamento.

Semelhante às demais faculdades do ser humano, exige cuidados especiais, quais aqueles que se dispensam à inteligência, à memória, às aptidões artísticas e culturais...

O conhecimento do seu mecanismo torna-se indispensável para que seja exercida com seriedade, ao lado de cuidados outros que se lhe fazem essenciais, quais sejam, a identificação da lei dos fluidos, a aplicação dos dispositivos morais para o aperfeiçoamento incessante, a disciplina dos equipamentos nervosos, as disposições superiores para o bem, o nobre e o edificante.

Neutra, sob o ponto de vista ético-moral, qual ocorre com as demais faculdades, é direcionada pelo seu portador, que se encarrega de orientá-la conforme as próprias aspirações, perseguindo os objetivos elevados, que são a meta essencial da reencarnação.

À medida que o médium introjeta reflexões em torno do seu conteúdo valioso, mais se lhe dilatam as possibilidades, que, disciplinadas, facultam ensejo para a produção de resultados compatíveis com o direcionamento que se lhe aplique.

A observação cuidadosa dos sintomas através dos quais se expressa, favorece a perfeita identificação daqueles que se comunicam e podem contribuir em favor do progresso moral do medianeiro.

O hábito do silêncio interior e da quietação emocional faculta-lhe a captação das ondas que permitem o intercâmbio equilibrado, ampliando-lhe a área de serviços espirituais.

Concessão divina para a Humanidade, é a ponte que traz de volta aqueles que abandonaram o corpo físico ou que dele foram expulsos, sem que deixassem a vida, comprovando-lhes a imortalidade em triunfo.

Ante a impossibilidade de ser alcançada a perfeição mediúnica, face à condição predominante de mundo de provações que caracteriza o planeta terrestre e tipifica os seus habitantes por enquanto, cada servidor deve lutar para adquirir a qualidade de bom médium, isto é, aquele que comunica com facilidade, que se faz instrumento dócil aos Espíritos que o utilizam sob a orientação do seu Mentor.

Nunca se acreditando imaculado, sabe que pode ser vítima da mistificação dos zombeteiros e maus, não a temendo, mas trabalhando por sutilizar as suas percepções psíquicas e emocionais, e elevando-se moralmente para atingir patamares mais enobrecidos nas faixas da evolução.

A facilidade com que os desencarnados o utilizam, especialmente por estar disponível sempre que necessário, propicia-lhe maior sensibilidade e o credencia ao apoio dos Guias da Humanidade, que o cercam de carinho e o inspiram para a ascensão contínua.

Consciente dos próprios limites e das infinitas possibilidades da Vida, reconhece o quanto necessita de transformar-se interiormente para melhor, a fim de ser enganado menos vezes e jamais enganar aos outros, pelo menos conscientemente.

A disciplina e o equilíbrio moral, os pensamentos e as ações honoráveis, o salutar hábito da oração e da meditação, precatam-no das investiduras dos maus e perversos que pululam em toda parte, preservando-lhe os sutis equipamentos mediúnicos dos choques de baixo teor vibratório que lhes são inerentes, ajudando-o, assim, a manter contato com esses infelizes, quando necessário, porém, sob o controle dos Guias que os conduzem, jamais ao paladar e apetite da loucura que os avassala.

O bom médium é simples e sem as complexidades do agrado da ignorância, do egoísmo e da presunção, cujas conquistas são internas e que irradia os valores morais de dentro para fora, qual antena que possui os requisitos próprios para a captação das ondas que serão transformadas em imagens sonoras, visuais ou portadoras de força motriz para muitas finalidades.

Quando esteja açodado pelas conjunturas difíceis ou afligido pelas provações iluminativas, que fazem parte do seu processo de evolução, nunca deve desanimar, nem esperar fruir de privilégios, que os não possui, seguindo fiel e tranqüilo no desempenho da tarefa que lhe diz respeito, preservando a alegria de viver, servir e amar.

O trabalho edificante será sempre o seu apoio de segurança, que o fortalecerá em todos os momentos da existência física, nunca se refugiando na inoperância, que é geradora de mil males que sempre perturbam.

Porque identifica as próprias deficiências, não se jacta da faculdade que possui, reconhecendo que ela pode ser bloqueada ou retirada, empenhando-se para torná-la uma ferramenta de luz a serviço do Amor em todos os instantes.

Os bons médiuns, que escasseiam, em razão da momentânea inferioridade humana, são os instrumentos hábeis para contribuírem em favor do Mundo Novo de amanhã, quando a mediunidade, melhor compreendida e mais bem exercida, se tornará uma conquista valiosa do espírito humano credenciado para a felicidade que já estará desfrutando.

(Página psicografada pelo médium Divaldo P. Franco, na sessão mediúnica da noite de 08 de agosto de 2001, no Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador, Bahia.)


(Jornal Mundo Espírita de Setembro de 2001)

sábado, 2 de maio de 2015

PARA OS ESPÍRITOS O PENSAMENTO É TUDO


Estudo com base numa comunicação dos Espíritos Erasto e Timóteo in O Livro dos Médiuns, Cap. XIX, Papel do Médium nas Comunicações, item 225. Obra codificada por Allan Kardec.

Pesquisa: Elio Mollo

Os Espíritos não têm necessidades de vestir os seus pensamentos com palavras. Os seres encarnados pelo contrário, só podem comunicar-se pelo pensamento traduzido em palavras. Contudo, o ser encarnado põe o seu corpo, como instrumento de comunicação por palavras, à disposição, o que um Espírito errante não tem condição de fazê-lo.  Assim, podemos perceber a importância do papel dos médiuns nas comunicações espíritas
Os Espíritos gastam algum tempo para percorrer o espaço, porém, rápido como o pensamento. Quando o pensamento está em algum lugar, a alma está também, uma vez que é a alma que pensa. O pensamento é um atributo da alma. Para os Espíritos o pensamento é tudo. (1)

Os Espíritos agindo sobre os fluidos espirituais, não os manipulam como os homens manipulam os gases, mas com a ajuda do pensamento e da vontade. O pensamento e a vontade são para os Espíritos o que a mão é para o homem. Pelo pensamento, eles imprimem a esses fluidos tal ou tal direção; aglomeram-nos, combinam-nos ou os dispersam. É com esses fluidos que eles formam a grande oficina ou o laboratório da vida espiritual. (2)

A linguagem dos Espíritos é o verdadeiro critério pelo qual podemos julgá-los, pois, sendo a linguagem a expressão do pensamento, eles tem sempre um reflexo das qualidades boas ou más que possuem em sua capacidade evolutiva, sendo assim, o primeiro sentimento que os evocadores e os médiuns devem ter em relação a eles é o da prudência (3), pois os Espíritos, não sendo outros senão as almas dos homens, não possuem a soberana sabedoria, nem a soberana ciência. O saber dos Espíritos esta limitado ao grau de seu adiantamento, e a suas opiniões tem unicamente o valor de uma opinião pessoal. Essa verdade, reconhecida preservará os evocadores e os médiuns da grande dificuldades de crerem em suas infalibilidades. Inclusive, é útil e sensato não formular teorias prematuras sobre o dizer de um só ou de alguns Espíritos. (4)

Salvo algumas poucas exceções, o médium transmite o pensamento dos Espíritos pelos meios mecânicos de que dispõe, e a expressão desse pensamento pode e deve, o mais frequentemente, ressentir-se da imperfeição desses meios.

Qualquer que seja a natureza dos médiuns escreventes, mecânicos, semi-mecânicos ou simplesmente intuitivos, os processos de comunicação dos Espíritos não variam na essência. As comunicações com os Espíritos encarnados, diretamente, ou com os Espíritos propriamente ditos, se realizam unicamente pela irradiação do pensamento. Os pensamentos não necessitam das vestes da palavra para que os Espíritos os compreendam. Todos os Espíritos percebem o pensamento transmitido, pelo simples fato de ele ter sido dirigido a alguém, um grupo, ou de uma maneira geral e cada um o entenderá na razão do grau de suas faculdades intelectuais. Quer dizer que determinado pensamento pode ser compreendido por estes e aqueles, segundo o respectivo adiantamento, enquanto para outros o mesmo pensamento, não despertará nenhuma lembrança nenhum conhecimento no fundo do seu coração ou do seu cérebro não será perceptível. No caso de ser um Espírito encarnado que serve de médium, este processo é o método mais apropriado para transmitir o pensamento de um Espírito para outros encarnados, mesmo que o médium não o compreenda.

Se um Espírito tiver a necessidade de usar de um médium para comunicar o seu pensamento por palavras, ele irá usar um ser terreno (espirito encarnado), porque este pode ceder o seu corpo como um instrumento, colocando-se a sua disposição, o que um Espírito errante não tem condição de fazê-lo. Eis aqui um ponto importante do papel dos médiuns nas comunicações espíritas.

Assim, quando os Espíritos superiores encontram num médium o cérebro cheio de conhecimentos adquiridos na sua vida atual, e o seu Espírito rico de conhecimentos anteriores, latentes, próprios a facilitar as comunicações, eles preferem servir-se dele, porque então o fenômeno da comunicação será muito mais fácil do que através de um médium da inteligência limitada, e cujos conhecimentos anteriores fossem insuficientes.

Para compreender melhor tentaremos usar algumas explicações que nos parecem ser mais claras e precisas.

Com um médium cuja inteligência atual ou anterior esteja desenvolvida, o pensamento do Espírito se comunica instantaneamente, de Espírito a Espírito, graças a uma faculdade peculiar à essência mesma do Espírito. Nesse caso o Espírito encontra no cérebro do médium os elementos apropriados à roupagem de palavras correspondentes a esse pensamento, quer o médium seja intuitivo, semi-mecãnico ou mecânico. É por isso que apesar de diversos Espíritos se comunicarem através do médium, os ditados por eles recebidos trazem sempre o cunho pessoal do médium, quanto à forma e ao estilo. Porque embora o pensamento não seja absolutamente dele, o assunto não se enquadre em suas preocupações habituais, se bem o que os Espíritos desejam dizer não provenha do médium, ele não deixa de exercer sua influência na forma, dando-lhe as qualidades e propriedades características da sua individualidade. É precisamente como quando olhamos diversos lugares através de binóculos coloridos, de lentes brancas, verdes ou azuis, e embora os lugares e objetos vistos pertençam ao mesmo trecho, mas tenham aspectos inteiramente diferentes, aparecem sempre com a coloração dada pelas lentes.

Melhor ainda: comparemos os médiuns a esses botijões de vidros com líquidos coloridos e transparentes que se veem nos laboratórios farmacêuticos. Pois bem, os Espíritos são como focos luminosos voltados para certos trechos de paisagens morais, filosóficas, psicológicas, iluminando-os através de médiuns azuis, verdes ou vermelhos, de maneira que os nossos raios luminosos tomam essas colorações, se bem o que os Espíritos desejam dizer não provenha dele, ou seja, obrigados a atravessar vidros mais ou menos bem lapidados, mais ou menos transparentes, o que vale dizer médiuns mais ou menos apropriados, esses raios só atingem os objetos que os Espíritos desejam iluminar tomando a coloração ou a forma própria e particular desses médiuns.

Para terminar oferecemos mais uma comparação: os Espíritos são como os compositores de música que tendo composto ou querendo improvisar uma ária só dispõem de um destes instrumentos; um piano, um violino, uma flauta, um fagote ou um apito comum. Não há dúvida que com o piano, com a flauta ou com o violino eles executarão a ária de maneira satisfatória. Embora os sons do piano, do fagote ou da flauta sejam essencialmente diferentes entre si, a composição do Espírito será sempre a mesma nas diversas variações de sons. Mas se ele dispõe apenas de um apito comum, ou mesmo de um sifão de esguicho, ei-lo em dificuldade.

Quando os Espíritos são obrigados a servir-se de médiuns pouco adiantados o trabalho deles se torna mais demorado e penoso, pois eles tem de recorrer a formas imperfeitas de expressão, o que é para eles um embaraço. São então forçados a decompor os pensamentos e ditar palavra por palavra, letra por letra, o que é fatigante e aborrecido, constituindo verdadeiro entrave à presteza e ao bom desenvolvimento das manifestações espíritas.

É por isso que eles se sentem felizes quando encontram médiuns bem apropriados, suficientemente aparelhados, munidos de elementos mentais que podem ser prontamente utilizados, bons instrumentos, numa palavra, porque então o perispírito dos Espíritos, agindo sobre o perispírito daquele que mediunizam, só tem de lhe impulsionar a mão que serve de porta caneta ou porta lápis. Com os médiuns mal aparelhados eles, para se comunicarem são obrigados a realizar um trabalho por meio de pancadas, ou seja, indicando letra por letra, palavra por palavra, para formar as frases que traduzem o pensamento a ser transmitido. Essa a razão dos Espíritos preferirem as classes esclarecidas e instruídas, para a divulgação do Espiritismo e o desenvolvimento da mediunidade escrevente, embora seja nessas classes que se encontram os indivíduos mais incrédulos, mais rebeldes e mais destituídos de moralidade. E é também por isso que, se deixam aos Espíritos brincalhões e pouco adiantados a transmissão das comunicações tangíveis por meios de pancadas e os fenômenos de transporte, é porque os homens são pouco sérios preferindo os fenômenos que lhes tocam os olhos e os ouvidos aos de natureza puramente espiritual, puramente psicológica.

Quando os Espíritos desejam ditar mensagens espontâneas agem sobre o cérebro, nos arquivos do médium, e juntam o material deles com os elementos que o médium fornece. E tudo isso sem que ele o perceba. É como se os Espíritos tirassem da bolsa do médium o seu dinheiro e dispuséssem a moedas, para somá-las. Na ordem que lhes parecer melhor. (5)

Mas quando o próprio médium quer interrogar os Espíritos, melhor será que antes reflita seriamente a fim de fazer as perguntas de maneira metódica, facilitando assim o trabalho deles para responder. Porque o cérebro do médium, como acontece frequentemente, pode estar numa desordem dificílima de organizar, sendo para os Espíritos muito mais difícil trabalhar com o labirinto do pensamento do médium.

Quando as perguntas devem ser feitas por terceiro, é bom e conveniente que sejam antes comunicadas ao médium para que ele se identifique com o Espírito do interrogante, impregnando-se, por assim dizer, das suas intenções. Porque então os Espíritos terão muito mais facilidades para responder, graças à afinidade existente entre o perispírito do Espírito e o do médium que servirá de intérprete (6).

Certamente, os Espíritos podem tratar de Matemáticas através de um médium que as desconheça por completo, mas quase sempre o Espírito do médium possui esse conhecimento em estado latente. Isso quer dizer que se trata de um conhecimento pessoal do ser fluídico e não do ser encarnado, porque o seu corpo atual é um instrumento inadequado ou rebelde a essa forma de conhecimento. O mesmo se dá com a Astronomia, a Poesia, a Medicina e as línguas diversas, e ainda com todos os demais conhecimentos peculiares à espécie humana. Por fim, os Espíritos, tem ainda o meio dificultoso de elaboração, aplicado aos médiuns completamente estranhos ao assunto tratado, que é o de reunião das letras e das palavras como se faz em tipografia (7).

Finalizando, os Espíritos não têm necessidades de vestir os seus pensamentos com palavras. Eles o percebem e os transmitem naturalmente entre si. Os seres encarnados pelo contrário, só podem comunicar-se pelo pensamento traduzido em palavras. Enquanto a letra, a palavra, o substantivo, o verbo, a frase, enfim, são necessários para percepção dos seres encarnados, mesmo mental, nenhuma forma visível ou tangível é necessária para os Espíritos. (8).

Esta análise do papel dos médiuns e dos processos, pelos quais se comunicam é tão clara quanto lógica. Dela decorre o princípio de que o Espírito não se serve das ideias do médium, mas dos materiais necessários para exprimir os seus próprios pensamentos, existentes no cérebro do médium, e de que, quanto mais rico for cérebro do médium, mais fácil se torna a comunicação.

Os que exigem esses fenômenos para se convencerem, devem antes tratar de estudar a teoria, só assim, poderão saber em que condições especiais eles se produzem. (9)


NOTAS

(1) Ver Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Escala Espírita, itens 89, 89a e 100.
 (2) Ver Allan Kardec, Revista Espírita junho 1868, Fotografia do Pensamento.
 (3) Ver Allan Kardec, Revista Espírita, setembro 1859, Procedimentos para Afastar os Maus Espíritos.
 (4) Ver Allan Kardec, Obras Póstumas, 2ª. Parte, Minha primeira iniciação no Espiritismo.
 (5) Note-se a precisão deste exemplo: o médium possui os elementos materiais da comunicação, que no caso são as moedas; o Espírito os toma e utiliza segundo as suas ideias para exprimir o seu pensamento. Os exemplos anteriores são também de extrema clareza. Mas devemos ressaltar neste capitulo o perfeito esclarecimento das relações entre os Espíritos e os médiuns. Graças a esse esclarecimento, compreende-se a função médiuns como de verdadeiro intérprete espiritual e os problemas tantas vezes levantados pela crítica, como o da marca pessoal do médium nas mensagens, o da trivialidade da maioria destas, o da dificuldade na obtenção de comunicações de teor elevado no campo das Ciências ou da Filosofia, e outros que tais ficam perfeitamente esclarecidos. Vê-se que os críticos do Espiritismo, em sua esmagadora maioria, nada conhecem de todos esses problemas, expostos de maneira precisa e didática há mais de um século. (Nota de J. Herculano Pires)
 (6) Observe-se aqui a origem de uma das maiores dificuldades encontradas pela pesquisa psíquica. A lei de afinidade fluídica é desconsiderada pelos pesquisadores, em nome da desconfiança "necessária" ao rigor científico. Felizmente, na atualidade, os estudos de Parapsicologia sobre as relações entre o experimentador e o sensitivo modificaram muito essa situação, dando razão à pesquisa espírita. Compreende-se, afinal, depois de muitas torturas físicas e morais impostas aos médiuns, que o problema exige condições psicológicas favoráveis.  (Nota de J. Herculano Pires)
 (7) Note-se a diferença entre ser fluídico e ser encarnado. O primeiro, como Espírito, possui conhecimentos e predicados que podem não se refletir no segundo. O ser encarnado é um condicionamento especial do ser fluídico para uma experiência terrena, com vistas aos objetivos dessa experiência. A personalidade total do homem está no Espírito e não na conjugação espírito corpo.  que constitui a sua forma de manifestação temporária e específica na Terra. (Nota de J. Herculano Pires)
 (8) A expressão vestir os pensamentos com palavras corresponde precisamente ao princípio espírita da encarnação e da materialização. O pensamento, segundo a Lógica, é uma entidade abstraia, que existe realmente, mas como objeto lógico.  Essa entidade se manifesta no plano material através dos elementos convencionados para traduzir ideias: a palavra, a letra, os sinais da mímica, telegráficos e outros. É a esses signos convencionais que os Espíritos recorrem para nos transmitir, através dos médiuns, os seus pensamentos, que então se encarnam ou se materializam na palavra, na escrita, na tiptologia. Esse problema lógico, até há pouco encarado como de simples abstração mental, passou para o plano da realidade científica através das pesquisas parapsicológicas sobre telepatia. O pensamento não é hoje apenas um objeto lógico, sem realidade própria, uma espécie de epifenômeno produzido pelo cérebro (segregado pelo cérebro como o fígado segrega a bílis, segundo a conhecida expressão materialista), mas um objeto dotado de realidade cientificamente constatada e cuja natureza extrafísica (segundo Rhine e sua escola)  abre as portas da Ciência para um novo mundo, evidentemente o espiritual. Na Física moderna o problema é colocado em termos de antimatéria, mas também já foi atingido e o físico nuclear Arthur Compton chegou mesmo a afirmar que "por trás da energia", a que as pesquisas reduziram a própria matéria, existe algo mais, e que esse algo mais "parece ser pensamento".  Vemos assim a importância dessas explicações dos espíritos de Erasto e Timóteo, dadas há mais de um século e sistematicamente desprezadas e ridicularizadas pelos que negam e combatem o Espiritismo. (Nota de J. Herculano Pires)

 (9) Porque os Espíritos se referiram ao cérebro e não à mente, nessas explicações, Kardec segue a mesma linha nas suas observações? Porque estão explicando o processo de manifestação, que implica a materialização do pensamento. E claro que os elementos ou materiais que aludem são abstratos, são conceitos, mas em forma palavras. Atente-se para a explicação final de que as palavras nos são necessárias pá a percepção do pensamento, mesmo mental, e será fácil compreender que eles trata das funções mentais do cérebro, que é o instrumento material da mente. De fato, (experiências telepáticas ficou demonstrado que a transmissão do pensamento se por meio de palavras, em virtude do nosso hábito de pensar em palavras. (Nota de J. Herculano Pires).

sábado, 14 de fevereiro de 2015

A CIÊNCIA CONFIRMA O ESPIRITISMO?


Aécio Pereira Chagas

Temos observado na literatura espírita (livros, revistas, jornais) que constantemente surgem afirmações do tipo "a Ciência moderna confirma o Espiritismo", seguida de citações, a nosso ver, muito duvidosas a respeito de questões científicas. Muitas vezes percebemos no autor uma seriedade de propósitos, porém suas citações nem sempre se apóiam bem no que poderíamos chamar de um "conhecimento científico estabelecido". São citadas obras de divulgação científica que nem sempre primam pelo rigor e, o que é pior, são às vezes escritas com uma "segunda intenção". Perguntará então o leitor: "O que há de errado nos textos de divulgação científica? Será que a Ciência moderna não confirma o Espiritismo?" Neste artigo vamos tecer inicialmente algumas considerações sobre materialismo, espiritualismo, a Ciência e sua divulgação, sobre outros temas decorrentes e, finalmente, tentaremos responder a estas duas questões.

1. Materialismo e espiritualismo

Muitos compêndios de Filosofia ensinam que as escolas filosóficas, as visões de mundo, as ideologias, etc., podem se alinhar em dois grandes grupos: o grupo materialista, para os quais tudo é matéria, senso o pensamento uma qualidade da matéria, e o grupo espiritualista ou idealista, para os quais o espírito existe como uma realidade independente da matéria (vide, por exemplo, Dicionário de Filosofia, Durozoi e Roussel, Papirus, 1993). "(…) Com efeito, o espiritualismo é o oposto do materialismo. Quem quer que acredite haver em si alguma coisa mais do que matéria, é espiritualista (…)" (Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Introdução, 75a edição, FEB, pág. 13). As filosofias, as ideologias, dentro de cada um dos dois grupos, estão longe de concordarem entre si em muitos outros pontos, a não ser neste único aspecto de aceitar ou não a existência do espírito. O Espiritismo evidentemente está no segundo grupo e, como já bem apontou Deolindo Amorim (O Espiritismo e as doutrinas espiritualistas, 3a ed., Livraria Ghignone Editora, 1979), o fato de uma doutrina ser espiritualista não significa que está de acordo com o Espiritualismo, a não ser na crença do espírito como algo diferente da matéria.

Conforme já tivemos oportunidade de expressar no artigo "O Espiritismo na Academia?" (Revista Internacional de Espiritismo, fevereiro 1994, pp. 20-22, e março 1994, pp. 41-43), dentro do contexto cultural ocidental, no qual estamos inseridos, desde o início do século passado, após a Revolução Francesa, tem havido uma luta ideológica que pode ser rotulada de materialismo x espiritualismo. Não vamos discutir sobre a origem desta luta e como ela está inserida na sociedade, suas conseqüências, etc., o que não caberia aqui.[Nota 1] Mas esta luta tem-se travado nos vários segmentos da sociedade e da cultura; a ponto de não mais se perceber que ela existe, salvo no aspecto religioso, que costuma ser mais gritante. Do lado materialista a ideologia predominante é a que podemos chamar de positivista ou mecanicista, não necessariamente ligada à filosofia positivista, formulada por Auguste Comte, a partir de 1830, mas com muita coisa em comum. A ideologia (ou mentalidade) positivista essencialmente é de índole materialista, anticlerical, pretensamente racionalista, valorizando o "conhecimento objetivo", ou seja, o conhecimento apreendido pelos sentidos. Já do lado espiritualista, o principal representante tem sido a Igreja Católica Romana, seguida das diversas igrejas reformadas. No final do século passado houve uma "grande batalha" entre essas facções, que se traduziu num debate ideológico e em coisas mais "práticas", como disputas por cátedras, pelo controle de instituições culturais e acadêmicas, etc., visando ao controle do "saber oficial". Com a entrada de uma outra facção do lado materialista, o marxismo, depois da Revolução Russa de 1917, a balança pendeu para este lado, porém a guerra ainda não acabou, e estamos nela. Os leitores espíritas poderão ler, com a atenção voltada nesta direção, o extraordinário livro de Camille Flammarion, Deus na Natureza (Rio, Federação Espírita Brasileira), escrito no século passado, onde perceberão o debate deste com os positivistas. A Filosofia, as Ciências, as Artes, e a própria Religião, têm sido usadas como armas nesta luta. No caso das Ciências, têm sido utilizadas teorias científicas para justificar determinadas posições ideológicas. Por exemplo, a teoria de Darwin e Wallace, ou seja, a "Teoria da Seleção Natural", formulada para explicar a evolução biológica das espécies animais e vegetais, foi utilizada para explicar o desenvolvimento das sociedades humanas, sob o nome de "Darwinismo Social", justificando as desigualdades sociais, principalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos, dos fins do século passado.

2. A palavra ‘ciência’ e seus significados

Passemos agora a um outro tópico: os significados da palavra "Ciência". Vários são os sentidos que esta palavra pode ter, obviamente relacionados entre si. "Ciência" significa conhecimento, sendo usada com significado geral ("o fruto da árvore da ciência do bem e do mal") ou restrito ("a ciência de fazer papagaios de papel"). Significa um determinado tipo de conhecimento já consagrado como tal, como a Física, a Química, a Biologia, etc. Significa a atividade através da qual se obtém este conhecimento ("fazer ciência" = realizar uma determinada atividade científica). Significa também o conjunto de pessoas empenhadas na atividade científica: "a comunidade científica". Quando se diz que a "ciência aceita a tese de que há outros mundos também habitados", está se querendo dizer que a comunidade dos cientistas (ou parte dela) aceita esta tese, pois obviamente não há ainda um estudo científico, no sentido convencional do termo, sobre outros mundos habitados.

Nem sempre porém a comunidade científica é homogênea e coesa. os cientistas são pessoas que em suas atividades profissionais buscam objetividade, precisão, rigor lógico, etc., porém for a dessas atividades são pessoas comuns, com todas idiossincrasias, prenoções e preconceitos do vulgo. Kardec já comenta isto na Introdução de O Livro dos Espíritos e em O que é o Espiritismo. Bertrand Russell, conhecido filósofo deste século, menciona em um de seus textos (A perspetiva Científica, trad. J. B. Ramos, Cia. Ed. Nacional. 1956):

Se algum de vossos amigos for um cientista, acostumado a maior precisão quantitativa em suas experiências, e que possua a mais recôndita capacidade de inferir, podereis sujeitá-lo a pequena experiência sem dúvida significativa. Caso escolherdes em palestra como assunto política, teologia, impostos sobre a renda, corretagem, a vaidade das classes trabalhadoras e outros tópicos de natureza semelhante, provocareis sem dúvida uma explosão e ireis escutá-lo expressar opiniões que não forram verificadas, com um dogmatismo que nunca poderia expressar com relação a resultados que fossem fundados em suas pesquisas de laboratório.

3. A divulgação do conhecimento científico

O conhecimento científico, ou seja, o conhecimento resultante da atividade científica, é divulgado de várias maneiras, ou, como chamaremos, níveis.[Nota 2] Vamos considerar apenas a divulgação que gera publicações (revistas, livros, etc.) ou eventualmente filmes, vídeos, etc. Então podemos ter os seguintes níveis:

1o nível – É a divulgação que um ou vários pesquisadores fazem de seu trabalho, de suas idéias, entre os outros pesquisadores da mesma área. É feita normalmente no jargão próprio e seu entendimento requer um treino adequado naquela área de conhecimento. São utilizadas revistas especializadas, livros, etc., que têm uma característica toda própria: o autor e o leitor são pessoas da mesma profissão e, grosso modo, do mesmo nível de conhecimento, ou seja, ambos são membros da mesma comunidade na qual a publicação circula.

2o nível – O conhecimento é divulgada principalmente entre os estudantes de uma dada disciplina. O conhecimento é preparado de forma a iniciar os estudantes naquele campo do conhecimento. São geralmente escritos por pessoas com treino naquele campo (cientistas, professores), e utilizam o jargão próprio, porém de uma forma "amenizada". São os materiais didáticos na forma de livros, revistas, filmes, etc. Evidentemente o autor e o leitor são pessoas de profissão e nível de formação diferentes, pois o estudante está se iniciando naquela comunidade, porém ainda não é um membro.

3o nível – Divulgação para os "leigos". O conhecimento é também preparado para ser transmitido aos não especialistas, porém sem a preocupação de formar o futuro especialista, senso às vezes, feito até em forma de lazer. Podem ser escritos por cientistas, professores ou divulgadores. Estes últimos nem sempre têm um treino naquela área de conhecimento; são profissionais da escrita (escritores, jornalistas, e outros) que estão mais preocupados na "digestibilidade" do conhecimento pelo "leigo".

No 2o e 3o níveis têm papéis importantes na preparação do conhecimento. Estes mesmos pontos de vista que externamos poderá o leitor também os encontrar na interessante matéria veiculada na revista Veja, de 21 de dezembro de 1994, pág. 138, da autoria de Neuza Sanches, referente aos textos de História do Brasil para estudantes secundários. Muitas vezes, nesta preparação do conhecimento, verdades são transformadas em meias-verdades, involuntária ou voluntariamente … e é neste buraco que muitas vezes caímos.[Nota 3]

4. Matéria e energia

Para ilustrar o que dissemos no item anterior, vejamos um caso freqüentemente mencionado em textos espíritas, e em muitos outros, que "a matéria é energia condensada … de acordo … com Einstein, através de sua equação E=mc2 …".

Nesta afirmação equivocada nunca é encontrada em textos de Física ou Química sérios, seja do 1o, 2o ou 3o níveis. Mas em muitos do 3o nível (e até do 2o), que são, muitas vezes, utilizados como fonte de referência. Por que estas afirmações, no nosso entender, são equivocadas?

Não vamos aqui, for falta de espaço, discorrer sobre o que vem a ser energia, no sentido empregado pela Física.[Nota 4] O ponto importante que queremos frisar é que energia e massa são propriedades da matéria. A célebre equação de Einstein, E=mc2, diz que a energia total de um sistema é calculada através do produto da massa pelo quadrado da velocidade da luz, ou seja, como a maioria das equações físicas, relaciona duas propriedades da matéria: a massa e a energia. Esta equação, e outras no âmbito da teoria da relatividade, vai unificar os princípios de conservação de massa e de energia, que passam agora a ser um só: "princípio de conservação da massa e energia".

Por que então surgiu esta afirmação "a matéria é energia condensada"?

Como falamos acima, no item 1, os grupos empenhados na luta ideológica que mencionamos procuram buscar apoio na Ciência. E no caso interpretou-se um resultado científico à luz de uma determinada ideologia, no caso espiritualista, interessada em negar, se possível, a existência da matéria, ou pelo menos em diminuir sua importância dentro da visão de mundo dessa ideologia. À medida que isto é feito (negar a matéria), este conjunto de idéias se torna "mais verdadeiro". Esta interpretação interessou (e interessa) a muitos grupos espiritualistas, que desta forma tentam mostrar a primazia do espírito sobre a matéria, sem usar de outros fenômenos ou argumentos como a mediunidade e a reencarnação. A Doutrina Espírita não necessita deste tipo de "argumento" para afirmar a existência do espírito e sua primazia sobre a matéria, pelo fato de o espírito ser o princípio inteligente. Isto é um ponto básico da Doutrina e suas conseqüências são verificadas na prática. Não é pelo fato de o Espiritismo ser espiritualista que necessita negar a existência da matéria. Recordemos a Questão 27 de O Livro dos Espíritos (43a edição, FEB):

P : "Há então dois elementos gerais do Universo: a matéria e o Espírito?"

R : "Sim e acima de tudo Deus, o criados, o pai de todas as coisas. Deus, espírito e matéria, constituem o princípio de tudo o que existe (…)."

Emmanuel, este Espírito que nos tem dado tantos ensinamentos e orientações, disse alhures que "matéria é luz congelada". Estaria Emmanuel, segundo o que dissemos acima, errado? Não. Em primeiro lugar a frase tem um certo sentido metafórico, porém, mesmo considerando-a ao pé da letra, ela não está errada, pois a luz é matéria. A luz, como outras formas de radiações, é um determinado tipo de matéria, e como tal apresenta diversas propriedades desta, como a massa e a energia. Muitas vezes se utilizam, no meio espírita, expressões como: "o passe é uma transferência de energia". Tal expressão não é incorreta, pois a energia está associada aos fluidos transferidos, o que fica subtendido.[Nota 5] Esta, como grande parte das expressões coloquiais que utilizamos, carece de precisão, porém se fôssemos ser sempre precisos em nossa linguagem usual, acabaríamos doidos ou mudos.

5. A Ciência é materialista?

Retomemos os significados da palavra Ciência, que vimos acima. Costuma-se mencionar que "a Ciência é materialista". Mas qual "Ciência"? Dos significados vistos podemos considerar dois: um primeiro, significando conhecimentos específicos (Física, Química, etc.), e um segundo significando a comunidade científica.

O primeiro significado nos faz pensar também nos significados do termo "materialista". As Ciências da matéria (Física, Química, Biologia, etc.) são "materialistas" porque evidentemente estudam a matéria e somente a matéria, pois foram feitas para isso. Querer que elas sirvam para outra finalidade, ou seja, estudar aspectos não materiais da Natureza, é propor, a nosso ver, uma temerosa aventura. Essas tentativas, algumas registradas na história, outras não, sempre redundaram em fracasso. Por outro lado o termo materialista, no sentido filosófico (como visto no item 1), não faz muito sentido ao ser aplicado às ciências da matéria.

Tomando agora o segundo significado do termo ciência – a comunidade dos cientistas – a pergunta - título deste item: "A Ciência é materialista?", é bem apropriada. Como também já mencionamos, o cientista é cientista apenas enquanto exerce sua profissão; for a dela é um cidadão comum, com todas as idiossincrasias comuns. De fato, a maioria da comunidade científica, em âmbito mundial, é materialista no sentido filosófico do termo, assim como também o é a maioria dos membros das sociedades aos quais pertencem os grandes contingentes científicos da atualidade (e isto gostaríamos de frisar). E aqui vale lembrar a advertência de Emmanuel, ou seja, da necessidade de os cientistas se evangelizarem.

Em resumo, a Ciência, pelo fato de estudar a matéria não deve ser por isso considerada materialista, porém a comunidade científica é, em sua maioria, materialista.[Nota 6]

6. A Ciência confirma o Espiritismo?

Voltemos então às perguntas iniciais: "O que há de errado nos textos de divulgação científica? Será que a ciência moderna não confirma o Espiritismo?" Cremos que o que foi dito acima já responde, em parte, a estas perguntas, principalmente à primeira.

Os textos de divulgação científica, independentemente da qualidade individual de cada um, o que não vem agora ao caso, costumam trazer em seu bojo alguma coisa a mais que os resultados das investigações científicas. Tudo bem, cada um tem o sagrado direito de se expressar. No entanto cada um tem também o sagrado direito de aceitar ou não. Este sagrado direito nem sempre é exercido e aceitam-se certas afirmações cegamente. Kardec nos ensinou o que fazer com as mensagens mediúnicas; vamos aplicar estes critérios também nas mensagens dos encarnados. Em resumo, acho que com os textos de divulgação científica não há nada de errado; alguém está "vendendo seu peixe" e outros simplesmente estão "comprando", sem verificar se o mesmo "está bom ou não".

E a Ciência confirma o Espiritismo?

O outro aspecto a considerar é que o Espiritismo é também uma Ciência. O sucesso das ciências em geral significa também o sucesso da ciência espírita. O raciocínio pode parecer simplista, em parte devido à maneira rápida com que estamos tratando, porém as dificuldades de se entender o que vem a Ciência. Com relação a esta questão o leitor poderá compulsar o artigo "O paradigma espírita", do nosso confrade Silvio Seno Chibeni (Reformador, junho 1994, pp. 176-80), bem como as referências aí citadas que, cremos, esclarecerão melhor a questão. A nosso ver, este é um dos caminhos de confirmação do Espiritismo pela Ciência. O Espiritismo é uma ciência que trata de uma ordem diferente de fenômenos que aqueles de que tratam as ciências da matéria, como já afirmou Kardec. A comparação dos resultados destas ciências não faz portanto muito sentido, principalmente tendo em vista que os "últimos resultados científicos", das ciências da matéria, estão entre as coisas mais mutáveis que existem.

Uma outra linha de comparação que se pode fazer entre Ciência (ainda entendida com conhecimento específico) e Espiritismo seira através do desenvolvimento dos estudos psicológicos ou dos estudos do ser humano em geral. A Psicologia atual está longe de ser considerada uma ciência madura (ou mesmo Ciência, no pensar de alguns), no entanto muitos estudiosos, quase sempre for a do contexto do que poderíamos chamar de "Psicologia Oficial", têm dado contribuições interessante. Os trabalhos de Ian Stevenson (Vinte casos sugestivos de reencarnação, Difusora Cultural, São Paulo, 1978 e Vida antes da vida, Livraria Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1988) e outros, trouxeram resultados notáveis. O leitor interessado nesta área poderá consultar o livro Alquimia da Mente, do conhecido escritor espírita Hermínio C. de Miranda (Publicações Lachâtre, Niterói, RJ, 1994), onde muitos outros estudiosos não-espíritas têm apresentado contribuições interessantes. Essa área de estudo, ou seja, o estudo da mente, é uma área comum ao Espiritismo. É possível que num futuro não muito longínquo, os estudos nesta direção chegarão aos mesmos resultados já afirmados pelo Espiritismo, porém, de todo o vasto leque de tentativas de se estudar a mente humana sem considerar a existência do Espírito, a maior parte tem esbarrado em resultados ou em dificuldades onde se faz necessário considerar esta hipótese, sem a qual se entra num beco sem saída. Talvez pudéssemos atrevidamente "profetizar" que quando a psicologia adotasse o paradigma espírita, estaríamos realmente no "início dos novos tempos".

Há ainda um outro ponto a observar, ligado às ciências da matéria. Muitos estudiosos têm-se envolvido numa determinada linha de pesquisa, que remonta à época das mesas girantes, e que tem por objetivo provar a existência do Espírito através de métodos físicos. Apesar de não estar só, em minha obscura opinião, esta linha não chegou e nem chegará a nada, pois os métodos físicos são adequados para se estudas a matéria (foram feitos para isto). Caso alguém evidencie a presença do Espírito através de um método físico, cabe sempre um questionamento metodológico, e daí não se chega a parte alguma. Por outro lado, muitos confrades poderiam ainda argumentar com o fato de Kardec, em suas obras, mencionar várias vezes que o Espiritismo e a Ciência marchariam lado a lado. Estas afirmações poderiam causar (e causam) em muitos leitores a impressão de que Kardec falava das ciências da matéria. Creio que Kardec tinha em mente a Ciência Espírita, que ele acreditavam com toda a certeza, que ainda estava no começo e que iria crescer, porém é melhor passar a palavra ao próprio Mestre Lionês (O que é o Espiritismo, Cap. I, Segundo Diálogo – O Céptico, Oposição da Ciência, págs. 77 e 78, 36a ed., FEB):

As ciências vulgares repousam sobre as propriedades da matéria, que se pode, à vontade, manipular; os fenômenos que ela produz têm por agentes forças materiais.

Os do Espiritismo têm, como agentes, inteligências que têm independência, livre-arbítrio e não estão sujeitas aos nossos caprichos; por isso eles escapam aos nossos processos de laboratório e aos nossos cálculos, e, desde então ficam fora dos domínios da ciência propriamente dita.

A Ciência enganou-se quando quis experimentar os Espíritos, como experimenta uma pilha voltaica; foi malsucedida como devia sê-lo, porque agiu visando uma analogia que não existe; e depois, sem ir mais longe, concluiu pela negação, juízo temerário que o tempo se encarregou de ir emendando diariamente, como já tem emendado outros; e, àqueles que o preferiram, restará a vergonha do erro de se haverem levianamente pronunciado contra o poder infinito do Criador.

As corporações sábias não podem nem jamais poderão pronunciar-se nesta questão; ela está tão for a dos limites de seu domínio como a de decretar se Deus existe ou não; é pois, um erro fazê-las juiz dela.

Cremos também ter respondido, ainda que de maneira incompleta, à pergunta título desde artigo. O que nos moveu a percorrer este caminho foi justamente a preocupação com as afirmações que colocamos no início. Se não fosse isto, seguiríamos o caminho adotado pelo confrade Luiz Signates, expresso no excelente artigo "Ciência versus Religião: o debate vazio" (Reformador, abril de 1994, pág., 118), com o qual concordamos plenamente e que, de um certo modo, converge aos pontos de vista que externamos também no artigo já mencionado "O Espiritismo na Academia?"

As críticas que aqui fizemos são genéricas e não são de modo nenhum, pessoais. Gostaríamos que outros pontos de vista fossem também colocados.

Notas

1. É bem conhecido o caso de um candidato a um importante cargo público em nosso país que foi derrotado "na boca da urna" por se dizer ser ateu. Em muitos países, inclusive o nosso, muitos candidatos fazem suas campanhas políticas de Bíblia na mão. 

2. Não vamos considerar a comunicação oral, que também satisfaz aos critérios que vamos apresentar, mas seu lado informal confunde-se com o lado formal, do qual estamos tratando.

3. Ouvi certa vez a expressão "duas meias-verdades não fazem uma verdade inteira"

4. A palavra energia tem também outros significados, o que pode provocar confusões. Vide Xavier Jr. A. L., "Algumas considerações oportunas sobre a relação Espiritismo-Ciência", Reformador de agosto de 1995, pp. 244-46

5. Estaria Emmanuel utilizando um sentido diferente para a palavra energia? Se ele usou, já não temos o que comentar, pois o sentido da frase é agora praticamente literal. Vide a nota 4. 

6. Não vamos estender mais sobre esta questão do materialismo na Ciência. O leitor interessado poderá consultar o livro A Ciência em Ação, de Claude Chrétien, trad. M. L. Pereira, Papirus Editora, 1994.


Artigo publicado em Reformador, julho de 1995, pp. 208-11. Digitado por Rodrigo Almeida Gonçalves.


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