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quinta-feira, 20 de outubro de 2016

História da Era Apostólica – No trato com a Revelação


“Ninguém põe vinho novo em odres velhos; caso contrário, o vinho novo estourará os odres, derramar-se-á, e os odres ficarão inutilizados. Põe-se, antes, vinho novo em odres novos.” 1

HAROLDO DUTRA DIAS

Reunidos na modesta residência de Simão Pedro, em Cafarnaum, comentavam os presentes a sublimidade da nova revelação, quando Sara, esposa de um criador de cabras da região, expôs ao Mestre suas dificuldades para vencer o egoísmo, o ciúme eo apego, não obstante reconhecesse a grandeza do Evangelho.

O Mestre, reconhecendo a legitimidade das suas dúvidas e a sinceridade da sua confissão espontânea, utiliza elementos do cotidiano daquela nobre senhora, que vivia da venda do leite de cabras, encarecendo a necessidade de se lavar, cautelosamente, o vaso em que ele seria depositado, sob pena de azedume de todo o líquido, recolhido com enorme esforço.

Transpondo o ensino para o domínio das realidades espirituais, Jesus alerta os ouvintes para a necessidade de se adotar o mesmo cuidado no trato com a revelação divina, e acrescenta:

– Assim é a revelação celeste no coração humano. Se não purificamos o vaso da alma, o conhecimento, não obstante superior, se confunde com as sujidades de nosso íntimo, como que se degenerando, reduzindo a proporção dos bens que poderíamos recolher. Em verdade, Moisés e os profetas foram valorosos portadores de mensagens divinas, mas os descendentes do povo escolhido não purificaram suficientemente o receptáculo vivo do Espírito para recebê-las. É por isto que os nossos contemporâneos são justos e injustos, crentes e incrédulos, bons e maus ao mesmo tempo. O leite puro dos esclarecimentos elevados penetra o coração como alimento novo, mas aí se mistura com a ferrugem do egoísmo velho.Do serviço renovador da alma restará, então, o vinagre da incompreensão, adiando o trabalho efetivo do Reino de Deus.

....................................................

– O orvalho num lírio alvo é diamante celeste, mas, na poeira da estrada, é gota lamacenta.

Não te esqueças desta verdade simples e clara da Natureza.2

Findo o encontro com Nicodemos, em conversa íntima com Tiago a respeito do escândalo e do resgate das faltas, o Mestre voltou ao tema da dificuldade humana em lidar com as revelações divinas:

O Mestre apreendeu a amplitude da objeção e esclareceu aos discípulos, perguntando:

– Dentro da lei de Moisés, como se verifica o processo da redenção?

Tiago meditou um instante e respondeu:

– Também na lei está escrito que o homem pagará “olho por olho,  dente por dente”.

– Também tu, Tiago, estás procedendo como Nicodemos – replicou Jesus com generoso sorriso. – Como todos os homens, aliás, tens raciocinado, mas não tens sentido. Ainda não ponderaste, talvez, que o primeiro mandamento da Lei é uma determinação de amor. Acima do “não adulterarás”, do “não cobiçarás”,está o “amar a Deus sobre todas as coisas, de todo o coração e de todo o entendimento”. Como poderá alguém amar o Pai, aborrecendo-lhe a obra? Contudo, não estranho a exiguidade de visão espiritual com que  examinaste o texto dos profetas. Todas as criaturas hão feito o mesmo. Investigando as revelações do Céu com o egoísmo que lhes é próprio, organizaram a justiça como o edifício mais alto do idealismo humano. E, entretanto, coloco o amor acima da justiça do mundo e tenho ensinado que só ele cobre a multidão dos pecados. [...].3 (Grifo nosso.)

Não são raros os comentaristas que se debruçam sobre o texto de Lucas, naquela passagem que trata do vinho novo em odres velhos, na tentativa de opor a revelação do Velho Testamento ao Evangelho, asseverando, equivocadamente, que os odres velhos representam o trabalho dos profetas.

No entanto, é preciso reconhecer que, sob a direção e assistência de Jesus, “[...] os homens receberão sempre as revelações divinas de conformidade com a sua posição evolutiva”.4 Sendo assim, não há problema com o “vinho” da revelação divina, nossos desafios dizem respeito aos recipientes,“odres”, que simbolizam o coração do aprendiz.

A misericórdia do Cristo envia, de tempos em tempos, missionários e benfeitores, desde as mais remotas eras. O próprio Cristo desceu ao Orbe, espalhando bênçãos e consolações, mas o coração humano permanece atado ao egoísmo e ao orgulho.

Os Espíritos superiores que conduziram o trabalho do Codificador adotaram um emblema para a Revelação Espírita:

Porás no cabeçalho do livro a cepa que te desenhamos, porque é o emblema do trabalho do Criador. Aí se acham reunidos todos os princípios materiais que melhor podem representar o corpo e o espírito. O corpo é a cepa; o espírito é a seiva; a alma ou espírito ligado à matéria é o bago. O homem quintessencia o espírito pelo trabalho e tu sabes que é somente pelo trabalho do corpo que o espírito adquire conhecimentos.5

Não deve causar admiração o fato de Jesus ter escolhido o vinho para simbolizar a revelação espiritual.

Urge renovar o coração, libertando-o das sombras do egoísmo destruidor, para que o vinho celeste não se transforme no vinagre das criações puramente humanas. A Doutrina Espírita é orvalho límpido e reluzente, ofertado pelos céus. É imprescindível, porém, purificar os vasos da alma, sob  pena de misturarmos a bênção do Cristo aos velhos enganos, que insistem em dominar nossos corações.

Expressando, talvez, sua preocupação com esse quadro desalentador, afirmou o Benfeitor Emmanuel:

Asseveram muitos que o Céu estancou a fonte das dádivas, esquecendo-se de que a generalidade dos crentes entorpeceu a capacidade de receber.

Onde a coragem que revestia corações humildes, à frente dos leões do circo? onde a fé que punha afirmações imortais na boca ferida dos mártires anônimos? onde os sinais públicos das vozes celestiais? onde os leprosos limpos e os cegos curados?
As oportunidades do Senhor  continuam fluindo, incessantes, sobre a Terra.

A misericórdia do Pai não mudou. A Providência Divina é invariável em todos os tempos.

A atitude dos cristãos, na atualidade, porém, é muito diferente. Raríssimos perseveram na doutrina dos apóstolos, na comunhão com o Evangelho, no espírito de fraternidade, nos serviços da fé viva.A maioria prefere os chamados “pontos de vista”, comunga com o personalismo destruidor, fortalece a raiz do egoísmo e raciocina sem iluminação espiritual.6

Não podemos nos esquecer de que os puros de coração verão a Deus.

Fonte: Reformador  Ano 127 • Nº 2. 159 • Fevereiro 2009

1Bíblia de Jerusalém. 3. ed. São Paulo: PAULUS, 2004. Lucas 5:37-38.
2XAVIER, Francisco Cândido. Jesus no lar. Pelo Espírito Neio Lúcio. 37. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap. 3, p. 21-22.
3XAVIER, Francisco Cândido. Boa nova. Pelo Espírito Humberto de Campos. 3. ed. especial. 1a reimpressão. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap. 14, p.118-119.
4XAVIER, Francisco Cândido. O consolador. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. 1ª reimpressão. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Questão 271.
5KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. Ed. Comemorativa. Rio de Janeiro: FEB, 2007. “Prolegômenos”, p. 71.

6XAVIER, Francisco Cândido. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap. 39, p. 97-98.


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História da Era Apostólica - Os alicerces da Igreja Cristã


“Os filósofos do mundo sempre pontificaram de cátedras confortáveis, mas nunca desceram ao plano da ação pessoal, ao lado dos mais infortunados da sorte. Jesus renovara, com exemplos divinos, todo o sistema de pregação da virtude. Chamando a si os aflitos e os enfermos, inaugurara no mundo a fórmula da verdadeira benemerência social.”1

HAROLDO DUTRA DIAS

A festividades da Páscoa,2 na Palestina do ano 33 d.C.,3 terminaram de forma inesperada, gravando no coração dos Apóstolos as penosas lições do calvário. O Mestre deixara-se imolar, aceitando o supremo sacrifício sem qualquer reprovação ou murmúrio.

De alma envolta em perplexidade e tristeza, o colégio apostólico se dispersou.
Jesus, todavia, compadecendo-se da fragilidade humana, ressurgiu das sombras da morte confirmando a imortalidade da alma.

A notícia espalhou-se rapidamente, nutrindo o coração dos seguidores de imorredoura esperança.

Ao cabo de sete semanas (cinquenta dias),4 na festa de Pentecostes, quando Jerusalém recebia os mais diversos peregrinos, inaugurou-se nova era para a Humanidade sob os auspícios “[...]dos Espíritos redimidos e santificados que cooperam com o Divino Mestre, desde os primeiros dias da organização terrestre [...]”,5 também conhecidos pelo nome de Espírito Santo. Nesse sentido, o texto de Emmanuel é esclarecedor:

No dia de Pentecostes, Jerusalém estava repleta de forasteiros. Filhos da Mesopotâmia, da Frígia, da Líbia, do Egito, cretenses, árabes, partos e romanos se aglomeravam na praça extensa, quando os discípulos humildes do Nazareno anunciaram a Boa Nova, atenden  doa cada grupo da multidão em seu idioma particular.
Uma onda  de surpresa e de alegria invadiu o espírito geral. Não faltaram os céticos, no divino concerto, atribuindo à loucura e à embriaguez a revelação observada. Simão Pedro destaca-se e esclarece que se trata da luz prometida pelos céus à escuridão da carne.

Desde esse dia, as claridades do Pentecostes jorraram sobre o mundo, incessantemente.Até aí, os discípulos eram frágeis e indecisos, mas, dessa hora em diante, quebram as influências do meio, curam os doentes, levantam o espírito dos infortunados, falam aos reis da Terra em nome do Senhor.
O poder de Jesus se lhes comunicara às energias reduzidas. Estabelecera-se a era da mediunidade, alicerce de todas as realizaçõesdo Cristianismo, através dos séculos.

Contra o seu influxo, trabalham, até hoje, os prejuízos morais que avassalam os caminhos do homem, mas é sobre a mediunidade, gloriosa luz dos céus oferecida às criaturas, no Pentecostes, que se edificam as construções espirituais de todas as comunidades sinceras da Doutrina do
Cristo e é ainda ela que, dilatada dos apóstolos ao círculo de todos os homens, ressurge no Espiritismo cristão, como a alma imortal do Cristianismo redivivo. 6 (Grifo nosso.)

Doravante, guiado pela Espiritualidade superior, Simão Pedro transfere-se para Jerusalém, no segundo semestre do ano 33 d.C., fundando a instituição conhecida como “Casa do Caminho”, posto avançado de atendimento a inúmeros necessitados, além de foco irradiador da Boa Nova.

A descrição de Emmanuel da veneranda instituição é insuperável:

Desde que viera do Tiberíades para Jerusalém, Simão transformara-se em célula central de grande movimento humanitarista.[...]
_______________________________
Era por esse motivo que a residência de Pedro, doação de vários amigos do “Caminho”, regurgitava de enfermos e desvalidos sem esperança. Eram velhos a exibirem úlceras asquerosas, procedentes de Cesaréia; loucos que chegavam das regiões mais longínquas, conduzidos por parentes ansiosos de alívio; crianças paralíticas, da Iduméia, nos braços maternais, todos atraídos pela fama do profeta nazareno, que ressuscitava os próprios mortos e sabia restituir tranquilidade  aos corações mais infortunados do mundo.

Natural era que nem todos se curassem, o  que obrigava o velho pescador a agasalhar consigo todos os necessitados, com carinho de um pai. Recolhendo-se ali, com a família, era auxiliado particularmente por Tiago, filho de Alfeu, e por João; mas, em breve, Filipe e suas filhas instalavam-se igualmente em Jerusalém, cooperando no Grande esforço fraternal.[...]7

Vê-se que o ano 33 d.C. representa um marco inicial para o Cristianismo Nascente. O retorno do Mestre ao mundo espiritual implicaria a distribuição de encargos e responsabilidades graves, tendo em vista a necessidade de concretização no plano físico do prometido “Reino de Deus”, fruto da vivência plena do Evangelho.

Jerusalém nunca mais seria a mesma. As sementes do Cristo,  quais minúsculos grãos de mostarda, se transformariam em frondosas árvores de amor e sabedoria.
Em meio ao pântano das mais pervertidas paixões, desabrochariam lírios de pura espiritualidade.

O Espiritismo, na sua feição de Cristianismo Redivivo, repete o esforço dos primeiros cristãos, procurando conjugar, na intimidade da “Casa Espírita”, os verbos amar, estudar, compreender, perdoar, buscando a legítima caridade. Nesse esforço de aperfeiçoamento, encontra nas primeiras instituições do Cristianismo Nascente um modelo de vivência cristã à altura dos ensinos de Jesus.

A “Casa do Caminho” é exemplo vivo, não obstante o transcurso dos séculos. Por esta razão, urge estudar e refletir sobre os grandes acontecimentos que marcaram o primeiro século do Cristianismo, não somente pelos vultos que trabalharam pela causa do Mestre, mas também pela experiência registrada por estes pioneiros, que jamais pode ser esquecida, sob pena de cometermos antigos e graves erros capazes de comprometer nossa ascensão espiritual.

Irmãos de jornada, avancemos!
Luz acima!

Fonte: Reformador  Ano 126 Nº 2. 156 • Novembro 2008

1XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira parte, cap. III, p. 72.
2A festa da Páscoa começa no crepúsculo da sexta-feira (14 de Nisã), ou seja, no início do sábado (15 de Nisã), uma vez que os judeus contavam o dia a partir das dezoito horas. Essa festa durava uma semana, findando no sábado seguinte (22 de Nisã).
3Consultar o artigo intitulado “A crucificação de Jesus”, publicado na revista Reformador, de setembro de 2008, p. 33, no qual se demonstrou que a crucificação ocorreu por volta do dia 3 de abril de 33 d.C.
4A festa de Pentecostes, palavra grega que significa cinqüenta, é celebrada sete semanas após a Páscoa, ou seja, no quinquagésimo dia após o sábado Pascal. Os hebreus a denominam “festa de Shavuot” ou festa das semanas, na qual celebram o recebimento da Torah no monte Sinai, razão pela qual é também conhecida como a festividade do “dom da Torah”. Nesse caso, o pentecostes descrito no livro “Atos dos Apóstolos”ocorreu por volta do dia 24 de maio de 33 d.C.
5XAVIER, Francisco Cândido. O consolador. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. 1ª reimpressão. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Questão 312.
6XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. 1a reimpressão. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap. 10, p. 35.
7XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito  Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira parte, cap. III, p. 72-73.


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História da Era Apostólica – O primeiro Mártir


"Em  teus dias de dor, recorda alma querida, que a dor é para a vida aquilo que o buril, severo e contundente, entre as mãos do escultor  é para o mármore sem forma. Golpe aqui, Golpe ali, outro mais e mais outro um corte de outro corte se aproxima, e o bloco se transforma em celeste beleza de obra-prima.[...].”1

HAROLDO DUTRA DIAS

O alicerce da obra imorredoura do Cristo formou-se à base de renúncia, sacrifício e abnegação.

Três séculos de Cristianismo Nascente testemunharam o martírio de discípulos corajosos, que se imolaram no altar da fé para que a luz do Evangelho se estendesse ao mundo, inaugurando nova era de fraternidade e amor.

Inspirados no exemplo do próprio Mestre, eles conheceram as feras, o suplício, a perseguição, o confisco, a brutalidade em todos os seus matizes, gravando para sempre, no coração dos homens, a lição da resignação, do amor e do perdão.

Na seara de Jesus, os trabalhadores da primeira hora foram mártires.

Estêvão, o grande mártir da Era Apostólica, inaugurou o “tempo dos sacrifícios”. Seu testemunho de fé e de bravura, diante da mais alta corte judicial da nação hebraica, mudaria os rumos do movimento cristão e deixaria marcas indeléveis no coração do seu próprio algoz, um homem intrépido e sincero, que se tornaria o responsável pela universalização do Cristianismo – Paulo de Tarso.

O apedrejamento de Estêvão se deu no verão do ano 35 d.C.

A informação pode ser encontrada na obra mediúnica Paulo e Estêvão,2 mas somente após uma leitura inteligente e atenta dos textos. Na verdade, é necessária uma combinação harmoniosa e criteriosa de dados.

Emmanuel descreve acontecimentos, aparentemente desconexos, com enorme precisão.Uma vez reunidas, essas descrições formam um quadro cronológico coerente e convincente, senão vejamos:

A manhã enfeitava-se de muita alegria e de sol [...].

No ar brincavam as mesmas brisas perfumadas, que sopravam de longe [...].
.................................................

Nesse ano de 34, a cidade em peso fora atormentada por violenta revolta dos escravos oprimidos.

[...] Em breve, a galera das águias dominadoras, auxiliada por ventos favoráveis, trazia no bojo as autoridades da missão punitiva, cuja ação deveria esclarecer os acontecimentos.3
[...] O coração paternal adivinhava. Àquela hora, Jeziel, conforme o programa por ele mesmo traçado, arava a terra, preparando-a para as primeiras semeaduras. [...]4

De Corinto, a grande embarcação aproara em Cefalônia e Nicópolis, de onde deveria regressar aos portos da linha de Chipre, depois de ligeira passagem pela costa da Palestina, consoante o itinerário organizado para aproveitar o tempo seco e tendo em vista que o inverno paralisava toda a navegação.5

– Há mais de um ano – exclamou o Apóstolo apagando a vivacidade com a lembrança triste – foi crucificado aqui mesmo em Jerusalém, entre os ladrões.6

Estamos na velha Jerusalém, numa clara manhã do ano 35.7

Naquelas primeiras horas da tarde, o sol de Jerusalém era um braseiro ardente. Não obstante o calor insuportável, a massa deslocou-se com profundo interesse. Tratava-se do primeiro processo concernente às atividades do “Caminho”, após a morte do seu fundador. [...]8

Antes de comparar os textos, é imperiosa uma ligeira exposição a respeito do clima, agricultura e navegação na região da Acaia (sul da Grécia). Nos países banhados pelo Mar Mediterrâneo, o clima é muito semelhante, com verões secos e quentes, e invernos moderados e chuvosos. As estações do ano se dividem em dois grandes blocos: primavera–verão (abril–setembro) e outono–inverno (outubro–março).

A semeadura de cereais se dava no início do outono, após a preparação da terra no final do verão, com vistas ao máximo aproveitamento da época das chuvas (inverno). Pela mesma razão, a navegação no Mar Mediterrâneo começava em abril e se encerrava em outubro. Era extremamente perigoso navegar no inverno, em razão das tempestades e da impossibilidade de se orientar pelo Sol e pelas estrelas.

O livro se inicia com a descrição de uma manhã de sol, com brisas perfumadas, e ruas desertas, além da presença maciça de guardas romanos nas vias públicas, em decorrência de uma revolta de escravos ocorrida em Corinto, naquele mesmo ano, ou seja, em 34 d.C.

A galera romana teria aproveitado os ventos favoráveis para se deslocar de Roma até Acaia, a fim de conter o levante, o que nos permite concluir, seguramente, que a navegação se deu na primavera, pois o tempo favorável à navegação começava em abril.

Na sequência, o pai de Jeziel (Estêvão) o encontra arando a terra, preparando-a para as primeiras semeaduras.Naquela região do Mediterrâneo, a terra era arada no final de setembro (fim do verão), ao passo que a semeadura se dava no final de outubro (em pleno outono).

Sendo assim, conjugando a informação da “manhã de sol, com brisas perfumadas” e “aragem da terra”, pode-se concluir que a tragédia que acometeu a família de Estêvão se deu no final do verão do ano 34 d.C.

Jeziel (Estêvão) é enviado para as galeras, como prisioneiro, realizando uma viagem marítima, cujo itinerário foi organizado para “aproveitar o tempo seco” já que “o inverno paralisava toda navegação”. Nesse ponto, a descrição de Emmanuel é rigorosamente precisa. Não há margem para dúvidas. A embarcação partiu no outono do ano 34 d.C.

Após sua chegada em Jerusalém, Jeziel é acolhido por Simão Pedro, na Casa do Caminho. Nesse momento, surge o diálogo entre eles, no qual o pescador de Cafarnaum relata que “há mais de um ano [...] foi crucificado”, referindo-se a Jesus.

Ora, considerando-se que a crucificação se deu em abril//maio do ano 33 d.C.,9 a conversa se deu após o outono de 34 d.C., mas antes de abril de 35 d.C. ou seja, antes de se completarem dois anos da crucificação.Mais adiante, afirma Emmanuel: “Estamos na velha Jerusalém, numa clara manhã do ano 35”, confirmando todos os cálculos precedentes.

Por fim, quando descreve o martírio de Estêvão, o Benfeitor espiritual utiliza a seguinte expressão: “Naquelas primeiras horas da tarde, o sol de Jerusalém era um braseiro ardente. Não obstante o calor insuportável [...]”. Assim, é lícito concluir que Estêvão foi martirizado no verão do ano 35 d.C.

Fonte: Reformador  Ano 127 • Nº 2. 158 • Janeiro 2009

1XAVIER, Francisco Cândido. Mãos marcadas.Espíritos Diversos. São Paulo: Instituto de Difusão Espírita, 1972. Cap. 13 – “Maria Dolores”.
2XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007.
3Idem, ibidem. Primeira parte, cap. I, p. 11-13.
4XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira parte, cap. I, p. 20.
5Idem, ibidem. Primeira parte, cap. III, p. 60.
6XAVIER, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão. Pelo Espírito Emmanuel. 44. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira parte, cap. III, p. 76.
7Idem, ibidem. Primeira parte, cap. IV, p. 84.
 8Idem, ibidem. Primeira parte, cap. VIII, p. 187-188.
9Consultar o artigo intitulado “A crucificação de Jesus”, publicado na revista Reformador, ano 126, n. 2.154, setembro de 2008, p. 33. 


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História da Era Apostólica - A crucificação de Jesus


HAROLDO DUTRA DIAS

“Para quem está familiarizado com a história antiga, não deve ser motivo de perturbação o fato de que as principais datas na vida de Jesus sejam apenas aproximadas. [...]”

O dados cronológicos mais  importantes da vida de Jesus encontram-se nas narrativas da infância (Mateus, 2; Lucas, 1:5, 2:1-40) e nas da Paixão (Mateus, 26-27; Marcos, 14-15; Lucas, 21-23; João, 13-19). Outros dados relevantes podem ser encontrados nos Evangelhos de Lucas e João (Lc., 3:1-2 e 23; Jo., 2:20).

Os historiadores do Cristianismo, porém, chamam a atenção para o fato de que os Evangelhos não são essencialmente obras de história, no sentido atual da palavra. Os Evangelistas não pretendiam produzir uma biografia completa ou mesmo um sumário da vida de Jesus. Ao contrário, escreveram com a finalidade de transmitir o ensino do Mestre, os fatos principais da sua vida, de modo a legar à posteridade o testemunho da fé.

Nesse sentido, é justo considerar  que os Evangelistas organizaram o material da tradição (oral e/ou escrita) de acordo com um propósito redacional. Compilaram e organizaram as narrativas sem se preocuparem com a ordem histórica dos acontecimentos.

Assim, em se tratando de cronologia do Cristianismo Nascente, por vezes, é preciso contentar se com o estabelecimento de intervalos temporais, dentro dos quais há maior probabilidade de ocorrência de determinado fato. As limitações das fontes históricas disponíveis justificam essa situação.

Seguindo o relato dos Evangelistas, entre o nascimento de Jesus e o início de seu ministério público, houve um período de “cerca de trinta anos” (Lucas, 3:23).

Considerando que seu nascimento se deu no outono/inverno do ano 5 a.C.,2 é possível estabelecer que sua missão pública entre os homens desenvolveu-se entre os anos 25 e 45 d.C. O intervalo é excessivamente extenso, e pode ser reduzido com base em outros dados.

Jesus foi crucificado quando Pôncio Pilatos era procurador da Judéia (TÁCITO, Anais, XV, 44; FLÁVIO JOSEFO, Antiguidades Judaicas, XVIII, 63; Relato dos evangelistas), ou seja, entre 26 e 36 d.C. Já conseguimos uma considerável redução no intervalo.

João Batista iniciou seu ministério no ano décimo quinto de Tibério César (Lucas, 3:1). Levan-do-se em conta as divergências na fixação desta data,3 tal fato ocorreu entre os anos 27 e 29 d.C. 

Jesus, por sua vez, deu início ao seu ministério público após João Batista ter iniciado o seu.
Computando-se um período razoável de duração do ministério do Cristo, o ano da sua morte, na opinião da maioria dos pesquisadores, deve se situar entre os anos 29 e 34 d.C. Nesta, houve uma redução drástica daquele intervalo temporal inicialmente proposto.

Sobre isso, julgamos oportuna a transcrição de pequeno trecho sobre a crucificação encontrado em famoso dicionário bíblico:

[...] Dentre as tentativas feitas para determinar o ano da crucificação, a mais frutífera tem sido feita com a ajuda da astronomia. De conformidade com todos os quatro evangelhos, a crucificação teve lugar numa sexta-feira; mas enquanto que nos sinóticos essa sexta-feira é 15 de Nisã, em João é 14 de Nisã. Portanto, o problema que tem que ser solucionado com a ajuda da astronomia, é o de determinar em qual dos anos 26--36 d.C. é que 14 e 15 de Nisã caíram numa sexta-feira. Mas, visto que nos tempos neotestamentários o mês judaico era lunar, e o tempo de seu início era marcado pela observação da lua nova, esse problema é basicamente o de resolver quando a lua nova se tornou visível. Estudando esse problema, Fotheringham e Schoch chegaram cada qual a uma só fórmula mediante cuja aplicação descobriram que 15 de Nisã caiu numa sexta-feira somente no ano 27 d.C., e que 14 de Nisã caiu numa sexta-feira somente nos anos 30 e 33. Visto que o ano de 27 como ano da crucificação está fora de questão, a escolha recai entre os anos 30 d.C. (7 de abril) e 33 d.C. (3 de abril). [...].4 (Grifo nosso.) 

Portanto, usando todos os recursos e métodos da moderna pesquisa histórica, pode-se afirmar que a crucificação ocorreu no dia 7 de abril do ano 30 d.C. ou no dia 3 de abril do ano 33 d.C.

A opção por qualquer dessas datas não isenta o pesquisador de responder a objeções fundadas. É nesse ponto da pesquisa que julgamos conveniente conjugar esforço humano e revelação espiritual, numa operação chamada por Allan Kardec de “fé raciocinada”.

Nesse sentido, dois textos encontrados na obra psicográfica de Francisco Cândido Xavier chamam nossa atenção:

Nos primeiros dias do ano 30, antes de suas gloriosas manifestações, avistou-se Jesus com o Batista, no deserto triste da Judéia, não muito longe das areias ardentes da Arábia [...].5 Aproximava-se a Páscoa no ano 33. Numerosos amigos de Públio haviam aconselhado a sua volta temporária a Jerusalém, a fim de intensificar os serviços da procura do filhinho, no curso das festividades que concentravam,na época, as maiores multidões da Palestina [...].
....................................................

[...] De uma sala contígua ao seu gabinete, notou que Públio atendia a numerosas pessoas que o procuravam particularmente, em atitude discreta; e o interessante é que, segundo as suas observações, todos expunham ao senador o mesmo assunto, isto é, a prisão inesperada de Jesus Nazareno – acontecimento que desviara todas as atenções das festividades da Páscoa, tal o interesse despertado pelos feitos do Mestre, em todos os espíritos. [...]6

Assim, consoante a revelação espiritual, pelas mãos do respeitável médium Francisco Cândido Xavier, Jesus iniciou seu ministério no ano 30 d.C. e foi cru-

Fonte: Reformador Ano 126 Nº 2. 154 • Setembro 2008

1MEIER, John P. Um judeu marginal: repensando o Jesus histórico. 3. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1993. p. 367.
2Consultar o artigo intitulado “Nascimento de Jesus”, publicado na revista Reformador, de junho de 2008, p.
3Alguns pesquisadores consideram, para  contagem dos quinze anos, o período em que Tibério César se tornou co-regente de Augusto, ao passo que outros recusam esse método de contagem asseverando que deve ser contabilizado apenas o período em que ele regeu sozinho, após a morte do imperador. Visto que Augusto faleceu em 19 de agosto de 14 d.C., a contagem deveria se iniciar após essa data.
4DOUGLAS, J. D. O novo dicionário da bíblia. 3. ed. São Paulo: Vida Nova, 2006. p.
5XAVIER, Francisco Cândido. Boa nova. Pelo Espírito Humberto de Campos. 3. ed. especial. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Cap.
6XAVIER, Francisco Cândido. Há dois milanos. Pelo Espírito Emmanuel. 48. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Primeira Parte, cap. VIII, p. 144, 147 e 148.
7A festa da Páscoa começa no crepúsculo da sexta-feira (14 de Nisã), ou seja, no início do sábado (15 de Nisã), uma vez que os judeus contavam o dia a partir das dezoito horas. Essa festa durava uma semana, findando no sábado seguinte (22 de Nisã).


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